A Desordem da Minha Natureza
(…) enfrentei pela primeira vez o meu ser natural enquanto decorriam os meus noventa anos. Descobri que a minha obsessĂŁo de que cada coisa estivesse no seu lugar, cada assunto no seu tempo, cada palavra no seu estilo, nĂŁo era o prĂ©mio merecido de uma mente ordenada mas, pelo contrário, um sistema completo de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que nĂŁo sou disciplinado por virtude, mas como reacção contra a minha negligĂŞncia; que pareço generoso para encobrir a minha mesquinhez, que passo por prudente por ser pessimista, que sou conciliador para nĂŁo sucumbir Ă s minhas cĂłleras reprimidas, que sĂł sou pontual para que nĂŁo se saiba que pouco me importa o tempo alheio. Descobri, por fim, que o amor nĂŁo Ă© um estado de alma mas um signo do ZodĂaco.
Textos sobre Amor de Gabriel GarcĂa Márquez
2 resultadosO Poder das Palavras
A humanidade entrará no terceiro milĂ©nio sob o impĂ©rio das palavras. NĂŁo Ă© verdade que a imagem esteja a suplantá-las nem que possa extingui-las. Pelo contrário, está a potenciá-las: nunca houve no mundo tantas palavras com tanto alcance, autoridade e arbĂtrio como na imensa Babel da vida atual. Palavras inventadas, maltratadas ou sacralizadas pela imprensa, pelos livros descartáveis, pelos cartazes de publicidade; faladas e cantadas pela rádio, pela televisĂŁo, pelo cinema, pelo telefone, pelos altifalantes pĂşblicos: gritadas Ă brocha nas paredes da rua ou sussurradas ao ouvido nas penumbras do amor. NĂŁo: o grande derrotado Ă© o silĂŞncio. As coisas tĂŞm agora tantos nomes em tantas lĂnguas que já nĂŁo Ă© fácil saber como se chamam em nenhuma. Os idiomas dispersam-se Ă rĂ©dea solta, misturam-se e confundem-se, desembestados rumo ao destino inelutável de uma lĂngua global.