O Engano da Bondade
Endureçamos a bondade, amigos. Ela também é bondosa, a cutilada que faz saltar a roedura e os bichos: também é bondosa a chama nas selvas incendiadas para que os arados bondosos fendam a terra.
Endureçamos a nossa bondade, amigos. Já nĂŁo há pusilânime de olhos aguados e palavras brandas, já nĂŁo há cretino de intenção subterrânea e gesto condescendente que nĂŁo leve a bondade, por vĂłs outorgada, como uma porta fechada a toda a penetração do nosso exame. Reparai que necessitamos que se chamem bons aos de coração recto, e aos nĂŁo flexĂveis e submissos.
Reparai que a palavra se vai tornando acolhedora das mais vis cumplicidades, e confessai que a bondade das vossas palavras foi sempre – ou quase sempre – mentirosa. Alguma vez temos de deixar de mentir, porque, no fim de contas, sĂł de nĂłs dependemos, e mortificamo-nos constantemente a sĂłs com a nossa falsidade, vivendo assim encerrados em nĂłs prĂłprios entre as paredes da nossa estuta estupidez.
Os bons serão os que mais depressa se libertarem desta mentira pavorosa e souberem dizer a sua bondade endurecida contra todo aquele que a merecer. Bondade que se move, não com alguém, mas contra alguém. Bondade que não agride nem lambe,
Textos sobre Bondade de Pablo Neruda
2 resultadosLuto pela Bondade
Quero viver num mundo sem excomungados. NĂŁo excomungarei ninguĂ©m. NĂŁo diria, amanhĂŁ, a esse sacerdote: «VocĂŞ nĂŁo pode baptizar ninguĂ©m porque Ă© anticomunista.» NĂŁo diria ao outro: «NĂŁo publicarei o seu poema, o seu trabalho, porque vocĂŞ Ă© anticomunista.» Quero viver num mundo em que os seres sejam simplesmente humanos, sem mais tĂtulos alĂ©m desse, sem trazerem na cabeça uma regra-, uma palavra rĂgida, um rĂłtulo. Quero que se possa entrar em todas as igrejas, em todas as tipografias. Quero que nĂŁo esperem ninguĂ©m, nunca mais, Ă porta do municĂpio para o deter e expulsar. Quero que todos entrem e saiam sorridentes da Câmara Municipal. NĂŁo quero que ninguĂ©m fuja em gĂ´ndola, que ninguĂ©m seja perseguido de motocicleta. Quero que a grande maioria, a Ăşnica maioria, todos, possam falar, ler, ouvir, florescer. Nunca compreendi a luta senĂŁo como um meio de acabar com ela. Nunca aceitei o rigor senĂŁo como meio para deixar de existir o rigor. Tomei um caminho porque creio que esse caminho nos leva, a todos, a essa amabilidade duradoura. Luto pela bondade ubĂqua, extensa, inexaurĂvel. De tantos encontros entre a minha poesia e a polĂcia, de todos esses episĂłdios e de outros que nĂŁo contarei porque repetidos,