Poemas sobre Mudos

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Poemas de mudos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Confusão

Meu coração
é teu coração?
Quem me reflexa pensamentos?
Quem me presta
esta paixão
sem raízes?
Por que muda meu traje
de cores?
Tudo é encruzilhada!
Por que vês no céu
tanta estrela?
Irmão, és tu
ou sou eu?
E estas mãos tão frias
são daquele?
Vejo-me pelos ocasos,
e um formigueiro de gente
anda por meu coração.

Tradução de Oscar Mendes

Os Amantes

Amor, é falso o que dizes;
Teu bom rosto é contrafeito;
Busca novos infelizes
Que eu inda trago no peito
Mui frescas as cicatrizes;

O teu meu é mel azedo,
Não creio em teu gasalhado,
Mostras-me em vão rosto ledo;
Já estou muito escaldado,
Já d’águas frias hei medo.

Teus prémios são pranto e dor;
Choro os mal gastados anos
Em que servi tal senhor,
Mas tirei dos teus enganos
O sair bom pregador.

Fartei-te assaz a vontade;
Em vãos suspiros e queixas
Me levaste a mocidade,
E nem ao menos me deixas
Os restos da curta idade?

És como os cães esfaimados
Que, comendo os troncos quentes
Por destro negro esfolados,
Levam nos ávidos dentes
Os ossos ensanguentados.

Bem vejo a aljava dourada
Os ombros nus adornar-te;
Amigo, muda de estrada,
Põe a mira em outra parte
Que daqui não tiras nada.

Busca algum fofo morgado
Que, solto já dos tutores,
Ao domingo penteado,
Vá dizendo à toa amores
Pelas pias encostado;

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Contra as Leis

A partir de hoje penduro ao pescoço
Com uma corda de crina o relógio que marca as horas;
A partir de hoje cessam o curso das estrelas
E do sol, e o canto do galo e a sombra;
E tudo aquilo que a hora nunca anunciou
Está agora mudo, surdo e cego:
Toda a natureza se cala para mim
Diante do tiquetaque da lei e da hora.

Divórcio

Cidade muda, rente a meu lado,
Como um fantasma sob a neblina…
Há cem mil rostos. Tanto soldado
E tanto abraço desesperado
Nesta cidade tão masculina!

Cidade muda como um soldado.

Cidade cega. Todos os dias,
A nossa vida fica mais breve,
As nossas mãos ficam mais frias…
Todos os dias, todos os dias,
A morte paga, paga a quem deve.

Cidade cega todos os dias.

Cidade oblíqua. Sexo pesado.
Rio de cinza, lúgubre e lento…
Bandeira negra, barco parado,
Nunca o teu nome foi baptizado
Nem o teu beijo foi casamento!

Cidade minha, do meu pecado…

Cidade estranha, sabes que existo?
Os homens passam… Para onde vão?
Só tem amores quem não for visto.
Por isso canto, só porque insisto
Em dar combates à tentação.

Oh! a volúpia de não ser visto!

Identidade

A identidade, como a pele,
renova-se, perde-se de sete
em sete anos, muda no mesmo
corpo, torna diferente
a permanência humana.
A identidade é a soma
das intenções, uma foto
instantânea para um propósito
imediato que não dura.
A identidade é um equívoco
para camuflar o coração.

À Toa

O Primeiro Homem

Que lindo mundo! E eu só! Que tortura tamanha!
Ninguem! Meu pae é o céu. Minha mãe é a montanha.

A Montanha

Os meus cabellos são os pinheiraes sombrios
E veias do meu corpo os azulados rios.

Os Rios

Nós somos o suor que o Estio asperge e sua,
Nós somos, em Janeiro, a agoa-benta da Lua!

A Lua

Eu sou a bala, no Ar detida, d’essa guerra
Que teve contra Deus, em seu principio, a Terra…

A Terra

E eu uma das maçãs, entre outras a primeira,
Que certo Virgem viu cair d’uma macieira!

