Peso do Mundo
A poesia nĂŁo Ă©, nunca foi
uma enumeração ou composto
de exuberância, bondade,
altitude, nem arado
ou dádiva sobre chão
prenhe de mortos.Nem o arrependimento
de Deus por ter criado o homem
com o rosto da sua memĂłria,
ao lado dos seus vermes.TĂŁo-pouco fĂ´lego dos que amam
abrindo a porta lĂmpida
do corpo e chovendo sobre a terra,
ou carregam como tartarugas
o peso do mundo.Nem reverĂŞncia por um tigre,
pela leveza maligna de todas as patas,
pela sonolĂŞncia junto Ă estirpe
aprisionada também
na dureza de ser tigre.É o milagre de uma arma
total, de uma sĂł palavra
reduzindo o átomo à completa inocência.
Poemas sobre Armas
34 resultadosRuinas
Pandeiros rôtos e côxas táças de crystal aos pés da muralha.
Heras como Romeus, Julietas as ameias. E o vento toca, em bandolins distantes, surdinas finas de princezas mortas.
Poeiras adormecidas, netas fidalgas de minuetes de mĂŁos esguias e de cabelleiras embranquecidas.
Aquellas ameias cingiram uma noite peccados sem fim; e ainda guardam os segredos dos mudos beijos de muitas noites. E a lua velhinha todas as noites rĂ©za a chorar: Era uma vez em tempo antigo um castello de nobres naquelle lugar… E a lua, a contar, pára um instante – tem mĂŞdo do frio dos subterraneos.
Ouvem-se na sala que já nem existe, compassos de danças e rizinhos de sêdas.
Aquellas ruinas sĂŁo o tumulo sagrado de um beijo adormecido – cartas lacradas com ligas azues de fechos de oiro e armas reais e lizes.
Pobres velhinhas da cĂ´r do luar, sem terço nem nada, e sempre a rezar…
Noites de insonia com as galés no mar e a alma nas galés.
Archeiros amordaçados na noite em que o cĂ´che era de volta ao palacio pela tapada d’El-rei. Grande caçada na floresta–galgos brancos e Amazonas negras.
Inter-Sonho
Numa incerta melodia
TĂ´da a minh’alma se esconde
Reminiscencias de Aonde
Perturbam-me em nostalgia…ManhĂŁ d’armas! ManhĂŁ d’armas!
Romaria! Romaria!. . . . . . . . . . . . . . .
Tacteio… dobro… resvalo…
. . . . . . . . . . . . . . .
Princesas de fantasia
Desencantam-se das flores…. . . . . . . . . . . . . . .
Que pesadĂŞlo tĂŁo bom…
. . . . . . . . . . . . . . .
Pressinto um grande intervalo,
Deliro todas as cĂ´res,
Vivo em roxo e morro em som…
Dorme Meu Filho
Dorme meu filho
dezenas de mĂŁos femininas trabalham
a atmosfera
onde os namorados pensam
cartazes simples
um por exemplo
minúsculo crustáceo denominado ciclope
por baixo da pele ou entre os mĂşsculosDorme meu filho
o amor
será
uma arma esquecida
um pano qualquer como um lenço
sobre o gelo das ruas
Letra para um hino
É possĂvel falar sem um nĂł na garganta
Ă© possĂvel amar sem que venham proibir
Ă© possĂvel correr sem que seja fugir.
Se tens vontade de cantar nĂŁo tenhas medo: canta.É possĂvel andar sem olhar para o chĂŁo
Ă© possĂvel viver sem que seja de rastos.
Os teus olhos nasceram para olhar os astros
se te apetece dizer nĂŁo grita comigo: nĂŁo.É possĂvel viver de outro modo. É
possĂvel transformares em arma a tua mĂŁo.
É possĂvel o amor. É possĂvel o pĂŁo.
É possĂvel viver de pĂ©.NĂŁo te deixes murchar. NĂŁo deixes que te domem.
