Os Convencidos da Vida
Todos os dias os encontro. Evito-os. Às vezes sou obrigado a escutá-los, a dialogar com eles. Já não me confrangem. Contam-me vitórias. Querem vencer, querem, convencidos, convencer. Vençam lá, à vontade. Sobretudo, vençam sem me chatear.
Mas tambĂ©m os aturo por escrito. No livro, no jornal. Romancistas, poetas, ensaĂstas, crĂticos (de cinema, meu Deus, de cinema!). Será que voltaram os polĂgrafos? Voltaram, pois, e em força.
Convencidos da vida há-os, afinal, por toda a parte, em todos (e por todos) os meios. Eles estão convictos da sua excelência, da excelência das suas obras e manobras (as obras justificam as manobras), de que podem ser, se ainda não são, os melhores, os mais em vista.
Praticam, uns com os outros, nada de genuinamente indecente: apenas um espelhismo lisonjeador. Além de espectadores, o convencido precisa de irmãos-em-convencimento. Isolado, através de quem poderia continuar a convencer-se, a propagar-se?
(…) No corre-que-corre, o convencido da vida nĂŁo Ă© um vaidoso Ă toa. Ele Ă© o vaidoso que quer extrair da sua vaidade, que nunca Ă© gratuita, todo o rendimento possĂvel. Nos negĂłcios, na polĂtica, no jornalismo, nas letras, nas artes. É tĂŁo capaz de aceitar uma condecoração como de rejeitá-la.
Textos sobre Vez de Alexandre O'Neill
3 resultadosIdiotia e Felicidade
Como pode ser-se idiota e, ao mesmo tempo, feliz, pergunta-me um leitor? Pois explico já. A idiotia e a felicidade sĂŁo ideias muito vagas, difĂceis de cingir em conceitos de circulação universal, digamos. Mas, pensando melhor, acho que certa idiotia Ă© susceptĂvel de conferir ao idiota seu proprietário (ou seu prisioneiro) uma espĂ©cie de segurança em si prĂłprio que o levará, em determinados momentos, julgo eu, a uma beatitude muito prĂłxima do que se pode chamar estado de felicidade.Assim sendo, nĂŁo vejo incompatibilidade entre o ser-se idiota e o ser-se feliz. Bem sei que há várias maneiras de se chegar a idiota. Uma delas foi experimentada comigo. Uma parente minha queria por força reconverter-me ao Catolicismo e, deste modo, passava a vida a dizer-me: «Alexandre, nĂŁo penses. Se começas a pensar estragas tudo. A crença em Deus, se, em vez de pensares, reaprenderes a rezar, vem por si. É uma graça, sabias? Vá, reza comigo.» E ensinava-me orações que eu, muitas vezes de mĂŁos postas, repetia aplicadamente. Acabei por nĂŁo me casar com ela.
Não quero dizer, com isto, que não acredite na chamada (creio eu) revelação. Se revelação não existisse, como poderia um poeta do tomo de Paul Claudel entrar um dia em Notre-Dame e sentir-se,
Besta Célere
Há quem lhe chame, por brincadeira, besta cĂ©lere para caracterizar a qualidade mediana (tomada por mĂ©dia) desse produto cultural (agora Ă© tudo cultural!) e, ao mesmo tempo, a rapidez com que ele se esgota em sucessivas edições. O best-seller Ă© um produto perfeita (ou eficazmente) projectado em termos de «marketing» editorial e livreiro. É para se vender – muito e depressa – que o best-seller Ă© construĂdo com os olhos postos num leitor-tipo que vai encontrar nele aquilo que exactamente esperava. Nem mais, nem menos. Os exemplos, abundantĂssimos, nem vale a pena enumerá-los. ConvĂ©m nĂŁo confundir, pelo menos em todos os casos, best-seller com «topes» de venda. Embora seja cabeça de lista, o best-seller tem, em relação aos livros «normais», uma caracterĂstica que logo o diferencia: foi feito propositadamente para ser um campeĂŁo de vendas. A sua razĂŁo de ser Ă© essa e sĂł essa. E aqui poderia dizer-se, recuperando o lugar-comum para um sentido sĂ©rio, que «o resto Ă© literatura».
Estou a pensar em bestas céleres como Love Story ou O Aeroporto. Não estou a pensar em «topes» de venda como O Nome da Rosa ou Memórias de Adriano. estes últimos são boa, excelente literatura que, por razões pontuais e,