Textos sobre Exterior de Matias Aires

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Textos de exterior de Matias Aires. Leia este e outros textos de Matias Aires em Poetris.

O Que Esconde o Admirável

São raras as acções, que sejam ilustres por si mesmas; dificilmente haverá algumas, que não deixem conhecer que vêm do homem. As mais das cousas admiram-se, porque se não conhecem; e juntamente porque nelas há um rico véu, que as cobre: vemos um exterior brilhante, que muitas vezes serve de esconder um abismo horrendo; a mesma luz arma-se de raios, para que não possa examinar-se de onde lhe vêm os resplandores; a formusura em tudo nos atrai; a nossa admiração não pode passar além; donde a encontra, aí fica suspensa, e cega.
Isto sucede nas acções dos homens; as mais sublimes, parece que nos cegam, e suspendem; e talvez seriam detestáveis, se lhes não ignorássemos as causas. Tudo o que tem ar de grande prende a nossa imaginação de sorte, que não fica livre para discorrer na cousa, senão no estado de grandeza em que a vê, e não para indagar de onde veio, nem como veio.

É Mais Fácil Sustentar uma Opinião Má, do que Escolher uma Boa

É mais fácil sustentar uma opinião má, do que escolher uma boa; porque o erro é como um edifício, cuja fábrica exterior é composta de uma infinidade de ângulos; com algum destes encontra-se o pensamento facilmente, porque são muitos, ao passo que o acerto é como um ponto fixo no meio de uma esfera; o pensamento que anda vagando à roda, não vê o ponto, porque este é só um; do mesmo corpo nasce a sombra que o encobre: são inumeráveis as linhas, que se podem lançar de uma circunferência para um centro comum; alguma linha há-de ver-se, porque são muitas, e o centro não, porque é único: a superfície do globo impede o poder ver-se a sua concavidade; ou se há-de ver uma coisa, ou outra; ambas ao mesmo tempo não pode ser.

A Vaidade Deforma a Alegria e a Tristeza

As virtudes humanas muitas vezes se compõem de melancolia, e de um retiro agreste. As mais das vezes é humor o que julgamos razão; é temperamento o que chamamos desengano; e é enfermidade o que nos parece virtude. Tudo são efeitos da tristeza; esta obriga-nos a seguir os partidos mais violentos, e mais duros; raras vezes nos faz reflectir sobre o passado, quási sempre nos ocupa em considerar futuros; por isso nos infunde temor, e cobardia, na incerteza de acontecimentos felizes, ou infaustos; e verdadeiramente a alegria nos governa em forma, que seguimos como por força os movimentos dela; e do mesmo modo os da tristeza.
Um ânimo alegre disfarça mal o riso, um coração triste encobre mal o seu desgosto: como há-de chorar quem está contente? E como há-de rir quem está triste? Se alguma vez se chora donde só se deve rir, ou se ri por aquilo por que se deve chorar, a alma então penetrada de dor, ou de prazer, desmente aquele exterior fingido, e falso. Só a vaidade sabe transformar o gosto em dor, e esta em prazer, a alegria em tristeza, e esta em contentamento; por isso as feridas não se sentem, antes lisonjeiam,

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