O Indiferente
Posso amar tanto louras como morenas,
A que cede à abundância e a que trai por pobreza,
A que busca a solidĂŁo e a que se mascara e brinca,
Aquela que o campo cultivou e a da cidade,
A que acredita, e a que hesita,
A que ainda lacrimeja com olhos esponjosos,
E a rolha seca que nunca chora.
Eu posso amar essa e esta, e tu, e tu,
Posso amar qualquer uma, desde que nĂŁo seja leal.Nenhum outro vĂcio vos satisfará?
Não vos será útil fazer como as vossas mães?
Ou, gastos todos os velhos vĂcios, inventaram novos?
Ou atormenta-vos o medo de que os homens sejam fiéis?
Oh, não o somos, não o sejais vós também,
Deixai-me conhecer, eu e vĂłs, mais de vinte.
Roubem-me, mas nĂŁo me prendam, deixai-me ir.
Devo eu, que vim a estas dores através de vós
Tornar-me vosso fiel súbdito, porque sois leais?Vénus ouviu-me suspirar esta canção,
E pela maior doçura do amor, a variedade, jurou
Que a não ouvira até então, e não mais seria assim.
E foi-se,
Passagens sobre Barba
66 resultadosAtenção ao Estilo Rebuscado e Cheio de Adornos
Quando vires alguĂ©m com um estilo rebuscado e cheio de adornos podes ter a certeza de que a sua alma apenas se ocupa igualmente de bagatelas. Uma alma verdadeiramente grande Ă© mais tranquila e senhora de si a falar, e em tudo quanto diz há mais firmeza do que preocupação estilĂstica. Tu conheces bem os nossos jovens elegantes, com a barba e o cabelo todo aparado, que parecem acabadinhos de sair da fábrica! De tais criaturas nada terás a esperar de firme ou sĂłlido. O estilo Ă© o adorno da alma: se for demasiado penteado, maquilhado, artificial, em suma, sĂł provará que a alma carece de sinceridade e tem em si algo que soa a falso. NĂŁo Ă© coisa digna de homens o cuidado extremo com o vestuário! Se nos fosse dado observar “por dentro” a alma de um homem de bem — oh! que figura bela e venerável, que fulgor de magnificente tranquilidade nĂłs contemplarĂamos, que brilho nĂŁo emitiriam a justiça, a coragem, a moderação e a prudĂŞncia! E nĂŁo sĂł estas virtudes, mas ainda a frugalidade, o autodomĂnio, a paciĂŞncia, a liberalidade, a gentileza e essa virtude, incrivelmente rara no homem, que Ă© a humanidade — tambĂ©m estas fariam jorrar sobre a alma o seu sublime esplendor!
Aquele que empresta, suas barbas meça.
A Teodoro de Banville
De tal modo agarraste a Deusa pela crina,
Com ar dominador, num gesto sacudido
Que se alguém presencia o caso acontecido
Poderia julgar-te um rufiĂŁo de esquina.Com o lĂmpido olhar, — precoce e ardente vista,
Audaz, vais expandido o orgulho de arquitecto
Em nobres produções, de traço tão correcto,
Que deixam futurar um prodigioso artista.O nosso sangue, Poeta, esvai-se dia a dia!…
Acaso, do Centauro, a tĂşnica sombria,
— Que, fúnebres caudais as velas transformava —Três vezes se tingiu com as barbas subtis
D’aqueles infernais, monstruosos, rĂ©pteis,
Que Hércules, em crença, a rir, estrangulava?Tradução de Delfim Guimarães
Cantiga do Rosto Branco
Rico era o rosto branco; armas trazia,
E o licor que devora e as finas telas;
Na gentil Tibeima os olhos pousa,
E amou a flor das belas.“Quero-te!” disse à cortesã da aldeia;
“Quando, junto de ti, teus olhos miro,
A vista se me turva, as forças perco,
E quase, e quase expiro.”E responde a morena requebrando
Um olhar doce, de cobiça cheio:
“Deixa em teus lábios imprimir meu nome;
Aperta-me em teu seio!”Uma cabana levantaram ambos,
O rosto branco e a amada flor das belas…
Mas as riquezas foram-se co’o tempo,
E as ilusões com elas.Quando ele empobreceu, a amada moça
Noutros lábios pousou seus lábios frios,
E foi ouvir de coração estranho
Alheios desvarios.Desta infidelidade o rosto branco
Triste nova colheu; mas ele amava,
Inda infiéis, aqueles lábios doces,
E tudo perdoava.Perdoava-lhe tudo, e inda corria
A mendigar o grĂŁo de porta em porta,
Com que a moça nutrisse, em cujo peito
Jazia a afeição morta.E para si,
Barba, n. O cabelo que é habitualmente cortado por aqueles que abominam o absurdo costume chinês de rapar a cabeça.