Passagens sobre Tarde

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Frases sobre tarde, poemas sobre tarde e outras passagens sobre tarde para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Elogio da Desconhecida

Ela. Seus braços vencidos,
Naus em procura do mar,
Caminhos brancos, compridos,
Que conduzem ao luar.

Se ao meu pescoço os enrola
Eu julgo, com alegria,
Que trago ao pescoço o dia
Como se fosse uma gola.

O Luar, lâmpada acesa
Pra alumiar à princesa
Que em meus olhos causa alarde.

E o dia, longe, esquecido,
É um lençol estendido
Numa janela da Tarde.

Sem Causa a Infância Ri

Sem causa a Infância ri, sem causa chora:
Incauta se despenha a mocidade;
Sacode o jugo, e nela a liberdade,
A caça, o jogo, o amor, tudo a namora.

Das honras o varão se condecora;
Tudo é nele ilusão, tudo vaidade:
Junta Tesouros a avarenta idade;
Diz mal do nosso, e ao tempo andado adora.

Tormento é toda a vida, é toda enganos:
Quando uns afectos vence a novos corre,
E tarde reconhece os próprios danos:

Porque enfim se a prudência nos socorre,
Ditada na lição dos longos anos,
Quando se sabe, então é que se morre.

Os pais que não arranjam tempo para os seus filhos, que se envolvem excessivamente com o trabalho vão desejar mais tarde poder comprar o tempo e voltar atrás. Mas o tempo passado não está mais à venda no grande mercado da vida, apenas o tempo presente.

Último Soneto

Que rosas fugitivas foste ali!
Requeriam-te os tapetes, e vieste…
– Se me dói hoje o bem que me fizeste,
É justo, porque muito te devi.

Em que seda de afagos me envolvi
Quando entraste, nas tardes que apareceste!
Como fui de percal quando me deste
Tua boca a beijar, que remordi…

Pensei que fosse o meu o teu cansaço –
Que seria entre nós um longo abraço
O tédio que, tão esbelta, te curvava…

E fugiste… Que importa? Se deixaste
A lembrança violeta que animaste,
Onde a minha saudade a Cor se trava?…

Elegia da Lembrança Impossível

O que não daria eu pela memória
De uma rua de terra com baixos taipais
E de um alto ginete enchendo a alba
(Com o poncho grande e coçado)
Num dos dias da planície,
Num dia sem data.
O que não daria eu pela memória
Da minha mãe a olhar a manhã
Na fazenda de Santa Irene,
Sem saber que o seu nome ia ser Borges.
O que não daria eu pela memória
De ter lutado em Cepeda
E de ter visto Estanislao del Campo
Saudando a primeira bala
Com a alegria da coragem.
O que não daria eu pela memória
Dos barcos de Hengisto,
Zarpando do areal da Dinamarca
Para devastar uma ilha
Que ainda não era a Inglaterra.
O que não daria eu pela memória
(Tive-a e já a perdi)
De uma tela de ouro de Turner,
Tão vasta como a música.
O que não daria eu pela memória
De ter sido um ouvinte daquele Sócrates
Que, na tarde da cicuta,
Examinou serenamente o problema
Da imortalidade,
Alternando os mitos e as razões
Enquanto a morte azul ia subindo
Dos seus pés já tão frios.

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Teus Olhos Entristecem

Teus olhos entristecem
Nem ouves o que digo.
Dormem, sonham esquecem…
Não me ouves, e prossigo.

Digo o que já, de triste,
Te disse tanta vez…
Creio que nunca o ouviste
De tão tua que és.

Olhas-me de repente
De um distante impreciso
Com um olhar ausente.
Começas um sorriso.

Continuo a falar.
Continuas ouvindo
O que estás a pensar,
Já quase não sorrindo.

Até que neste ocioso
Sumir da tarde fútil,
Se esfolha silencioso
O teu sorriso inútil.

Preciso de Ti

Antes de começar… Acabei de suplicar dez minutos para este bilhete… Terrivelmente, terrivelmente vivo, dorido, e sentindo absolutamente que preciso de ti. Permiti o silêncio deliberadamente, sentindo uma grande necessidade de me retirar em mim mesmo, para escrever, e mil coisas prevalecendo.

Mudei para outra máquina, assustadora; a máquina francesa… maldita, e eu bêbedo com o desejo de te escrever. Ouve, ligo-te de manhã: esta noite ou escrevo ou rebento, mas tenho de te ver. Vejo-te brilhante e maravilhosa e ao mesmo tempo tenho estado a escrever à June e todo dividido mas tu compreenderás — tens de compreender. Vou atirar-me a uma pausa e faço uma chamada. Anais, apoia-me. Não deixes que os silêncios te preocupem: estás toda à minha volta como uma chama clara. Nada a não ser dois pontos, não encontro o ponto nem os apóstrofos. Nenhuma cópia disto também: óptimo: bêbedo… bêbedo de vida… Anais, por Cristo: se tu soubesses o que estou a sentir agora.

