Poemas Interrogativos

774 resultados
Poemas interrogativos sobre diversos assuntos para ler e compartilhar. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Leram-me Hoje S. Francisco de Assis

Leram-me hoje S. Francisco de Assis.
Leram-me e pasmei.
Como é que um homem que gostava tanto das coisas,
Nunca olhava para elas, não sabia o que elas eram?

Para que havia de chamar minha irmã à água, se ela não é minha irmã?
Para a sentir melhor?
Sinto-a melhor bebendo-a do que chamando-lhe qualquer coisa.
Irmã, ou mãe, ou filha.
A água é a água e é bela por isso.
Se eu lhe chamar minha irmã,
Ao chamar-lhe minha irmã, vejo que o não é
E que se ela é a água o melhor é chamar-lhe água;
Ou, melhor ainda, não lhe chamar coisa nenhuma,
Mas bebê-la, senti-la nos pulsos, olhar para ela
E isto sem nome nenhum.

Consolação para os Principiantes

Vede a criança, rodeada de porcos a grunhir,
Desarmada, encolhendo os dedos dos pés.
Chora, não sabe fazer mais nada senão chorar.
Será alguma vez capaz de ficar de pé e de caminhar?
Coragem! E depressa, penso eu,
Podereis ver a criança dançar;
Logo que conseguir manter-se de pé,
Haveis de a ver caminhar de cabeça para baixo.

Os Amantes

Amor, é falso o que dizes;
Teu bom rosto é contrafeito;
Busca novos infelizes
Que eu inda trago no peito
Mui frescas as cicatrizes;

O teu meu é mel azedo,
Não creio em teu gasalhado,
Mostras-me em vão rosto ledo;
Já estou muito escaldado,
Já d’águas frias hei medo.

Teus prémios são pranto e dor;
Choro os mal gastados anos
Em que servi tal senhor,
Mas tirei dos teus enganos
O sair bom pregador.

Fartei-te assaz a vontade;
Em vãos suspiros e queixas
Me levaste a mocidade,
E nem ao menos me deixas
Os restos da curta idade?

És como os cães esfaimados
Que, comendo os troncos quentes
Por destro negro esfolados,
Levam nos ávidos dentes
Os ossos ensanguentados.

Bem vejo a aljava dourada
Os ombros nus adornar-te;
Amigo, muda de estrada,
Põe a mira em outra parte
Que daqui não tiras nada.

Busca algum fofo morgado
Que, solto já dos tutores,
Ao domingo penteado,
Vá dizendo à toa amores
Pelas pias encostado;

Continue lendo…

Não Sei se é Amor que Tens, ou Amor que Finges

Não sei se é amor que tens, ou amor que finges,
O que me dás. Dás-mo. Tanto me basta.
Já que o não sou por tempo,
Seja eu jovem por erro.
Pouco os deuses nos dão, e o pouco é falso.
Porém, se o dão, falso que seja, a dádiva
É verdadeira. Aceito,
Cerro olhos: é bastante.
Que mais quero?

Morrer de Amor é Assim

Quem morre de tempo certo
ao cabo de um certo tempo
é a rosa do deserto
que tem raízes no vento.

Qual a medida de um verso
que fale do meu amor?
Não me chega o universo
porque o meu verso é maior.

Morrer de amor é assim
como uma causa perdida.
Eu sei, e falo por mim,
vou morrer cheio de vida.

Digo-te adeus, vou-me embora,
que os versos que eu te escrever
nunca os lerás, sei agora
que nunca aprendeste a ler.

Neste dia que se enquadra
no tempo que vai passar,
termino mais esta quadra
feita ao gosto popular.

Saudade

Tu és o cálix;
Eu, o orvalho!
Se me não vales,
Eu o que valho?

Eu se em ti caio
E me acolheste
Torno-me um raio
De luz celeste!

Tu és o collo
Onde me embalo,
E acho consolo,
Mimo e regalo:

A folha curva
Que se aljofara,
Não d’agoa turva,
Mas d’agoa clara!

