Poemas sobre MĂșsica de CecĂ­lia Meireles

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Poemas de mĂșsica de CecĂ­lia Meireles. Leia este e outros poemas de CecĂ­lia Meireles em Poetris.

A Velhice Pede Desculpas

TĂŁo velho estou como ĂĄrvore no inverno,
vulcĂŁo sufocado, pĂĄssaro sonolento.
TĂŁo velho estou, de pĂĄlpebras baixas,
acostumado apenas ao som das mĂșsicas,
Ă  forma das letras.

Fere-me a luz das lùmpadas, o grito frenético
dos provisĂłrios dias do mundo:
Mas hĂĄ um sol eterno, eterno e brando
e uma voz que nĂŁo me canso, muito longe, de ouvir.

Desculpai-me esta face, que se fez resignada:
jĂĄ nĂŁo Ă© a minha, mas a do tempo,
com seus muitos episĂłdios.

Desculpai-me nĂŁo ser bem eu:
mas um fantasma de tudo.
Recebereis em mim muitos mil anos, Ă© certo,
com suas sombras, porém, suas interminåveis sombras.

Desculpai-me viver ainda:
que os destroços, mesmo os da maior glória,
são na verdade só destroços, destroços.

Gargalhada

Hornem vulgar! Homem de coração mesquinho!
Eu te quero ensinar a arte sublime de rir.
Dobra essa orelha grosseira, e escuta
o ritmo e o som da minha gargalhada:

Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah!

NĂŁo vĂȘs?
É preciso jogar por escadas de mármore baixelas de ouro.
Rebentar colares, partir espelhos, quebrar cristais,
vergar a lùmina das espadas e despedaçar eståtuas,
destruir as lĂąmpadas, abater cĂșpulas,
e atirar para longe os pandeiros e as liras…

O riso magnĂ­fico Ă© um trecho dessa mĂșsica desvairada.

Mas Ă© preciso ter baixelas de ouro,
compreendes?
— e colares, e espelhos, e espadas e estátuas.
E as lùmpadas, Deus do céu!
E os pandeiros ĂĄgeis e as liras sonoras e trĂ©mulas…

Escuta bem:

Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah!

SĂł de trĂȘs lugares nasceu atĂ© hoje esta mĂșsica herĂłica:
do céu que venta,
do mar que dança,
e de mim.

SugestĂŁo

Sede assim — qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

Flor que se cumpre,
sem pergunta.

Onda que se esforça,
por exercĂ­cio desinteressado.

Lua que envolve igualmente
os noivos abraçados
e os soldados jĂĄ frios.

Também como este ar da noite:
sussurrante de silĂȘncios,
cheio de nascimentos e pétalas.

Igual Ă  pedra detida,
sustentando seu demorado destino.
E Ă  nuvem, leve e bela,
vivendo de nunca chegar a ser.

À cigarra, queimando-se em mĂșsica,
ao camelo que mastiga sua longa solidĂŁo,
ao pĂĄssaro que procura o fim do mundo,
ao boi que vai com inocĂȘncia para a morte.

Sede assim qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

NĂŁo como o resto dos homens.