O Prazer em Perspectiva: a Esperança
A esperança Ă© filha do desejo, mas nĂŁo Ă© o desejo. Constitui uma aptidĂŁo mental, que nos fez crer na realização de um desejo. Podemos desejar uma coisa sem que a esperemos. Toda gente deseja a fortuna, muito poucos a esperam. Os sĂĄbios desejam descobrir a causa primitiva dos fenĂŽmenos; eles nĂŁo tĂȘm nenhuma esperança de consegui-lo. O desejo aproxima-se algumas vezes da esperança, a ponto de confundir-se com ela. Na roleta, eu desejo e espero ganhar.
A esperança Ă© uma forma de prazer em expectativa que, na sua atual fase de espera, constitui uma satisfação freqĂŒentemente maior do que o contentamento produzido pela sua realização. A razĂŁo Ă© evidente. O prazer realizado limita-se em quantidade e em duração, ao passo que nada limita a grandeza do sonho criado pela esperança. A força e o encanto da esperança consistem em conter todas as possibilidades de prazer. Ela constitui uma espĂ©cie de vara mĂĄgica que transforma tudo. Os reformadores nunca fizeram mais do que substituir uma esperança por outra.
Textos sobre Maior de Gustave Le Bon
7 resultadosA InfluĂȘncia das IlusĂ”es nas Nossas Vidas
Traçar o papel das ilusĂ”es na gĂ©nese das opiniĂ”es e das crenças seria refazer a histĂłria da humanidade. Da infĂąncia Ă morte, a ilusĂŁo envolve-nos. SĂł vivemos por ela e sĂł ela desejamos. IlusĂ”es do amor, do Ăłdio, da ambição, da glĂłria, todas essas vĂĄrias formas de uma felicidade incessantemente esperada, mantĂȘm a nossa actividade. Elas iludem-nos sobre os nossos sentimentos e sobre os sentimentos alheios, velando-nos a dureza do destino.
As ilusÔes intelectuais são relativamente raras; as ilusÔes afectivas são quotidianas. Crescem sempre porque persistimos em querer interpretar racionalmente sentimentos muitas vezes ainda envoltos nas trevas do inconsciente. A ilusão afectiva persuade, por vezes, que entes e coisas nos aprazem, quando, na realidade, nos são indiferentes. Faz também acreditar na perpetuidade de sentimentos que a evolução da nossa personalidade condena a desaparecer com a maior brevidade.
Todas essas ilusĂ”es fazem viver e aformoseiam a estrada que conduz ao eterno abismo. NĂŁo lamentemos que tĂŁo raramente sejam submetidas Ă anĂĄlise. A razĂŁo sĂł consegue dissolvĂȘ-las paralisando, ao mesmo tempo, importantes mĂłbeis de acção. Para agir, cumpre nĂŁo saber demasiado. A vida Ă© repleta de ilusĂ”es necessĂĄrias.
Os motivos para não querer multiplicam-se com as discussÔes das coisas do querer.
Crenças e OpiniÔes Vencem o Conhecimento
A idade moderna contĂ©m tanta fĂ© quanto tiveram os sĂ©culos precedentes. Nos novos templos pregam-se dogmas, tĂŁo despĂłticos quanto os do passado, e estes contam fiĂ©is igualmente numerosos. Os velhos credos religiosos que outrora escravizavam a multidĂŁo, sĂŁo substituĂdos por credos socialistas ou anarquistas, tĂŁo imperiosos e tĂŁo pouco racionais como aqueles, mas nĂŁo dominam menos as almas. A igreja Ă© substituĂda muitas vezes pela taberna, mas aos sermĂ”es dos agitadores mĂsticos que aĂ sĂŁo ouvidos, atribui-se a mesma fĂ©.
Se a mentalidade dos fieis nĂŁo tem evoluĂdo muito desde a Ă©poca remota em que, Ă s margens do Nilo, Isis e Hathor atraĂam aos seus templos milhares de fervorosos peregrinos, Ă© porque, no decurso das idades, os sentimentos, verdadeiros alicerces da alma, mantĂȘm a sua fixidez. A inteligĂȘncia progride, mas os sentimentos nĂŁo mudam.
A fĂ© num dogma qualquer Ă©, sem dĂșvida, de um modo geral, apenas uma ilusĂŁo. Cumpre, contudo, nĂŁo a desdenhar. Graças Ă sua mĂĄgica pujança, o irreal torna-se mais forte do que o real. Uma crença aceite dĂĄ a um povo uma comunhĂŁo de pensamentos que originam a sua unidade e a sua força.
Sendo o domĂnio do conhecimento muito diverso do terreno da crença,
A Moda
As variaçÔes da sensibilidade sob a influĂȘncia das modificaçÔes do meio, das necessidades, das preocupaçÔes, etc., criam um espĂrito pĂșblico que varia de uma geração para outra e mesmo muitas vezes no espaço de uma geração. Esse espĂrito publico, rapidamente dilatado por contacto mental, determina o que se chama a moda. Ela Ă© um possante factor de propagação da maior parte dos elementos da vida social, das nossas opiniĂ”es e das nossas crenças.
NĂŁo Ă© sĂł o vestuĂĄrio que se submete Ă s suas vontades. O teatro, a literatura, a polĂtica, a arte, as prĂłprias idĂ©ias cientĂficas lhe obedecem, e Ă© por isso que certas obras apresentam um fundo de semelhança que permite falar do estilo de uma Ă©poca.