Quando me passa
Essa existencia,
Que é toda graça,
Toda innocencia,

Além da raia
D’este horizonte—
Sem uma faia,
Sem uma fonte;

O passarinho
Não se consome
Mais no seu ninho
De frio e fome,

Se ella se ausenta,
A boa amiga,
Ah! que o sustenta
E que o abriga!

Sinto umas magoas
Que se confundem
Com as que as agoas
Do mar infundem!

E quem um dia
Passou os mares
É que avalia
Esses pezares!

Só quem lá anda
Sem achar onde
Sequer expanda
A dôr que esconde;

Longe do berço,

Continue lendo…

Fantasia

Há uma mulher em toda a minha vida,
Que não se chega bem a precisar.
Uma mulher que eu trago em mim perdida,
Sem a poder beijar.

Há uma mulher na minha vida inquieta.
Uma mulher? Há duas, muitas mais,
Que não são vagos sonhos de poeta,
Nem formas irreais.

Mulheres que existem, corpos, realidade,
Têm passado por mim, humanamente,
Deixando, quando partem, a saudade
Que deixa toda a gente.

Mas coisa singular, essa que eu não beijei,
É quem me ilude, é quem me prende e quer.
Com ela sonho e sofro… Só não sei
Quem é essa mulher.

O Ter Deveres

O ter deveres, que prolixa coisa!
Agora tenho eu que estar à uma menos cinco
Na Estação do Rossio, tabuleiro superior — despedida
Do amigo que vai no “Sud Express” de toda a gente
Para onde toda a gente vai, o Paris …

Tenho que lá estar
E acreditem, o cansaço antecipado é tão grande
Que, se o “Sud Express” soubesse, descarrilava…

Brincadeira de crianças?
Não, descarrilava a valer…
Que leve a minha vida dentro, arre, quando descarrile!…

Tenho desejo forte,
E o meu desejo, porque é forte, entra na substância do mundo.

Divórcio

Cidade muda, rente a meu lado,
Como um fantasma sob a neblina…
Há cem mil rostos. Tanto soldado
E tanto abraço desesperado
Nesta cidade tão masculina!

Cidade muda como um soldado.

Cidade cega. Todos os dias,
A nossa vida fica mais breve,
As nossas mãos ficam mais frias…
Todos os dias, todos os dias,
A morte paga, paga a quem deve.

Cidade cega todos os dias.

Cidade oblíqua. Sexo pesado.
Rio de cinza, lúgubre e lento…
Bandeira negra, barco parado,
Nunca o teu nome foi baptizado
Nem o teu beijo foi casamento!

Cidade minha, do meu pecado…

Cidade estranha, sabes que existo?
Os homens passam… Para onde vão?
Só tem amores quem não for visto.
Por isso canto, só porque insisto
Em dar combates à tentação.

Oh! a volúpia de não ser visto!

Em Plena Vida e Violência

Em plena vida e violência
De desejo e ambição,
De repente uma sonolência
Cai sobre a minha ausência.
Desce ao meu próprio coração.

Será que a mente, já desperta
Da noção falsa de viver,
Vê que, pela janela aberta,
Há uma paisagem toda incerta
E um sonho todo a apetecer ?

Chove ? Nenhuma Chuva Cai…

Chove? Nenhuma chuva cai…
Então onde é que eu sinto um dia
Em que ruído da chuva atrai
A minha inútil agonia ?

Onde é que chove, que eu o ouço?
Onde é que é triste, ó claro céu?
Eu quero sorrir-te, e não posso,
Ó céu azul, chamar-te meu…

E o escuro ruído da chuva
É constante em meu pensamento.
Meu ser é a invisível curva
Traçada pelo som do vento…

E eis que ante o sol e o azul do dia,
Como se a hora me estorvasse,
Eu sofro… E a luz e a sua alegria
Cai aos meus pés como um disfarce.

Ah, na minha alma sempre chove.
Há sempre escuro dentro de mim.
Se escuro, alguém dentro de mim ouve
A chuva, como a voz de um fim…

Os céus da tua face, e os derradeiros
Tons do poente segredam nas arcadas…

No claustro sequestrando a lucidez
Um espasmo apagado em ódio à ânsia
Põe dias de ilhas vistas do convés

No meu cansaço perdido entre os gelos,

Continue lendo…

A Plácida Face Anónima de um Morto

A plácida face anónima de um morto.