A Macieira

Tantas ainda por cair! Vinde colhel-as!
Abanae a macieira e cairão estrellas!

A Estrellas

No mar, á noite, reflectimo-nos, a olhar,
E formamos, assim, as Estrellas-do-mar…

O Mar

Sou padre. São d’agoa meus Santos-Evangelhos:
Accendei meu altar, relampagos vermelhos!

Os Relampagos

Nós somos (o contrario, embora, seja escripto)
Os fogos-tátuos d’esta cova do Infinito…

O Infinito

Sou o mar sem borrasca,

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Inglória é a Vida, e Inglório o Conhecê-la

Inglória é a vida, e inglório o conhecê-la.
Quantos, se pensam, não se reconhecem
Os que se conheceram!
A cada hora se muda não só a hora
Mas o que se crê nela, e a vida passa
Entre viver e ser.

Não Sei o que Ha de Vago

Não sei o que ha de vago,
Incoercivel, puro,
No vôo em que divago
Á tua busca, amor!
No vôo em que procuro
O balsamo, o aroma,
Que, se uma fórma toma,
É de impalpavel flôr!

Oh como te eu aspiro
Na ventania agreste!
Oh como te eu admiro
Nas solidões do mar!
Quando o azul celeste
Descança n’essas agoas
Bem como n’estas magoas
Descança o teu olhar!

Que placida harmonia
Então a pouco e pouco
Me eleva a fantasia
A novas regiões!
Dando-me ao uivo rouco
Do mar, n’essas cavernas,
O timbre das mais ternas
E pias orações!

Parece todo o mundo
Só um immenso templo!
O mar já não tem fundo
E não tem fundo o céo!
E, em tudo, o que contemplo,
O que diviso em tudo,
És tu!… esse olhar mudo!…
O mundo… és tu… e eu!…

Todas as Horas

Todas as horas, todos os minutos,
São para mim a véspera da partida.

Preparo-me para a morte, como quem
Se prepara para a vida.

Em qualquer parte eu disse que a Beleza
Não nasce só mas sim acompanhada.

Não são palavras minhas as que eu digo.
À minha boca pertence aos que me amam.

Mudos e sós.
À nossa volta todos os amantes
Sentir-se-ão tranquilos.
Um coração puro
É como o Sol:
Brilha todos os dias.

Tristissima

N’um paiz longe, secreto,
Lendaria ilha affastada,
Jaz todo o dia sentada
N’um throno de marmor preto.

No seu palacio esculpido
Não entram constellações;
Os tectos dos seus sallões
São todos d’ouro polido!

Nas largas escadarias
Sobem vassallos ao cento,
De noute suluça o vento
N’aquellas tapeçarias.

E pelas largas janellas
Fechadas, sempre corridas,
Ha flores desconhecidas
Que não olham as estrellas.

Na dextra segura um calix,
– Calix da Dôr e da Magoa!
Onde está contida a agoa
E o sangue dos nossos males!

Pelas florestas sosinhas
Escuras, sem rouxinoes,
Erram chorando os Heroes,
E as desgraçadas Rainhas.

Seguida, á noute, de servas,
Caminha, em cortejo mudo,
Rojando o negro velludo
De seu cabello nas hervas.

Sómente ao vel-a passar
Ficam as almas surprezas;
– Ha todo um mar de tristezas
No abismo do seu olhar!

Onde o Mar Falta

Entreabertas as pernas, e pousada
de leve, sobre os ombros, a cabeça,
parecias às vezes, derramada
no fundo, mais espessa.

E eras líquida: vias, através
de tua própria sombra transparente
a luminosidade dos teus pés,
alados. Porque ausente.

Jamais dizias nada. Sempre tinhas
entre os lábios, a voz silenciosa
dos que voltam. Onda após onda, vinhas
(e vens) misteriosa.

