Sonetos sobre Terra de Manuel Maria Barbosa du Bocage

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Sonetos de terra de Manuel Maria Barbosa du Bocage. Leia este e outros sonetos de Manuel Maria Barbosa du Bocage em Poetris.

Das Terras A Pior Tu És, Ó Goa

Das terras a pior tu Ă©s, Ăł Goa,
Tu pareces mais ermo que cidade,
Mas alojas em ti maior vaidade
Que Londres, que Paris ou que Lisboa.

A chusma de teus Ă­ncolas pregoa
Que excede o GrĂŁo Senhor na qualidade;
Tudo quer senhoria; o prĂłprio frade
Alega, para tĂȘ-la, o jus da c’roa!

De timbres prenhe estĂĄs; mas oiro e prata
Em cruzes, com que dantes te benzias,
Foge a teus infançÔes de bolsa chata.

Oh que feliz e esplĂȘndida serias,
Se algum fusco Merlim, que faz bagata,
Te alborcasse a pardaus as senhorias!

Meus Olhos, Atentai no Meu Jazigo

Meus olhos, atentai no meu jazigo,
Que o momento da morte estĂĄ chegado;
Lå soa o corvo, intérprete do fado;
Bem o entendo, bem sei, fala comigo:

Triunfa, Amor, gloria-te, inimigo;
E tu, que vĂȘs com dor meu duro estado,
Volve Ă  terra o cadĂĄver macerado,
O despojo mortal do triste amigo:

Na campa, que o cobrir, piedoso Albano,
Ministra aos coraçÔes, que Amor flagela,
Terror, piedade, aviso, e desengano:

Abre em meu nome este epitĂĄfio nela:
“Eu fui, ternos mortais, o terno Elmano;
Morri de ingratidĂ”es, matou-me Isabela.”

Neste HorrĂ­vel Sepulcro Da ExistĂȘncia

Neste horrĂ­vel sepulcro da existĂȘncia
O triste coração de dor se parte;
A mesquinha razĂŁo se vĂȘ sem arte,
Com que dome a frenĂ©tica impaciĂȘncia:

Aqui pela opressĂŁo, pela violĂȘncia
Que em todos os sentidos se reparte,
TransitĂłrio poder que imitar-te,
Eterna, vingadora omnipotĂȘncia!

Aqui onde o peito abrange, e sente,
Na mais ampla expressĂŁo acha estreiteza,
Negra idéia do abismo assombra a mente.

Difere acaso da infernal tristeza
Não ver terra, nem céu, nem mar, nem gente,
Ser vivo, e nĂŁo gozar da Natureza ?

Raios não Peço ao Criador do Mundo

LX

Raios não peço ao Criador do Mundo,
Tormentas nĂŁo suplico ao Rei dos Mares,
VulcÔes à terra, furacÔes aos ares,
Negros monstros ao bĂĄratro profundo:

NĂŁo rogo ao deus de amor que furibundo
Te arremesse do pé de seus altares;
Ou que a peste mortal voe a teus lares,
E murche o teu semblante rubicundo.

Não imploro em teu dano, ainda que os laços
Urdidos pela fé, com vil mudança
Fizeste, ingrata Nise, em mil pedaços:

Não quero outro despique, outra vingança,
Mais que ver-te em poder de indignos braços,
E dizer quem te perde, e quem te alcança.

Apenas Vi Do Dia A Luz Brilhante

Apenas vi do dia a luz brilhante
LĂĄ de TĂșbal no empĂłrio celebrado,
Em sanguĂ­neo carĂĄcter foi marcado
Pelos Destinos meu primeiro instante.

Aos dois lustros a morte devorante
Me roubou, terna mĂŁe, teu doce agrado;
Segui Marte depois, e em fim meu fado
Dos irmĂŁos e do pai me pĂŽs distante.

Vagando a curva terra, o mar profundo,
Longe da pĂĄtria, longe da ventura,
Minhas faces com lĂĄgrimas inundo.

E enquanto insana multidĂŁo procura
Essas quimeras, esses bens do mundo,
Suspiro pela paz da sepultura.

Desejo Amante

Elmano, de teus mimos anelante,
Elmano em te admirar, meu bem, nĂŁo erra;
IncomparĂĄveis dons tua alma encerra,
Ornam mil perfeiçÔes o teu semblante:

Granjeias sem vontade a cada instante
Claros triunfos na amorosa guerra:
Tesouro que do CĂ©u vieste Ă  Terra,
NĂŁo precisas dos olhos de um amante.

Oh!, se eu pudesse, Amor, oh!, se eu pudesse
Cumprir meu gosto! Se em altar sublime
Os incensos de Jove a LĂ­lia desse!

Folgara o coração quanto se oprime;
E a RazĂŁo, que os excessos aborrece,
Notando a causa, revelara o crime.

Soneto Ditado Na Agonia

JĂĄ Bocage nĂŁo sou!… À cova escura
Meu estro vai parar desfeito em vento…
Eu aos CĂ©us ultrajei! O meu tormento
Leve me torne sempre a terra dura;

Conheço agora jå quão vã figura,
Em prosa e verso fez meu louco intento:
Musa!… Tivera algum merecimento
Se um raio da razĂŁo seguisse pura.

Eu me arrependo; a lĂ­ngua quasi fria
Brade em alto pregĂŁo Ă  mocidade,
Que atrĂĄs do som fantĂĄstico corria:

Outro Aretino fui… a santidade
Manchei!… Oh! Se me creste, gente Ă­mpia,
Rasga meus versos, crĂȘ na eternidade!.