Poemas sobre Lugares de Fernando Pessoa

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Poemas de lugares de Fernando Pessoa. Leia este e outros poemas de Fernando Pessoa em Poetris.

O Maestro Sacode a Batuta

O maestro sacode a batuta,
A lânguida e triste a mĂşsica rompe …

Lembra-me a minha infância, aquele dia
Em que eu brincava ao pé dum muro de quintal
Atirando-lhe com, uma bola que tinha dum lado
O deslizar dum cĂŁo verde, e do outro lado
Um cavalo azul a correr com um jockey amarelo …

Prossegue a música, e eis na minha infância
De repente entre mim e o maestro, muro branco,
Vai e vem a bola, ora um cĂŁo verde,
Ora um cavalo azul com um jockey amarelo…

Todo o teatro é o meu quintal, a minha infância
Está em todos os lugares e a bola vem a tocar música,
Uma mĂşsica triste e vaga que passeia no meu quintal
Vestida de cĂŁo verde tornando-se jockey amarelo…
(TĂŁo rápida gira a bola entre mim e os mĂşsicos…)

Atiro-a de encontra à minha infância e ela
Atravessa o teatro todo que está aos meus pés
A brincar com um jockey amarelo e um cĂŁo verde
E um cavalo azul que aparece por cima do muro
Do meu quintal…

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Entre o Luar e a Folhagem

Entre o luar e a folhagem,
Entre o sossego e o arvoredo,
Entre o ser noite e haver aragem
Passa um segredo.
Segue-o minha alma na passagem.

Tênue lembrança ou saudade,
PrincĂ­pio ou fim do que nĂŁo foi,
NĂŁo tem lugar, nĂŁo tem verdade.
Atrai e dĂłi.

Segue-o meu ser em liberdade.

Vazio encanto Ă©brio de si,
Tristeza ou alegria o traz?
O que sou dele a quem sorri?
Nada Ă© nem faz.
SĂł de segui-lo me perdi.

Abismo

Olho o Tejo, e de tal arte
Que me esquece olhar olhando,
E sĂşbito isto me bate
De encontro ao devaneando —
O que é sério, e correr?
O que é está-lo eu a ver?

Sinto de repente pouco,
Vácuo, o momento, o lugar.
Tudo de repente é oco —
Mesmo o meu estar a pensar.
Tudo — eu e o mundo em redor —
Fica mais que exterior.

Perde tudo o ser, ficar,
E do pensar se me some.
Fico sem poder ligar
Ser, idéia, alma de nome
A mim, Ă  terra e aos cĂ©us…

E sĂşbito encontro Deus.

Tudo o que sou nĂŁo Ă© mais do que abismo

Tudo o que sou nĂŁo Ă© mais do que abismo
Em que uma vaga luz
Com que sei que sou eu, e nisto cismo,
Obscura me conduz.

Um intervalo entre nĂŁo-ser e ser
Feito de eu ter lugar
Como o pĂł, que se vĂŞ o vento erguer,
Vive de ele o mostrar.

Dorme, que a Vida Ă© Nada!

Dorme, que a vida Ă© nada!
Dorme, que tudo Ă© vĂŁo!
Se alguém achou a estrada,
Achou-a em confusĂŁo,
Com a alma enganada.

Não há lugar nem dia
Para quem quer achar,
Nem paz nem alegria
Para quem, por amar,
Em quem ama confia.

Melhor entre onde os ramos
Tecem docéis sem ser
Ficar como ficamos,
Sem pensar nem querer,
Dando o que nunca damos.