Sonetos sobre Sempre de António Ferreira

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Sonetos de sempre de António Ferreira. Leia este e outros sonetos de António Ferreira em Poetris.

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Livro, se luz desejas, mal te enganas.
Quanto melhor será dentro em teu muro
Quieto, e humilde estar, inda que escuro,
Onde ninguém t’impece, a ninguém danas!

Sujeitas sempre ao tempo obras humanas
Coa novidade aprazem; logo em duro
Ódio e desprezo ficam: ama o seguro
Silêncio, fuge o povo, e mãos profanas.

Ah! não te posso ter! deixa ir comprindo
Primeiro tua idade; quem te move
Te defenda do tempo, e de seus danos.

Dirás que a pesar meu fostes fugindo,
Reinando Sebastião, Rei de quatro anos:
Ano cinquenta e sete: eu vinte e nove.

Vou de Suspiros Todo este Ar Enchendo

Vou de suspiros todo est’ ar enchendo,
vou a terra de lágrimas regando,
mais água aos rios, mais às fontes dando,
e com meu fogo em tudo fogo acendo.

E quando os olhos meus, senhora, estendo
para onde o Amor e vós m’estais chamando,
as altas serras em qu’ os vou quebrando
da vista me tolher s’ estão doendo.

Mas nisto acode Amor, que sempre voa;
eu pelas asas, eu pelo arco o tenho,
té me levar consigo onde desejo.

E jurarei, senhora, que vos vejo,
jurarei qu’ essa doce voz me soa.
Nesta imaginação só me sostenho.

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Se meu desejo só é sempre ver-vos,
Que causará, senhora, que em vos vendo
Assi me encolho logo, e arrependo,
Que folgaria então poder esquecer-vos?

Se minha glória só é sempre ter-vos
No pensamento meu, porque em querendo
Cuidar em vós, se vai entristecendo?
Nem ousa meu esprito em si deter-vos?

Se por vós só a vida estimo, e quero,
Como por vós a morte só desejo?
Quem achará em tais contrários meio?

Não sei entender o que em mim mesmo vejo.
Mas que tudo é amor, entendo, e creio,
E no que entendo, e creio, nisso espero.