Que Levas, Cruel Morte?- Um Claro Dia.
Que levas, cruel Morte?- Um claro dia.
– A que horas o tomaste?- Amanhecendo.
– Entendes o que levas?- NĂŁo o entendo.
– Pois quem to faz levar?- Quem o entendia.Seu corpo quem o goza?- A terra fria.
– Como ficou sua luz?- Anoitecendo.
– LusitĂąnia que diz?- Fica dizendo:
Enfim, nĂŁo mereci Dona Maria.Mataste quem a viu?- JĂĄ morto estava.
– Que diz o cru Amor?- Falar nĂŁo ousa.
– E quem o faz calar?- Minha vontade.Na corte que ficou?- Saudade brava.
– Que fica lĂĄ que ver?- NenhĂŒa cousa;
mas fica que chorar sua beldade.
Sonetos sobre Terra de LuĂs de CamĂ”es
27 resultadosA VĂłs Seu Resplendor Deu Sol e Lua
Pelos raros extremos que mostrou
Em sĂĄbia Palas, VĂ©nus em formosa,
Diana em casta, Juno em animosa,
Ăfrica, Europa e Ăsia as adorou.Aquele saber grande que juntou
EspĂrito e corpo em liga generosa,
Esta mundana mĂĄquina lustrosa
De sĂł quatro elementos fabricou.Mas fez maior milagre a natureza
Em vĂłs, Senhoras, pondo em cada uma
O que por todas quatro repartiu.A vĂłs seu resplendor deu Sol e Lua:
A vós com viva luz, graça e pureza,
Ar, Fogo, Terra e Ăgua vos serviu.
Quem Jaz no GrĂŁo Sepulcro
Quem jaz no grĂŁo sepulcro, que descreve
TĂŁo ilustres sinais no forte escudo?
Ninguém, que nisso, enfim, se torna tudo;
Mas foi quem tudo pĂŽde e quem tudo teve.Foi Rei? Fez tudo quanto a Rei deve:
PĂŽs na guerra e na paz devido estudo.
Mas quĂŁo pesado foi ao Mouro rudo,
Tanto lhe seja agora a terra leve.Alexandre serå? Ninguém se engane:
Mais que o adquirir, o sustentar estima.
SerĂĄ Adriano grĂŁo senhor do mundo?Mais observante foi da Lei de cima.
Ă Numa? Numa nĂŁo, mas Ă© Joane
De Portugal Terceiro sem Segundo.
Doces Ăguas E Claras Do Mondego
Doces ĂĄguas e claras do Mondego,
doce repouso de minha lembrança,
onde a comprida e pérfida esperança
longo tempo após si me trouxe cego;de vós me aparto; mas, porém, não nego
que inda a memória longa, que me alcança,
me não deixa de vós fazer mudança,
mas quanto mais me alongo, mais me achego.Bem pudera Fortuna este instrumento
d’alma levar por terra nova e estranha,
oferecido ao mar remoto e vento;mas alma, que de cĂĄ vos acompanha,
nas asas do ligeiro pensamento,
para vĂłs, ĂĄguas, voa, e em vĂłs se banha.
O CapitĂŁo Ilustre, e Assinalado, Dom Fernando de Castro
Debaixo desta pedra estĂĄ metido,
Das sanguinosas armas descansado,
O CapitĂŁo ilustre, e assinalado,
Dom Fernando de Castro, e esclarecido.Este por todo o Oriente tĂŁo metido,
Este da prĂłpria inveja tĂŁo cantado,
Este, enfim, raio de Mavorte irado,
Aqui estĂĄ agora em terra convertido.Alegra-te, Ăł guerreira LusitĂąnia,
Por est’outro Viriato que criaste,
E chora a perda sua eternamente.Exemplo toma nisto de DardĂąnia;
Que se a Roma com ele aniquilaste,
Nem por isso Cartago estĂĄ contente.
Quando nĂŁo te Vejo Perco o Siso
Formosura do CĂ©u a nĂłs descida,
Que nenhum coração deixas isento,
Satisfazendo a todo pensamento,
Sem que sejas de algum bem entendida;Qual lĂngua pode haver tĂŁo atrevida,
Que tenha de louvar-te atrevimento,
Pois a parte melhor do entendimento,
No menos que em ti hĂĄ se vĂȘ perdida?Se em teu valor contemplo a menor parte,
Vendo que abre na terra um paraĂso,
Logo o engenho me falta, o espĂrito mĂngua.Mas o que mais me impede inda louvar-te,
Ă que quando te vejo perco a lĂngua,
E quando nĂŁo te vejo perco o siso.
No Mundo Poucos Anos, E Cansados
No mundo poucos anos, e cansados,
vivi, cheios de vil miséria dura;
foi-me tĂŁo cedo a luz do dia escura,
que nĂŁo vi cinco lustros acabados.Corri terras e mares apartados
buscando à vida algum remédio ou cura;
mas aquilo que, enfim, nĂŁo quer ventura,
não o alcançam trabalhos arriscados.Criou-me Portugal na verde e cara
pĂĄtria minha Alenquer; mas ar corruto
que neste meu terreno vaso tinha,me fez manjar de peixes em ti, bruto
mar, que bates na AbĂĄssia fera e avara,
tĂŁo longe da ditosa pĂĄtria minha!