Sonetos sobre Tempo de Abade de Jazente

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Eu nĂŁo Sou de Ferro

Nize, eu nĂŁo sou de ferro, e atenuado,
Ainda que o fora, o uso me teria;
Porque enfim do trabalho na porfia
Se consome o metal mais obstinado.

Instrumento não hå tão reforçado,
Que resista do tempo Ă  bataria:
Gasta o martelo a safra, e a terra fria
Pouco a pouco consome o curvo arado.

Tudo assim Ă©: o amor o mais ardente,
No contĂ­nuo incĂȘndio se evapora;
E o mesmo me acontece ultimamente.

Outro procura pois; e te melhora
De amante, ou mais afouto, ou mais valente;
Que eu jĂĄ nĂŁo posso mais; fica-te embora.

Enquanto to Permite a Mocidade

Enquanto to permite a mocidade,
Teu Pai disfarça, tua Mãe consente,
E enquanto, Nize, a moda o nĂŁo desmente
Nos brincos gasta a flor da tua idade.

Joga, dança, conversa, e a variedade,
Que causa tanta prenda, assombre a gente;
Deixa-te ver, que o SĂ©culo presente
Hoje chama ao pudor rusticidade.

Os coraçÔes de quem te aplaude enlaça:
desfruta o tempo: e tem por aforismo
Que o gosto Ă© fugitivo, a sorte escassa

Engolfa-te de amor no doce abismo;
Busca o prazer; a vida alegre passa;
Logra-te enfim; que o mais Ă© fanatismo.

Um Rafeiro Fiel de um Pastor Triste

TĂł, Mondego, vem cĂĄ; pois tu somente
Alivias um pouco o meu cuidado;
Que em parte se consola um desgraçado,
Quando tem quem lhe escute o mal que sente.

Tu firme; tu leal; tu finalmente
Me tens na minha ausĂȘncia acompanhado:
Raro impulso de amor! Porque ao seu lado
Ninguém quer suportar um descontente.

Ora deixa, que em prémio da piedade,
Com que o teu zelo ao meu tormento assiste,
Farei teu nome emblema da amizade.

E os versos meus que um tempo alegre ouviste
CantarĂŁo, para exemplo da lealdade,
Um Rafeiro fiel de um Pastor triste.

Sem Causa a InfĂąncia Ri

Sem causa a InfĂąncia ri, sem causa chora:
Incauta se despenha a mocidade;
Sacode o jugo, e nela a liberdade,
A caça, o jogo, o amor, tudo a namora.

Das honras o varĂŁo se condecora;
Tudo Ă© nele ilusĂŁo, tudo vaidade:
Junta Tesouros a avarenta idade;
Diz mal do nosso, e ao tempo andado adora.

Tormento Ă© toda a vida, Ă© toda enganos:
Quando uns afectos vence a novos corre,
E tarde reconhece os prĂłprios danos:

Porque enfim se a prudĂȘncia nos socorre,
Ditada na lição dos longos anos,
Quando se sabe, entĂŁo Ă© que se morre.

Deixa, Moreira, o Mundo

(Ao seu Amigo)

Deixa, Moreira, o mundo; Ă© tempo agora
De ver da praia firme o golfo insano,
As velas colhe, e o tarde desengano
Com levantadas mĂŁos devoto adora.

Repousa pois: o mundo hoje devora
Com enganos cruéis o peito humano;
E rindo-te de ver o antigo engano,
As antigas paixÔes såbio melhora.

Deixa Amor, deixa as Musas, e somente
Do Ilustre Baco o copo Ă  boca arrima;
Pois alegra a quem vive descontente:

Louva o homem discreto, o SĂĄbio estima;
Ama a virtude; mostra-te prudente;
Toma tabaco, fala Ă  tua Prima.