Desde a profundidade, do mar. Brusco
nas suas reacções, onde o mar falta
sob as ondas, aí, aí te busco —
e és, como as ondas, alta.

Quando olho o horizonte: quando tudo
se dissolve em si mesmo e, onda após
onda, me calo. Vejo, e estou mudo.
O mar na tua voz.

Porque vias o mar (tinhas o mar
no olhar) fechando os olhos. E defronte
o víamos surgir. Bastava olhar,
que tudo era horizonte.

Dorme Sobre o Meu Seio

Dorme sobre o meu seio,
Sonhando de sonhar…
No teu olhar eu leio
Um lúbrico vagar.
Dorme no sonho de existir
E na ilusão de amar.

Tudo é nada, e tudo
Um sonho finge ser.
O ‘spaço negro é mudo.
Dorme, e, ao adormecer,
Saibas do coração sorrir
Sorrisos de esquecer.

Dorme sobre o meu seio,
Sem mágoa nem amor…

No teu olhar eu leio
O íntimo torpor
De quem conhece o nada-ser
De vida e gozo e dor.

Os Olhos Meus dali Dependurados

Os olhos meus dali dependurados,
Pergunto ao mar, às ondas, aos penedos
Como, quando, por quem foram criados?

Respondem-me em segredo, mil segredos,
Cujas letras primeiras vou cortando
Nos pés de outros mais verdes arvoredos.

Assi com cousas mudas conversando,
Com mais quietação delas aprendo,
Que de outras, que ensinar querem falando.

Se pelejo, se grito, se contendo
Com armas, com razões com argumentos,
Elas só com calar ficam vencendo.

Ferido de tamanhos sentimentos
Fico fora de mim, fico corrido
De ver sobre que fiz meus fundamentos.

Spleen

Quando o cinzento céu, como pesada tampa,
Carrega sobre nós, e nossa alma atormenta,
E a sua fria cor sobre a terra se estampa,
O dia transformado em noite pardacenta;

Quando se muda a terra em húmida enxovia
D’onde a Esperança, qual morcego espavorido,
Foge, roçando ao muro a sua asa sombria,
Com a cabeça a dar no tecto apodrecido;

Quando a chuva, caindo a cântaros, parece
D’uma prisão enorme os sinistros varões,
E em nossa mente em frebre a aranha fia e tece,
Com paciente labor, fantásticas visões,

– Ouve-se o bimbalhar dos sinos retumbantes,
Lançando para os céus um brado furibundo,
Como os doridos ais de espíritos errantes
Que a chorrar e a carpir se arrastam pelo mundo;

Soturnos funerais deslizam tristemente
Em minh’alma sombria. A sucumbida Esp’rança,
Lamenta-se, chorando; e a Angústia, cruelmente,
Seu negro pavilhão sobre os meus ombros lança!

Tradução de Delfim Guimarães

A Sésta

Pierrot escondido por entre o amarello dos gyrassois espreita em cautela o somno d’ella dormindo na sombra da tangerineira. E ella não dorme, espreita tambem de olhos descidos, mentindo o sôno, as vestes brancas do Pierrot gatinhando silencios por entre o amarelo dos gyrassois. E porque Elle se vem chegando perto, Ella mente ainda mais o sôno a mal-resonar.

Junto d’Ella, não teve mão em si e foi descer-lhe um beijo mudo na negra meia aberta arejando o pé pequenino. Depois os joelhos redondos e lizos, e já se debruçava por sobre os joelhos, a beijar-lhe o ventre descomposto, quando Ella acordou cançada de tanto sôno fingir.

E Elle ameaça fugida, e Ella furta-lhe a fuga nos braços nús estendidos.

E Ella, magoada dos remorsos de Pierrot, acaricia-lhe a fronte num grande perdão. E, feitas as pazes, ficou combinado que Ella dormisse outra vez.