É possĂvel viver sem fingir que se vive.
É possĂvel ser homem.
É possĂvel ser livre livre livre.
Pois Casei Má Hora
Pois casei má hora, e nela,
e com tal marido, prima…
Comprarei cá üa gamela,
par’ò ter debaixo dela,
e um grĂŁo penedo em cima.
Porque vai-se-me Ă s figueiras,
e come verde e maduro;
e quantas uvas penduro
jeita nas gorgomeleiras:
parece negro monturo.Vai-se-me Ă s ameixieiras,
antes que sejam maduras.
Ele quebra as cereijeiras,
ele vendima as parreiras,
e nĂŁo sei que faz das uvas.
Ele nĂŁo vai Ă lavrada,
ele todo o dia come,
ele toda a noite dorme,
ele nĂŁo faz nunca nada,
e sempre me diz que há fome!Jesu! Jesu! Posso-te dizer,
e jurar e tresjurar,
e provar e reprovar,
e andar e revolver,
que Ă© milhor pera beber,
que nĂŁo pera maridar.
O demo que o fez marido!
Que assi seco como Ă©
beberá a torre da Sé:
entĂŁo arma um arruĂdo
assi debaixo do pĂ©!…
Canção tão simples
Quem poderá domar os cavalos do vento
quem poderá domar este tropel
do pensamento
à flor da pele?Quem poderá calar a voz do sino triste
que diz por dentro do que nĂŁo se diz
a fĂşria em riste
do meu paĂs?Quem poderá proibir estas letras de chuva
que gota a gota escrevem nas vidraças
pátria viúva
a dor que passa?Quem poderá prender os dedos farpas
que dentro da canção fazem das brisas
as armas harpas
que sĂŁo precisas?
lamento para a lĂngua portuguesa
não és mais do que as outras, mas és nossa,
e crescemos em ti. nem se imagina
que alguma vez uma outra lĂngua possa
pĂ´r-te incolor, ou inodora, insossa,
ser remédio brutal, mera aspirina,
ou tirar-nos de vez de alguma fossa,
ou dar-nos vida nova e repentina.
mas Ă© o teu paĂs que te destroça,
o teu prĂłprio paĂs quer-te esquecer
e a sua condição te contamina
e no seu dia-a-dia te assassina.
mostras por ti o que lhe vais fazer:
vai-se por cá mingando e desistindo,
e desde ti nos deitas a perder
e fazes com que fuja o teu poder
enquanto o mundo vai de nĂłs fugindo:
ruiu a casa que és do nosso ser
e este anda por isso desavindo
connosco, no sentir e no entender,
mas sem que a desavença nos importe
nós já falamos nem sequer fingindo
que sĂł ruĂnas vamos repetindo.
talvez seja o processo ou o desnorte
que mostra como Ă© realidade
a relação da lĂngua com a morte,
o nĂł que faz com ela e que entrecorte
a corrente da vida na cidade.
De Amor os Raios Cobrindo
Se por dar lustre aos pesares
Vossas lágrimas teimosas
Correm por margens de rosas,
Porque nĂŁo cabem nos mares,
A submergir esses ares
Subiam rios crescendo,
E certo o naufrágio sendo,
A fineza deslustrais,
Porque podendo amar mais,
Deixareis de amar morrendo.Deixai que o mar se dilate,
Que o rio se precipite,
Que o vento se fortifique,
Que em água a nuvem desate,
Sem que vĂłs neste combate
Balas de neve esgrimindo,
Que as estrelas vĂŁo ferindo,
De neve e fogo tomeis
As armas com que ofendeis,
De amor os raios cobrindo.
Cigarra
Esta nĂŁo Ă© filha do sol
com pernas e pés de marinheiros
subindo às árvores das herdades.
Esta Ă© preciso ouvi-la dias inteiros
aquém das grades.Esta
nĂŁo chama para os campos doirados
onde o canto Ă© livre e aquece, morno.
