Sonetos sobre Sol de Luís de CamÔes

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Senhora minha, se de pura inveja

Senhora minha, se de pura inveja
Amor me tolhe a vista delicada,
A cor, de rosa e neve semeada,
E dos olhos a luz que o Sol deseja,

NĂŁo me pode tolher que vos nĂŁo veja
Nesta alma, que ele mesmo vos tem dada,
Onde vos terei sempre debuxada,
Por mais cruel inimigo que me seja.

Nela vos vejo, e vejo que nĂŁo nasce
Em belo e fresco prado deleitoso
SenĂŁo flor que dĂĄ cheiro a toda a serra.

Os lĂ­rios tendes nu~a e noutra face.
Ditoso quem vos vir, mas mais ditoso
Quem os tiver, se hĂĄ tanto bem na terra!

Pelos Extremos Raros Que Mostrou

Pelos extremos raros que mostrou
em saber, Palas, VĂ©nus em fermosa,
Diana em casta, Juno em animosa,
África, Europa e Asia as adorou.

Aquele saber grande que ajuntou
esprito e corpo em liga generosa,
esta mundana mĂĄquina lustrosa,
de sĂł quatro Elementos fabricou.

Mas mor milagre fez a natureza
em vĂłs, Senhoras, pondo em cada ĂŒa
o que por todas quatro repartiu.

A vĂłs seu resplandor deu Sol e LĂŒa,
a vós com viva luz, graça e pureza,
Ar, Fogo, Terra e Água vos serviu.

A Fermosura Fresca Serra

A fermosura fresca serra,
e a sombra dos verdes castanheiros,
o manso caminhar destes ribeiros,
donde toda a tristeza se desterra;

o rouco som do mar, a estranha terra,
o esconder do sol pelos outeiros,
o recolher dos gados derradeiros,
das nuvens pelo ar a branda guerra;

enfim, tudo o que a rara natureza
com tanta variedade nos ofrece,
me estĂĄ (se nĂŁo te vejo) magoando.

Sem ti, tudo me enoja e me aborrece;
sem ti, perpetuamente estou passando
nas mores alegrias, mor tristeza.

Hei-de Tomar-te

Lindo e subtil trançado, que ficaste
Em penhor do remédio que mereço,
Se só contigo, vendo-te, endoudeço,
Que fora co’os cabelos que apertaste?

Aquelas tranças de ouro que ligaste,
Que os raios de sol tĂȘm em pouco preço,
Não sei se para engano do que peço,
Ou para me matar as desataste.

Lindo trançado, em minhas mãos te vejo,
E por satisfação de minhas dores,
Como quem nĂŁo tem outra, hei-de tomar-te.

E se nĂŁo for contente o meu desejo,
Dir-lhe-ei que, nesta regra dos amores,
Por o todo também se toma a parte.

Quando O Sol Encoberto Vai Mostrando

Quando o Sol encoberto vai mostrando
ao mundo a luz quieta e duvidosa,
ao longo de ĂŒa praia deleitosa,
vou na minha inimiga imaginando.

Aqui a vi, os cabelos concertando;
ali, co a mĂŁo na face tĂŁo fermosa;
aqui, falando alegre, ali cuidosa;
agora estando queda, agora andando.

aqui esteve sentada, ali me viu,
erguendo aqueles olhos tĂŁo isentos;
aqui movida um pouco, ali segura;

qui se entristeceu, ali se riu;
enfim, nestes cansados pensamentos
passo esta vida vĂŁ, que sempre dura.

Vossos Olhos, Senhora, Que Competem

Vossos olhos, Senhora, que competem
co Sol em fermosura e claridade,
enchem os meus de tal suavidade
que em lĂĄgrimas, de vĂȘ-los, se derretem.

Meus sentidos vencidos se sometem
assi cegos a tanta majestade;
e da triste prisĂŁo, da escuridade,
cheios de medo, por fugir remetem.

Mas se nisto me vedes por acerto,
o ĂĄspero desprezo com que olhais
torna a espertar a alma enfraquecida.

