Sonetos sobre Pobres de Vasco Mouzinho de Quebedo

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Sonetos de pobres de Vasco Mouzinho de Quebedo. Leia este e outros sonetos de Vasco Mouzinho de Quebedo em Poetris.

Soneto XXXXIIII

Do fundo sobe do mar Indo acima
A recolher o orvalho a concha, e nela,
Despois que pouco a pouco se congela,
A pérola nos dá de tanta estima.

Hoje, despois que o Céu choveu de cima
O rico orvalho, aquela concha, aquela
Divina humana, mais que todas bela,
O mundo pobre com seu parto anima.

Mas ai que a concha aberta o orvalho fino
Recebe, e em pedra dá; porém, Maria,
De outra invenção e modo extraordinário.

E como vem tão pobre este minino?
Vem tosca pedra, e seu preço e valia
Só conhece o discreto lapidário.

Soneto XXXVI

Aquele que é da Bíbora mordido
A todos sua dor e mal encobre,
E só àquele o diz e lho descobre,
Que sabe foi também dela firido.

Tal eu que todo o bem tenho perdido
De todo o gosto e de alegria pobre,
De vós a quem a mesma nuve cobre
Quero só que meu mal seja sabido.

Das searas e campo o lavrador,
Das batalhas e trances o soldado,
Ouve pronto do mar quem no mar trata,

O triste a quem alegra seu cuidado,
Qual borboleta, busca sempre a dor,
Morto d’amores só por quem o mata.

Soneto XXIII

Já que tão bom conselho vos ensaia,
Pois o julgais por mais acautelado,
Não seja embora o anel muito apertado,
Mas não seja tão largo, que vos caia.

O não chegar, como passar a raia
É por vício comum vituperado,
Olhai que esse conselho t’é já dado
Num grande estremo, porque d’outro saia.

O pior é que vejo nesse dedo
Do coração, aneis de chumbo e cobre,
E cuidais que trazeis grande tesouro.

Se não é por ventura algum segredo,
Ou vosso coração deve ser pobre,
Ou vós não conheceis os anéis de ouro.