Assim os antigos marinheiros portugueses,
Que temeram, seguindo contudo, o mar grande do Fim,
Viram, afinal, não monstros nem grandes abismos,
Mas praias maravilhosas e estrelas por ver ainda.

O que é que os taipais do mundo escondem nas montras de Deus?

Passamos e Agitamo-nos Debalde

Antes de nós nos mesmos arvoredos
Passou o vento, quando havia vento,
E as folhas não falavam
De outro modo do que hoje.

Passamos e agitamo-nos debalde.
Não fazemos mais ruído no que existe
Do que as folhas das árvores
Ou os passos do vento.

Tentemos pois com abandono assíduo
Entregar nosso esforço à Natureza
E não querer mais vida
Que a das árvores verdes.

Inutilmente parecemos grandes.
Salvo nós nada pelo mundo fora
Nos saúda a grandeza
Nem sem querer nos serve.

Se aqui, à beira-mar, o meu indício
Na areia o mar com ondas três o apaga,
Que fará na alta praia
Em que o mar é o Tempo?

Purinha

O Espirito, a Nuvem, a Sombra, a Chymera,
Que (aonde ainda não sei) neste mundo me espera
Aquella que, um dia, mais leve que a bruma,
Toda cheia de véus, como uma Espuma,
O Sr. Padre me dará p’ra mim
E a seus pés me dirá, toda corada: Sim!
Ha-de ser alta como a Torre de David,
Magrinha como um choupo onde se enlaça a vide
E seu cabello em cachos, cachos d’uvas,
E negro como a capa das viuvas…
(Á maneira o trará das virgens de Belem
Que a Nossa Senhora ficava tão bem!)
E será uma espada a sua mão,
E branca como a neve do Marão,
E seus dedos serão como punhaes,
Fuzos de prata onde fiarei meus ais!
E os seus seios serão como dois ninhos,
E seus sonhos serão os passarinhos,
E será sua bocca uma romã,
Seus olhos duas Estrellinhas da Manhã!
Seu corpo ligeiro, tão leve, tão leve,
Como um sonho, como a neve,
Que hei-de suppor estar a ver, ao vel-a,
Cabrinhas montezas da Serra da Estrella…
E ha-de ser natural como as hervas dos montes
E as rolas das serras e as agoas das fontes…

Continue lendo…

Ex-Voto

Anda a tua saudade ao pé de mim,
E porque a tenho já por companheira,
Eu começo a pensar, e penso, enfim,
Que te hei-de ver um dia à minha beira.

Posso lá acreditar que toda a tua esperança,
O teu grande desejo de viver,
Hão-de caber num berço de criança!
Eu posso lá pensar em nunca mais te ver!

Posso lá acreditar que no ingrato caminho
Da minha vida que esta dor consome,
Nunca mais te hei-de ouvir, mesmo baixinho,
Pronunciar o meu nome!

Posso lá acreditar que a infinita poesia,
Que descia, ao falares, da tua voz,
Não seja agora mais do que uma sinfonia,
A pairar, a vibrar, longe de nós!

Posso lá acreditar! Então a vida,
O que era para mim, assim, o que era?
Ah! Não valia a pena ser vivida,
E não chegava mesmo a ser uma quimera!

O Indiferente

Posso amar tanto louras como morenas,
A que cede à abundância e a que trai por pobreza,
A que busca a solidão e a que se mascara e brinca,
Aquela que o campo cultivou e a da cidade,
A que acredita, e a que hesita,
A que ainda lacrimeja com olhos esponjosos,
E a rolha seca que nunca chora.
Eu posso amar essa e esta, e tu, e tu,
Posso amar qualquer uma, desde que não seja leal.

