Ode aos Natais Esquecidos

Eu vinha, pé ante pé, em busca da pequena porta
que dava acesso aos mistérios da noite,
daquela noite em particular, por ser a mais terna
de todas as noites que a minha memĂłria
era capaz de guardar, com letras e sons,
no seu bojo de coisas imateriais e imperecĂ­veis.
Tinha comigo os cĂŁes e os retratos dos mortos,
a lembrança de outras noites e de outros dias,
os brinquedos cansados da solidĂŁo dos quartos,
os cadernos invadidos pĂȘlos saberes inĂșteis.
E todos me diziam que era ainda muito cedo,
porque a meia-noite morava jĂĄ dentro do sono,
no territĂłrio dos anjos e dos outros seres alados,
hora inatingĂ­vel a clamar pela nossa paciĂȘncia,
meninos hirtos de olhos fixos na claridade
enganadora de uma ĂĄrvore sem nome.

Depois, o meu pai morreu e as minhas ilusÔes também.
Tudo se tornou gélido, esquivo e distante
como a tristeza de um fantasma confrontado
com a beleza da vida para sempre perdida.
Deixaram de me dar presentes e de dizer
que era o Menino Jesus que os trazia
para premiar a minha grandeza de alma,

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