Textos sobre Fatos de Mia Couto

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Textos de fatos de Mia Couto. Leia este e outros textos de Mia Couto em Poetris.

A ViolĂȘncia Oculta

A primeira razĂŁo por que a violĂȘncia maior actua de modo silencioso, e das poucas vezes que falamos dela falamos apenas da ponta do icebergue. NĂłs acreditamos que estamos perante fenĂłmenos de violĂȘncia apenas quando essa tensĂŁo assume proporçÔes visĂ­veis, quando ela surge como espectĂĄculo mediĂĄtico. Mas esquecemos que existem formas de violĂȘncia oculta que sĂŁo gravĂ­ssimas. Esquecemos, por exemplo, que todos os dias, no nosso paĂ­s, sĂŁo sexualmente violentadas crianças. E que, na maior parte das vezes, os agressores nĂŁo sĂŁo estranhos. Quem viola essas crianças sĂŁo principalmente parentes. Quem pratica esse crime Ă© gente da prĂłpria casa.

NĂłs temos nĂ­veis altĂ­ssimos de violĂȘncia domĂ©stica, em particular, de violĂȘncia contra a mulher. Mas esse assunto parece ser preocupação de poucos. Fala-se disso em algumas ONGs, em alguns seminĂĄrios. A Lei contra a violĂȘncia domĂ©stica ainda nĂŁo foi aprovada na Assembleia da RepĂșblica.

Existem vĂĄrias outras formas invisĂ­veis de violĂȘncia. Existe violĂȘncia quando os camponeses sĂŁo expulsos sumariamente das suas terras por gente poderosa e nĂŁo possuem meios para defender os seus direitos. Existe uma violĂȘncia contida quando, perante o agente corrupto da autoridade, nĂŁo nos surge outra saĂ­da senĂŁo o suborno. Existe, enfim, a violĂȘncia terrĂ­vel que Ă© o vivermos com medo.

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Presos ao Passado

Num romance que estou escrevendo hå uma personagem a quem perguntam: «E onde irås ser sepultado?» E ela responde: «A minha sepultura maior não mora no futuro. A minha cova é o meu passado.»
De facto, cada um de nĂłs corre o risco de ficar sepultado no seu prĂłprio passado. Todos temos de resistir para nĂŁo ficarmos aprisionados numa memĂłria simplificada que Ă© o retrato que outros fizeram de nĂłs. Todos trazemos escrito um livro e esse texto quer-se impor como nossa nascente e como nosso destino. Se existe uma guerra em cada um de nĂłs Ă© a de nos opormos a esse fado de estarmos condenados a uma Ășnica e previsĂ­vel narrativa.