Romantismo
Quem tivesse um amor, nesta noite de lua,
para pensar um belo pensamento
e pousá-lo no vento!Quem tivesse um amor – longe, certo e impossĂvel –
para se ver chorando, e gostar de chorar,
e adormecer de lágrimas e luar!Quem tivesse um amor, e, entre o mar e as estrelas,
partisse por nuvens, dormente e acordado,
levitando apenas, pelo amor levado…Quem tivesse um amor, sem dĂşvida e sem mácula,
sem antes nem depois: verdade e alegoria…
Ah! quem tivesse… (Mas, quem teve? quem teria?)
Poemas sobre Certos de CecĂlia Meireles
4 resultadosRecado aos Amigos Distantes
Meus companheiros amados,
nĂŁo vos espero nem chamo:
porque vou para outros lados.
Mas Ă© certo que vos amo.Nem sempre os que estĂŁo mais perto
fazem melhor companhia.
Mesmo com sol encoberto,
todos sabem quando Ă© dia.Pelo vosso campo imenso,
vou cortando meus atalhos.
Por vosso amor Ă© que penso
e me dou tantos trabalhos.NĂŁo condeneis, por enquanto,
minha rebelde maneira.
Para libertar-me tanto,
fico vossa prisioneira.Por mais que longe pareça,
ides na minha lembrança,
ides na minha cabeça,
valeis a minha Esperança.
Timidez
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve. . .— mas só esse eu não farei.
Uma palavra caĂda
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes..— palavra que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,— que amargamente inventei.
E, enquanto nĂŁo me descobres,
os mundos vĂŁo navegando
nos ares certos do tempo,
atĂ© nĂŁo se sabe quando…— e um dia me acabarei.
A Velhice Pede Desculpas
Tão velho estou como árvore no inverno,
vulcão sufocado, pássaro sonolento.
Tão velho estou, de pálpebras baixas,
acostumado apenas ao som das mĂşsicas,
à forma das letras.Fere-me a luz das lâmpadas, o grito frenético
dos provisĂłrios dias do mundo:
Mas há um sol eterno, eterno e brando
e uma voz que nĂŁo me canso, muito longe, de ouvir.Desculpai-me esta face, que se fez resignada:
já não é a minha, mas a do tempo,
com seus muitos episĂłdios.Desculpai-me nĂŁo ser bem eu:
mas um fantasma de tudo.
Recebereis em mim muitos mil anos, Ă© certo,
com suas sombras, porém, suas intermináveis sombras.Desculpai-me viver ainda:
que os destroços, mesmo os da maior glória,
são na verdade só destroços, destroços.