Nenhum outro vício vos satisfará?
Não vos será útil fazer como as vossas mães?
Ou, gastos todos os velhos vícios, inventaram novos?
Ou atormenta-vos o medo de que os homens sejam fiéis?
Oh, não o somos, não o sejais vós também,
Deixai-me conhecer, eu e vós, mais de vinte.
Roubem-me, mas não me prendam, deixai-me ir.
Devo eu, que vim a estas dores através de vós
Tornar-me vosso fiel súbdito, porque sois leais?

Vénus ouviu-me suspirar esta canção,
E pela maior doçura do amor, a variedade, jurou
Que a não ouvira até então, e não mais seria assim.
E foi-se,

Continue lendo…

Terra – 24

António, é preciso partir!
o moleiro não fia,
a terra é estéril,
a arca vazia,
o gado minga e se fina!
António, é preciso partir!
A enxada sem uso,
o arado enferruja,
o menino quere o pão; a tua casa é fria!
É preciso emigrar!
O vento anda como doido – levará o azeite;
a chuva desaba noite e dia – inundará tudo;
e o lar vazio,
o gado definhando sem pasto,
a morte e o frio por todo o lado,
só a morte, a fome e o frio por todo o lado, António!
É preciso embarcar!
Badalão! Badalão! – o sino
já entoa a despedida.
Os juros crescem;
o dinheiro e o rico não têm coração.
E as décimas, António?
Ninguém perdoa – que mais para vender?
Foi-se o cordão,
foram-se os brincos,
foi-se tudo!
A fome espia o teu lar.
Para quê lutar com a secura da terra,
com a indiferença do céu,
com tudo, com a morte, com a fome, coma a terra,
com tudo!
Árida,

Continue lendo…

Pergunta

Quem vem de longe e sabe o nome do meu lugar
e levou o caminho das conchas em mar
e dos olhos em rio
— quem vem de longe chorar por mim?

Quem sabe que eu findo de dureza
e condensa ternura em suas mãos
para a derramar em afagos
por mim?

Quem ouviu a angústia do meu brado,
sirene de um navio a vadiar no largo,
e me traz seus beijos e sua cor,
perdendo-se na bruma das madrugadas
por mim?

Quem soube das asperezas da viagem
e pediu o pão negado
e o suor ao corpo torturado,
por mim? por mim?

Quem gerou o mundo e lhe deu seu nome
e seu tamanho — imenso, imenso,
e em mim cabe?

Os Sinos

1

Os sinos tocam a noivado,
No Ar lavado!
Os sinos tocam, no Ar lavado,
A noivado!

Que linda criança que assoma na rua!
Que linda, a andar!
Em extasi, o povo commenta que é a Lua,
Que vem a andar…

Tambem, algum dia, o povo na rua,
Quando eu cazar,
Ao ver minha noiva, dirá que é a Lua
Que vae cazar…

2

E o sino toca a baptizado
Que lindo fado?
E o sino toca um lindo fado,
A baptizado!

E banham o anjinho na agoa de neve,
Para o lavar,
E banham o anjinho na agoa de neve,
Para o sujar.

Ó boa madrinha, que o enxugas de leve,
Tem dó d’esses gritos! Comprehende esses ais:
Antes o enxugue a Velha! antes Deus t’o leve!
Não soffre mais…

3

Os sinos dobram por anjinho,
Coitadinho!
Os sinos dobram, coitadinho…
Pelo anjinho!

Que aceiada que vae p’ra cova!
Olhae! olhae!
Sapatinhos de sola nova,
Olhae!

Continue lendo…

Anda, Vem

Anda, vem… por que te négas,
Carne morêna, toda perfume?
Por que te cálas,
Por que esmoreces
Boca vermêlha, – rosa de lume!

Se a luz do dia
Te cóbre de pêjo,
Esperemos a noite presos n’um beijo.

Dá-me o infinito goso
De contigo adormecer,
Devagarinho, sentindo
O arôma e o calôr
Da tua carne, – meu amôr!

E ouve, mancebo aládo,
Não entristeças, não penses,
– Sê contente,
Porque nem todo o prazer
Tem peccado…

Anda, vem… dá-me o teu corpo
Em troca dos meus desejos;

Tenho Saudades da vida!

Tenho sêde dos teus beijos!