Passagens de Francisco José Viegas

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Se me Comovesse o Amor

Se me comovesse o amor como me comove
a morte dos que amei, eu viveria feliz. Observo
as figueiras, a sombra dos muros, o jasmineiro
em que ficou gravada a tua mĂŁo, e deixo o dia

caminhar por entre veredas, caminhos perto do rio.
Se me comovessem os teus passos entre os outros,
os que se perdem nas ruas, os que abandonam
a casa e seguem o seu destino, eu saberia reconhecer

o sinal que ninguém encontra, o medo que ninguém
comove. Vejo-te regressar do deserto, atravessar
os templos, iluminar as varandas, chegar tarde.

Por isso nĂŁo me procures, nĂŁo me encontres,
não me deixes, não me conheças. Då-me apenas
o pĂŁo, a palavra, as coisas possĂ­veis. De longe.

As Crianças Adoecem no Inverno

As crianças adoecem no Inverno,
tossem de noite,
morres por elas nesses momentos
em que precisam de ti.

Vigias o seu sono,
entregas o teu, despertas com facilidade,
olhas uma a uma as horas que passam
como se todas as crianças nascessem no Inverno.

A Quem Darei Todos os Dias da Minha Vida?

A quem darei todos os dias da minha vida? A voz que levo
em mim impressa como o rumor dos jardins, os rebanhos
descem pelas encostas, a neve abandona as giestas,
uma banda de província comemora o entardecer. Tu e eu dançaremos
como antigamente o VerĂŁo nos chamava, pelas romarias,
e passaremos as noites em viagem. Reinventei o mundo agora,
tu o fizeste assim, uma Ășnica vez se diz o nome que nos fez
voar sobre as searas. A quem darei a minha vida?
Aquilo que deixĂĄmos um no outro marcado como um fogo,
o sobressalto, as novas palavras. O tempo demora, e volve, devagar,
sobre si mesmo, nos pĂĄtios mais antigos. Do primeiro ao Ășltimo dia,
a quem darei todos os dias da minha vida?