Isto foi [escrito] ao chegar [ao escritório]. Agora 3h20 da manhã no quarto do Fred… Toda a força desaparecida e destruída por imagens. O Fred está na cama com a Gaby do chambre 48. Está deitada como um cadáver.

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Controlar a Ira

Se deste vazão à ira, fica certo de que, além do mal nela implícito, revigoraste o hábito e acrescentaste lenha à fogueira. Quando és vencido por uma tentação da carne, não consideres isso simples derrota: considera, também, que revigoraste os teus hábitos dissolutos. Os hábitos e as faculdades são necessariamente afectados pelos actos correspondentes. Os que antes não existiam, agora aparecem; os demais cobram vigor e domínio. Esta é a versão que os Filósofos dão das moléstias da mente: supõe que algum dia cobiçaste ter dinheiro: se a razão, em dose suficiente para provocar a consciência do mal, intervir, a cobiça é anulada e a mente recupera imediatamente a sua autoridade original; contudo, se não recorreres a nenhum remédio, jamais poderás esperar tal recuperação; ao contrário, a próxima vez em que for excitada pelo objecto correspondente, a chama do desejo irromperá mais prontamente do que antes. Pela frequência da repetição, a mente, ao fim e ao cabo, fica calejada e, assim, esta moléstia mental produz Avareza confirmada.
Quando alguém teve febre, mesmo depois de voltar à normalidade, não se encontra nas mesmas condições de saúde que antes, a menos que a sua cura seja completa. Algo de semelhante ocorre com as moléstias da mente.

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Deixar Sempre as Coisas a Meio

A grandeza, o verdadeiro luxo, está nessa displicência algo aristocrática, não na pior aceção da palavra, de deixar sempre as coisas a meio: esse copo de conhaque que se abandona na varanda do bar, as moedas que nunca mais se acabam de recolher da bandejinha em que o criado nos trazia o troco, os pratos por limpar, as tardes inteiras de torpor e moleza, desperdiçadas sem culpa porque sobra vida, porque haverá tempo. Essa é a atitude que se opõe à do miserável a quem a necessidade mais visceral e mesquinha faz ver poesia nesse sorver até à última gota o que a vida lhe oferece. E não deita nada fora, então, e guarda para amanhã, e mesquinhamente esconde as sobras para as aproveitar depois como um cão saciado que enterra os ossos junto de uma árvore para não desperdiçar nem um grama de alimento; e molha no chocolate todos os churros que fazem parte da dose, mesmo a rebentar de cheio, caibam ou não dentro do seu estômago. E mil vezes preferível deixar sempre qualquer coisa no prato, desdenhar com elegância de parte do festim; jantar, por exemplo, com uma senhora admirável e permitir graciosamente que escape viva. E,

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Entre o Bater Rasgado dos Pendões

Entre o bater rasgado dos pendões
E o cessar dos clarins na tarde alheia,
A derrota ficou: como uma cheia
Do mal cobriu os vagos batalhões.

Foi em vão que o Rei louco os seus varões
Trouxe ao prolixo prélio, sem idéia.
Água que mão infiel verteu na areia —
Tudo morreu, sem rastro e sem razões.

A noite cobre o campo, que o Destino
Com a morte tornou abandonado.
Cessou, com cessar tudo, o desatino.

Só no luar que nasce os pendões rotos
Mostram no absurdo campo desolado
Uma derrota heráldica de ignotos.

Mais uma vez ou duas na vida – talvez num fim de tarde, num instante de amor, no momento de morrer – teria sublime inconsciência criadora, a intuição aguda e cega de que era realmente imortal para todo o sempre.

Amigo

1.
Amigo, toma para ti o que quiseres,
passeia o teu olhar pelos meus recantos,
e se assim o desejas, dou-te a alma inteira,
com suas brancas avenidas e canções.

2.
Amigo – faz com que na tarde se desvaneça
este inútil e velho desejo de vencer.

Bebe do meu cântaro se tens sede.

Amigo – faz com que na tarde se desvaneça
este desejo de que todas as roseiras
me pertençam.

Amigo,
se tens fome come do meu pão.

3.
Tudo, amigo, o fiz para ti. Tudo isto
que sem olhares verás na minha casa vazia:
tudo isto que sobe pelo muros direitos
– como o meu coração – sempre buscando altura.

Sorris-te – amigo. Que importa! Ninguém sabe
entregar nas mãos o que se esconde dentro,
mas eu dou-te a alma, ânfora de suaves néctares,
e toda eu ta dou… Menos aquela lembrança…

… Que na minha herdade vazia aquele amor perdido
é uma rosa branca que se abre em silêncio…

Tradução de Rui Lage

Canção da Minha Tristeza

Meu coração não está nas largas avenidas
nem repousa à tarde, para lá do rio.
Nada acontece. Nada. Nem, ao menos, tu
virás despentear os meus cabelos.

