InteligĂȘncia e Conhecimento nĂŁo Definem o Homem
NĂŁo se pode definir o homem pelos dotes ou meios com que conta, jĂĄ que nĂŁo estĂĄ dito que esses dotes, esses meios, logrem o que os seus nomes pretendem, ou melhor, que sejam adequados Ă pavorosa lide em que, queira ou nĂŁo, estĂĄ. Dito de outro modo: o homem nĂŁo se ocupa em conhecer, em saber, simplesmente porque tenha dons cognoscitivos, inteligĂȘncia, etc. – mas ao contrĂĄrio porque nĂŁo tem outro remĂ©dio que intentar conhecer, saber, mobilizando os meios de que dispĂ”e, embora estes sirvam muito mal para aquele mister. Se a inteligĂȘncia humana fosse de verdade o que a palavra indica – capacidade de entender – o homem teria imediatamente entendido tudo e estaria sem nenhum problema, sem lide penosa pela frente.
NĂŁo estĂĄ, pois, dito que a inteligĂȘncia do homem seja, com efeito, inteligĂȘncia; em troca, a lide em que o homem anda irremediavelmente metido, isso sim Ă© que Ă© indubitĂĄvel – e, portanto, isso sim Ă© o que o define! Essa lide – segundo dissemos – chama-se «viver» e o viver consiste em que o homem estĂĄ sempre em alguma circunstĂąncia, onde se acha de imediato e sem saber como, submerso, projectado num orbe ou contorno insubstituĂvel,
Textos sobre Mal de José Ortega y Gasset
3 resultadosA Nefasta Hiperdemocracia dos Nossos Tempos
NinguĂ©m, creio eu, deplorarĂĄ que as pessoas gozem hoje em maior medida e nĂșmero que antes, jĂĄ que tĂȘm para isso os apetites e os meios. O mal Ă© que esta decisĂŁo tomada pelas massas de assumir as actividades prĂłprias das minorias, nĂŁo se manifesta, nem pode manifestar-se, sĂł na ordem dos prazeres, mas que Ă© uma maneira geral do tempo. Assim (…) creio que as inovaçÔes polĂticas dos mais recentes anos nĂŁo significam outra coisa senĂŁo o impĂ©rio polĂtico das massas. A velha democracia vivia temperada por uma dose abundante de liberalismo e de entusiasmo pela lei. Ao servir a estes princĂpios o indivĂduo obrigava-se a sustentar em si mesmo uma disciplina difĂcil. Ao amparo do princĂpio liberal e da norma jurĂdica podiam atuar e viver as minorias. Democracia e Lei, convivĂȘncia legal, eram sinĂłnimos. Hoje assistimos ao triunfo de uma hiperdemocracia em que a massa actua directamente sem lei, por meio de pressĂ”es materiais, impondo suas aspiraçÔes e seus gostos.
Ă falso interpretar as situaçÔes novas como se a massa se houvesse cansado da polĂtica e encarregasse a pessoas especiais o seu exercĂcio. Pelo contrĂĄrio. Isso era o que antes acontecia, isso era a democracia liberal. A massa presumia que,
O Despotismo do Homem Vulgar
A histĂłria europĂ©ia parece, pela primeira vez, entregue Ă decisĂŁo do homem vulgar como tal. Ou dito em voz activa: o homem vulgar, antes dirigido, resolveu governar o mundo. Esta resolução de avançar para o primeiro plano social produziu-se nele, automaticamente, mal chegou a amadurecer o novo tipo de homem que ele representa. Se, atendendo aos defeitos da vida pĂșblica, estuda-se a estrutura psicolĂłgica deste novo tipo de homem-massa, encontra-se o seguinte: 1Âș, uma impressĂŁo nativa e radical de que a vida Ă© fĂĄcil, abastada, sem limitaçÔes trĂĄgicas; portanto, cada indivĂduo mĂ©dio encontra em si mesmo uma sensação de domĂnio e triunfo que, 2Âș, convida-o a afirmar-se a si mesmo tal qual Ă©, a considerar bom e completo o seu haver moral e intelectual. Este contentamento consigo mesmo leva-o a fechar-se em si mesmo para toda a instĂąncia exterior, a nĂŁo ouvir, a nĂŁo pĂŽr em tela de juĂzo as suas opiniĂ”es e a nĂŁo contar com os demais. A sua sensação Ăntima de domĂnio incita-o constantemente a exercer predomĂnio. ActuarĂĄ, pois, como se somente ele e os seus congĂ©neres existissem no mundo; portanto, 3Âș, intervirĂĄ em tudo impondo a sua vulgar opiniĂŁo, sem consideraçÔes, contemplaçÔes, trĂąmites nem reservas; quer dizer,