Sonetos sobre Receio de Luís de CamÔes

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Sonetos de receio de Luís de CamÔes. Leia este e outros sonetos de Luís de CamÔes em Poetris.

Bem Sei, Amor, que Ă© Certo o que Receio

Bem sei, Amor, que Ă© certo o que receio;
Mas tu, porque com isso mais te apuras,
De manhoso, mo negas, e mo juras
Nesse teu arco de ouro; e eu te creio.

A mĂŁo tenho metida no meu seio,
E nĂŁo vejo os meus danos Ă s escuras;
Porém porfias tanto e me asseguras,
Que me digo que minto, e que me enleio.

Nem somente consinto neste engano,
Mas inda to agradeço, e a mim me nego
Tudo o que vejo e sinto de meu dano.

Oh poderoso mal a que me entrego!
Que no meio do justo desengano
Me possa inda cegar um moço cego?

Quem Vos Levou De Mim, Saudoso Estado

Quem vos levou de mim, saudoso estado,
que tanta sem-razĂŁo comigo usastes?
Quem foi, por quem tĂŁo presto me negastes,
esquecido de todo o bem passado?

Trocastes-me um descanso em um cuidado
tĂŁo duro, tĂŁo cruel, qual m’ordenastes;
a fé, que tínheis dado, me negastes,
quando mais nela estava confiado.

Vivia sem receio deste mal;
Fortuna, que tem tudo a sua mercĂȘ,
amor com desamor me revolveu.

Bem sei que neste caso nada val,
que quem naceu chorando, justo Ă©
que pague com chorar o que perdeu.

TĂŁo Conformes na Ventura

Quantas vezes do fuso se esquecia
Daliana, banhando o lindo seio,
Outras tantas de um ĂĄspero receio
Salteado Laurénio a cor perdia.

Ela, que a SĂ­lvio mais que a si queria,
Para podĂȘ-lo ver nĂŁo tinha meio.
Ora como curara o mal alheio
Quem o seu mal tĂŁo mal curar podia?

Ele, que viu tĂŁo clara esta verdade,
Com soluços dizia (que a espessura
Inclinavam, de mĂĄgoa, a piedade):

Como pode a desordem da natura
Fazer tĂŁo diferentes na vontade
Aos que fez tĂŁo conformes na ventura?