Nem, ao menos, tu, neste tempo de angústia
vens dizer o meu nome ou cobrir-me de beijos.
Ah, meu coração não está nas largas avenidas
nem repousa à tarde, para lá do rio.

A cidade enlouquece os meus olhos de pássaro.
Eu recuso as palavras. Sei o nome da chuva.
Quero amar-te, sim. Mas tu hoje não voltas.
Tu não virás, nunca mais, ó minha amiga.

Nada acontece. Nada. E eu procuro-te
por dentro da noite, com mãos de surpresa.
Meu coração não está nas largas avenidas
nem repousa à tarde, para lá do rio.

E tu, longe, longe. Onde estás meu amor,
que não vens despentear os meus cabelos?
Eu quero amar-te. Mas tu hoje não voltas.
Tu não virás, nunca mais, ó minha amiga.

Testamento do Homem Sensato

Quando eu morrer, não faças disparates
nem fiques a pensar: «Ele era assim…»
mas senta-te num banco de jardim,
calmamente comendo chocolates.

Aceita o que te deixo, o quase nada
destas palavras que te digo aqui:
foi mais que longa a vida que eu vivi,
para ser em lembranças prolongada.

Porém, se, um dia, só, na tarde em queda,
surgir uma lembrança desgarrada,
ave que nasce e em voo se arremeda,

deixa-a pousar em teu silêncio, leve
como se apenas fosse imaginada,
com uma luz, mais que distante, breve.

Só o Amor me Interessa

Nesta fase em que só o amor me interessa
o amor de quem quer que seja
do que quer que seja
o amor de um pequeno objecto
o amor dos teus olhos
o amor da liberdade

o estar à janela amando o trajecto voado
das pombas na tarde calma

nesta fase em que o amor é a música de rádio
que atravessa os quintais
e a criança que corre para casa
com um pão debaixo do braço

nesta fase em que o amor é não ler os jornais

podes vir podes vir em qualquer caravela
ou numa nuvem ou a pé pelas ruas
– aqui está uma janela acolá voam as pombas –

podes vir e sentar-te a falar com as pálpebras
pôr a mão sob o rosto e encher-te de luz

porque o amor meu amor é este equilíbrio
esta serenidade de coração e árvores

Nos tempos que correm a maior parte das pessoas morrem de uma espécie de bom senso servil e descobrem demasiado tarde que não existem mais do que irremediáveis erros.

Deixa, Moreira, o Mundo

(Ao seu Amigo)

Deixa, Moreira, o mundo; é tempo agora
De ver da praia firme o golfo insano,
As velas colhe, e o tarde desengano
Com levantadas mãos devoto adora.

Repousa pois: o mundo hoje devora
Com enganos cruéis o peito humano;
E rindo-te de ver o antigo engano,
As antigas paixões sábio melhora.

Deixa Amor, deixa as Musas, e somente
Do Ilustre Baco o copo à boca arrima;
Pois alegra a quem vive descontente:

Louva o homem discreto, o Sábio estima;
Ama a virtude; mostra-te prudente;
Toma tabaco, fala à tua Prima.

Cárcere Das Almas

Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço olhando imensidades,
Mares, estrelas, tardes, natureza.

Tudo se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhões as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo o Espaço da Pureza.

Ó almas presas, mudas e fechadas
Nas prisões colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!

Nesses silêncios solitários, graves,
que chaveiro do Céu possui as chaves
para abrir-vos as portas do Mistério?!

Nunca se Escreve para Si Mesmo

O escritor não prevê nem conjectura: projecta. Acontece por vezes que espera por si mesmo, que espera pela inspiração, como se diz. Mas não se espera por si mesmo como se espera pelos outros; se hesita, sabe que o futuro não está feito, que é ele próprio que o vai fazer, e, se não sabe ainda o que acontecerá ao herói, isto quer simplesmente dizer que não pensou nisso, que não decidiu nada; então, o futuro é uma página branca, ao passo que o futuro do leitor são as duzentas páginas sobrecarregadas de palavras que o separam do fim.

Assim, o escritor só encontra por toda a parte o seu saber, a sua vontade, os seus projectos, em resumo, ele mesmo; atinge apenas a sua própria subjectividade; o objecto que cria está fora de alcance; não o cria para ele. Se relê o que escreveu, já é demasiado tarde; a sua frase nunca será a seus olhos exactamente uma coisa. Vai até aos limites do subjectivo, mas sem o transpor; aprecia o efeito dum traço, duma máxima, dum adjectivo bem colocado; mas é o efeito que produzirão nos outros; pode avaliá-lo, mas não senti-lo.
Proust nunca descobriu a homossexualidade de Charlus,

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