Ó gentil cura e estranho desconcerto!
Que farĂĄ o favor que vĂłs nĂŁo dais,
quando o vosso desprezo torna a vida?

O Raio Cristalino S’estendia

O raio cristalino s’estendia
pelo mundo, da Aurora marchetada,
quando Nise, pastora delicada,
donde a vida deixava, se partia.

Dos olhos, com que o Sol escurecia,
levando a vista em lĂĄgrimas banhada,
de si, do Fado e Tempo magoada,
pondo os olhos no CĂ©u, assi dezia:

-Nasce, sereno Sol, puro e luzente;
resplandece, fermosa e roxa Aurora,
qualquer alma alegrando descontente;

que a minha, sabe tu que, desd’agora,
jamais na vida a podes ver contente,
nem tĂŁo triste nenhĂŒa outra pastora.

Quanto Mais me Paga, Mais me Deve

Passo por meus trabalhos tĂŁo isento
De sentimento grande nem pequeno,
Que sĂł por a vontade com que peno
Me fica Amor devendo mais tormento.

Mas vai-me Amor matando tanto a tento,
Temperando a triaga c’o veneno,
Que do penar a ordem desordeno,
Porque nĂŁo mo consente o sofrimento.

Porém se esta fineza o Amor sente
E pagar-me meu mal com mal pretende,
Torna-me com prazer como ao sol neve.

Mas se me vĂȘ co’os males tĂŁo contente,
Faz-se avaro da pena, porque entende
Que quanto mais me paga, mais me deve.

A VĂłs Seu Resplendor Deu Sol e Lua

Pelos raros extremos que mostrou
Em sĂĄbia Palas, VĂ©nus em formosa,
Diana em casta, Juno em animosa,
África, Europa e Ásia as adorou.

Aquele saber grande que juntou
EspĂ­rito e corpo em liga generosa,
Esta mundana mĂĄquina lustrosa
De sĂł quatro elementos fabricou.

Mas fez maior milagre a natureza
Em vĂłs, Senhoras, pondo em cada uma
O que por todas quatro repartiu.

A vĂłs seu resplendor deu Sol e Lua:
A vós com viva luz, graça e pureza,
Ar, Fogo, Terra e Água vos serviu.

O Dia Em Que Eu Nasci, Moura E Pereça

O dia em que eu nasci, moura e pereça,
nĂŁo o queira jamais o tempo dar,
nĂŁo torne mais ao mundo, e, se tornar,
eclipse nesse passo o sol padeça.

luz lhe falte, o sol se [lhe] escureça,
mostre o mundo sinais de se acabar,
nasçam-lhe monstros, sangue chova
o ar, a mãe ao próprio filho não conheça.

s pessoas pasmadas de ignorantes,
as lĂĄgrimas no rosto, a cor perdida,
cuidem que o mundo jĂĄ se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
que este dia deitou ao mundo a vida
mais desgraçada que jamais se viu!

Vossos Olhos, Senhora, que Competem

Vossos olhos, Senhora, que competem
Com o Sol em beleza e claridade,
Enchem os meus de tal suavidade,
Que em lĂĄgrimas de vĂȘ-los se derretem.

Meus sentidos prostrados se submetem
Assim cegos a tanta majestade;
E da triste prisĂŁo, da escuridade,
Cheios de medo, por fugir remetem.

Porém se então me vedes por acerto,
Esse ĂĄspero desprezo com que olhais
Me torna a animar a alma enfraquecida.

Oh gentil cura! Oh estranho desconcerto!
Que dareis c’ um favor que vĂłs nĂŁo dais,
Quando com um desprezo me dais vida?

Quem pode livre ser, gentil Senhora,

Quem pode livre ser, gentil Senhora,
Vendo-vos com juĂ­zo sossegado,
Se o Menino que de olhos Ă© privado
Nas meninas de vossos olhos mora?

Ali manda, ali reina, ali namora,
Ali vive das gentes venerado;
Que o vivo lume e o rosto delicado
Imagens sĂŁo nas quais o Amor se adora.