Mas para silĂŞncios hirtos e cerrados
com fardas e armas em torno.Desde o sinal das auroras
até à noite que plange
amortalhando as horas,
seu canto nĂŁo canta, range…Ă“ cigarra das torvas claridades!
Seus cantos só pode cantá-los
a boca de pedra e dentes ralos
do ferro nas grades.
Cantiga do Rosto Branco
Rico era o rosto branco; armas trazia,
E o licor que devora e as finas telas;
Na gentil Tibeima os olhos pousa,
E amou a flor das belas.“Quero-te!” disse à cortesã da aldeia;
“Quando, junto de ti, teus olhos miro,
A vista se me turva, as forças perco,
E quase, e quase expiro.”E responde a morena requebrando
Um olhar doce, de cobiça cheio:
“Deixa em teus lábios imprimir meu nome;
Aperta-me em teu seio!”Uma cabana levantaram ambos,
O rosto branco e a amada flor das belas…
Mas as riquezas foram-se co’o tempo,
E as ilusões com elas.Quando ele empobreceu, a amada moça
Noutros lábios pousou seus lábios frios,
E foi ouvir de coração estranho
Alheios desvarios.Desta infidelidade o rosto branco
Triste nova colheu; mas ele amava,
Inda infiéis, aqueles lábios doces,
E tudo perdoava.Perdoava-lhe tudo, e inda corria
A mendigar o grĂŁo de porta em porta,
Com que a moça nutrisse, em cujo peito
Jazia a afeição morta.E para si,
Quando Toda és Terra a Terra
Marga, teu busto tufa,
Dois gomos e véus de ilhal
Palpitam palmo de gente
Nesse tefe-tefe igual
E há qualquer coisa de ardente
Que se endireita e que rufa
Nem tambor a general.Marga, teu peitinho estringes,
Toca a quebrados na praça
De armas que empunham rapazes
De guarda a uma egĂpcia esfinge,
E um vento de guerra passa
E o pau da bandeira ringe
Antes de fazer as pazes.Marga, que deusa de guerra,
A MiosĂłtis se interpĂ´s
Quando toda és terra a terra
Cálice de rododendro
Zango nunca em ti se pĂ´s
Em estames senĂŁo tremendo…
Os Olhos Meus dali Dependurados
Os olhos meus dali dependurados,
Pergunto ao mar, Ă s ondas, aos penedos
Como, quando, por quem foram criados?Respondem-me em segredo, mil segredos,
Cujas letras primeiras vou cortando
Nos pés de outros mais verdes arvoredos.Assi com cousas mudas conversando,
Com mais quietação delas aprendo,
Que de outras, que ensinar querem falando.Se pelejo, se grito, se contendo
Com armas, com razões com argumentos,
Elas sĂł com calar ficam vencendo.Ferido de tamanhos sentimentos
Fico fora de mim, fico corrido
De ver sobre que fiz meus fundamentos.
Louvor do Aprender
Aprende o mais simples! Pra aqueles
Cujo tempo chegou
Nunca Ă© tarde de mais!
Aprende o abc, nĂŁo chega, mas
Aprende-o!   E não te enfades!
Começa! Tens de saber tudo!
Tens de tomar a chefia!Aprende, homem do asilo!
Aprende, homem na prisĂŁo!
Aprende, mulher na cozinha!
Aprende, sexagenária!
Tens de tomar a chefia!Frequenta a escola, homem sem casa!
Arranja saber, homem com frio!
Faminto, pega no livro: Ă© uma arma.
Tens de tomar a chefia.NĂŁo te acanhes de perguntar, companheiro!
Não deixes que te metam patranhas na cabeça:
VĂŞ c’os teus prĂłprios olhos!
O que tu mesmo nĂŁo sabes
NĂŁo o sabes.
Verifica a conta:
És tu que a pagas.
Põe o dedo em cada parcela,
Pergunta: Como aparece isto aqui?
Tens de tomar a chefia.Tradução de Paulo Quintela