Frígida

I
Balzac é meu rival, minha senhora inglesa!
Eu quero-a porque odeio as carnações redondas!
Mas ele eternizou-lhe a singular beleza
E eu turbo-me ao deter seus olhos cor das ondas.

II
Admiro-a. A sua longa e plácida estatura
Expõe a majestade austera dos invernos.
Não cora no seu todo a tímida candura;
Dançam a paz dos céus e o assombro dos infernos.

III
Eu vejo-a caminhar, fleumática, irritante,
Numa das mãos franzindo um lençol de cambraia!…
Ninguém me prende assim, fúnebre, extravagante,
Quando arregaça e ondula a preguiçosa saia!

IV
Ouso esperar, talvez, que o seu amor me acoite,
Mas nunca a fitarei duma maneira franca;
Traz o esplendor do Dia e a palidez da Noite,
É, como o Sol, dourada, e, como a Lua, branca!

V
Pudesse-me eu prostar, num meditado impulso,
Ó gélida mulher bizarramente estranha,
E trêmulo depor os lábios no seu pulso,
Entre a macia luva e o punho de bretanha!…

VI
Cintila ao seu rosto a lucidez das jóias.
Ao encarar consigo a fantasia pasma;

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Nem Sempre Sou Igual no que Digo e Escrevo

Nem sempre sou igual no que digo e escrevo.
Mudo, mas não mudo muito.
A cor das flores não é a mesma ao sol
De que quando uma nuvem passa
Ou quando entra a noite
E as flores são cor da sombra.
Mas quem olha bem vê que são as mesmas flores.
Por isso quando pareço não concordar comigo,
Reparem bem para mim:
Se estava virado para a direita,
Voltei-me agora para a esquerda,
Mas sou sempre eu, assente sobre os mesmos pés —
O mesmo sempre, graças ao céu e à terra
E aos meus olhos e ouvidos atentos
E à minha clara simplicidade de alma …

Solidão

Imensas noites de Inverno,
com frias montanhas mudas,
é o mar negro, mais eterno,
mais terrível, mais profundo.

(…)

A noite fecha seus lábios
– terra e céu – guardado nome.
E os seus longos sonhos sábios
geram a vida dos homens.

Geram os olhos incertos,
por onde descem os rios
que andam nos campos abertos
da claridade do dia.

A Tua Morte em Mim

À memória de Raquel Moacir

A tua morte é sempre nova em mim.
Não amadurece. Não tem fim.
Se ergo os olhos dum livro, de repente
tu morreste.
Acordo, e tu morreste.
Sempre, cada dia, cada instante,
a tua morte é nova em mim,
sempre impossível.

E assim, até à noite final
irás morrendo a cada instante
da vida que ficou fingindo vida.
Redescubro a tua morte como outros
descobrem o amor,
porque em cada lugar, cada momento,
tu estás viva.

Viverei até à hora derradeira a tua morte.
Aos goles, lentos goles. Como se fosse
cada vez um veneno novo.
Não é tanto a saudade que dói, mas o remorso.
O remorso de todo o perdido em nossa vida,
coisas de antes e depois, coisas de nunca,
palavras mudas para sempre, um gesto
que sem remédio jamais teve destino,
o olhar que procura e nunca tem resposta.

O único presente verdadeiro é teres partido.

Na Cadeia os Bandidos Presos!

Na cadeia os bandidos presos!
O seu ar de contemplativos!
Que é das flores de olhos acesos?!
Pobres dos seus olhos cativos.

Passeiam mudos entre as grades,
Parecem peixes num aquário.
_ Campo florido das Saudades,
Porque rebentas tumultuário?

Serenos… Serenos… Serenos…
Trouxe-os algemados a escolta.
_ Estranha taça de venenos
Meu coração sempre em revolta.

Coração, quietinho… quietinho…
Porque te insurges e blasfemas?
Pschiu… Não batas… Devagarinho…
Olha os soldados, as algemas!