Quem vĂȘ que em branca neve nascem rosas
Que fios crespos de ouro vĂŁo cercando,
Se por entre esta luz a vista passa,

Raios de ouro verĂĄ, que as duvidosas
Almas estĂŁo no peito trespassando
Assim como um cristal o Sol trespassa.

Vos Foi Beijar na Parte Onde se Via

O fogo que na branda cera ardia,
Vendo o rosto gentil, que eu na alma vejo,
Se acendeu de outro fogo do desejo
Por alcançar a luz que vence o dia.

Como de dois ardores se incendia,
Da grande impaciĂȘncia fez despejo,
E, remetendo com furor sobejo,
Vos foi beijar na parte onde se via.

Ditosa aquela flama que se atreve
A apagar seus ardores e tormentos
Na vista a quem o sol temores deve!

Namoram-se, Senhora, os Elementos
De vĂłs, e queima o fogo aquela neve
Que queima coraçÔes e pensamentos.

Imagens sĂŁo adonde Amor se Adora

Quem pode livre ser, gentil Senhora,
Vendo-vos com juĂ­zo sossegado,
Se o Menino, que de olhos Ă© privado,
Nas Meninas dos vossos olhos mora?

Ali manda, ali reina, ali namora,
Ali vive das gentes venerado;
Que vivo lume, e o rosto delicado,
Imagens sĂŁo adonde Amor se adora.

Quem vĂȘ que em branca neve nascem rosas
Que crespos fios de ouro vĂŁo cercando?
Se por entre esta luz a vista passa,

Raios de ouro verĂĄ, que as duvidosas
Almas estĂŁo no peito traspassando,
Assim como um cristal o Sol traspassa.

De Quantas Graças Tinha, A Natureza

De quantas graças tinha, a Natureza
fez um belo e riquĂ­ssimo tesouro;
e com rubis e rosas, neve e ouro,
Formou sublime e angélica beleza.

PĂŽs na boca os rubis, e na pureza
do belo rostro as rosas, por quem mouro;
no cabelo o valor do metal louro;
no peito a neve em que a alma tenho acesa.

Mas nos olhos mostrou quanto podia,
e fez deles um sol, onde se apura
a luz mais clara que a do claro dia.

Enfim, Senhora, em vossa compostura
ela a apurar chegou quanto sabia
de ouro, rosas, rubis, neve e luz pura.

O dia em que nasci moura e pereça,

O dia em que nasci moura e pereça,
NĂŁo o queira jamais o tempo dar;
NĂŁo torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o Sol padeça.

A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lĂĄgrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo jĂĄ se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao Mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!

Lindo E Sutil Trançado, Que Ficaste

Lindo e sutil trançado, que ficaste
em penhor do remédio que mereço,
se só contigo, vendo te, endoudeço,
que fora cos cabelos que apertaste?

Aquelas tranças d’ouro, que ligaste,
que os raios do Sol tĂȘm em pouco preço,
não sei se para engano do que peço
se para me atar, os desataste.

Lindo trançado, em minhas mãos te vejo,
e por satisfação de minhas dores
como quem nĂŁo tem outra, hei de tomar te.

E se nĂŁo for contente meu desejo,
dir lhe hei que, nesta regra dos amores,
pelo todo também se toma a parte.

De Um TĂŁo Felice Engenho, Produzido

De um tĂŁo felice engenho, produzido
de outro, que o claro Sol nĂŁo viu maior,
Ă© trazer cousas altas no sentido,
todas dinas de espanto e de louvor.

Museu foi antiquĂ­ssimo escritor,
filĂłsofo e poeta conhecido,
discĂ­pulo do MĂșsico amador
que co som teve o Inferno suspendido.

Este pĂŽde abalar o monte mudo,
cantando aquele mal, que eu jĂĄ passei,
do mancebo de Abido mal sisudo.

Agora contam jĂĄ (segundo achei),
Passo, e o nosso BoscĂŁo, que disse tudo
dos segredos que move o cego Rei.