Em virtude da sua acção inconsciente, submetemo-nos Ă moda sem que o percebamos. Os espĂritos mais independentes a ela nĂŁo se podem subtrair. SĂŁo muito raros os artistas, os escritores que ousam produzir uma obra muito diferente das ideias do dia.
A influĂȘncia da moda Ă© tĂŁo pujante que ela obriga-nos, por vezes, a admirar coisas sem interesse e que parecerĂŁo mesmo de uma fealdade extrema, alguns anos mais tarde. O que nos impressiona numa obra de arte Ă© muito raramente a obra em si mesma,
OpiniÔes Influenciadas pelo Interesse
A maior parte das coisas pode ser considerada sob pontos de vista muito diferentes: interesse geral ou interesse particular, principalmente. A nossa atenção, naturalmente concentrada sob o aspecto que nos Ă© proveitoso, impede que vejamos os outros. O interesse possui, como a paixĂŁo, o poder de transformar em verdade aquilo em que lhe Ă© Ăștil acreditar. Ele Ă©, pois, freqĂŒentemente, mais Ăștil do que a razĂŁo, mesmo em questĂ”es em que esta deveria ser, aparentemente, o guia Ășnico. Em economia polĂtica, por exemplo, as convicçÔes sĂŁo de tal modo inspiradas pelo interesse pessoal que se pode, em geral, saber prĂ©viamente, conforme a profissĂŁo de um indivĂduo, se ele Ă© partidĂĄrio ou nĂŁo do livre cĂąmbio.
As variaçÔes de opiniĂŁo obedecem, naturalmente, Ă s variaçÔes do interesse. Em matĂ©ria polĂtica, o interesse pessoal constitui o principal factor. Um indivĂduo que, em certo momento, energicamente combateu o imposto sobre a renda, com a mesma energia o defenderĂĄ mais, se conta ser ministro. Os socialistas enriquecidos acabam, em geral, conservadores, e os descontentes de um partido qualquer se transformam facilmente em socialistas.
O interesse, sob todas as suas formas, não é somente gerador de opiniÔes. Aguçado por necessidades muito intensas, ele enfraquece logo a moralidade.
A Maldade como Poderoso Elemento do Progresso Humano
Os sentimentos fixos e de forma constante qualificados de paixĂ”es constituem, tambĂ©m, possantes factores de opiniĂ”es, de crenças e, por conseguinte, de conduta. Certas paixĂ”es contagiosas tornam-se, por esse motivo, facilmente colectivas. A sua acção Ă©, entĂŁo, irresistĂvel. Elas precipitaram muitos povos uns contra os outros nas diversas fases da histĂłria. As paixĂ”es podem excitar a nossa actividade, porĂ©m, alteram, as mais das vezes, a justeza das opiniĂ”es, impedindo de ver as coisas como realmente sĂŁo e de compreender a sua gĂ©nese. Se nos livros de histĂłria sĂŁo abundantes os erros, Ă© porque, na maior parte dos casos, as paixĂ”es ditam a sua narrativa. NĂŁo se citaria, penso eu, um historiador que haja relatado imparcialmente a Revolução.
O papel das paixĂ”es Ă©, como vemos, muito considerĂĄvel nas nossas opiniĂ”es e, por conseguinte, na gĂ©nese dos acontecimentos. NĂŁo sĂŁo, infelizmente, as mais recomendĂĄveis que tĂȘm exercido maior acção. Kant reconheceu a grande força social das piores paixĂ”es. A maldade Ă©, no seu juĂzo, um poderoso elemento do progresso humano. Parece, infelizmente, muito certo que, se os homens tivessem seguido o preceito do Evangelho âAmai-vos uns aos outrosâ, ao invĂ©s de obedecerem ao da Natureza, que os incita a se destruĂrem mutuamente,
Os Elementos Fixadores da Personalidade
Os resĂduos ancestrais formam a camada mais profunda e mais estĂĄvel do carĂĄcter dos indivĂduos e dos povos. Ă pelo seu âeuâ ancestral que um inglĂȘs, um francĂȘs, um chinĂȘs, diferem tĂŁo profundamente.
Mas a esses remotos atavismos sobrepĂ”em-se elementos suscitados pelo meio social (casta, classe, profissĂŁo, etc.), pela educação e ainda por muitas outras influĂȘncias. Eles imprimem Ă nossa personalidade uma orientação assaz constante. SerĂĄ o âeuâ, um pouco artificial, assim formado, que exteriorizaremos cada dia.
Entre todos os elementos formadores da personalidade, o mais activo, depois da raça, Ă© o que determina o agrupamento social ao qual pertencemos. Fundidas no mesmo molde pelas idĂ©ias, as opiniĂ”es e as condutas semelhantes que lhes sĂŁo impostas, as individualidades de um grupo: militares, magistrados, padres, operĂĄrios, marinheiros, etc., apresentam numerosos carĂĄcteres idĂȘnticos.
As suas opiniĂ”es e os seus juĂzos sĂŁo, em geral, vizinhos, porquanto sendo cada grupo social muito nivelador, a originalidade nĂŁo Ă© tolerada nele. Aquele que se quer diferenciar do seu grupo tem-no inteiramente por inimigo.
Essa tirania dos grupos sociais, na qual insistiremos, nĂŁo Ă© inĂștil. Se os homens nĂŁo tivessem por guia as opiniĂ”es e a maneira de proceder daqueles que os cercam,