Sonetos sobre Aviso

8 resultados
Sonetos de aviso escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Repouso na Alegria Comedido

Leda serenidade deleitosa,
Que representa em terra um paraĂ­so;
Entre rubis e perlas, doce riso,
Debaixo de ouro e neve, cor-de-rosa;

Presença moderada e graciosa,
Onde ensinando estĂŁo despejo e siso
Que se pode por arte e por aviso,
Como por natureza, ser formosa;

Fala de que ou já vida, ou morte pende,
Rara e suave, enfim, Senhora, vossa,
Repouso na alegria comedido:

Estas as armas sĂŁo com que me rende
E me cativa Amor; mas nĂŁo que possa
Despojar-me da glĂłria de rendido.

Outono

Com a carga de frutos maus maduros,
Nessa estação viril entrei do Outono.
Bradou-me o Desengano, de seu trono:
«Larga os pomos que trazes, tão impuros!

«Não soubeste colher outros mais puros,
«Desgraçado mortal, frouxo colono?
«Isso é que hás-de oferecer da vida ao Dono?
«Um mau agricultor tem maus futuros.

«Pois que inda tens vigor, tem mais juizo!»
O Desengano amigo me dizia.
Mas eu, surdo me fiz ao sábio aviso,

As rédeas não colhi da fantasia,
Deixei corrĂŞ-la Ă  solta, sem mais siso,
Pois isso frutos podres sĂł colhia.

Presença Bela, Angélica Figura

Presença bela, angélica figura,
em quem, quanto o CĂ©u tinha, nos tem dado;
gesto alegre, de rosas semeado,
entre as quais se está rindo a Fermosura;

olhos, onde tem feito tal mistura
em cristal branco o preto marchetado,
que vemos já no verde delicado
não esperança, mas enveja escura;

brandura, aviso e graça, que aumentando
a natural beleza cum desprezo,
com que, mais desprezada, mais se aumenta;

são as prisões de um coração que, preso,
seu mal ao som dos ferros vai cantando,
como faz a sereia na tormenta.

Meus Olhos, Atentai no Meu Jazigo

Meus olhos, atentai no meu jazigo,
Que o momento da morte está chegado;
Lá soa o corvo, intérprete do fado;
Bem o entendo, bem sei, fala comigo:

Triunfa, Amor, gloria-te, inimigo;
E tu, que vĂŞs com dor meu duro estado,
Volve à terra o cadáver macerado,
O despojo mortal do triste amigo:

Na campa, que o cobrir, piedoso Albano,
Ministra aos corações, que Amor flagela,
Terror, piedade, aviso, e desengano:

Abre em meu nome este epitáfio nela:
“Eu fui, ternos mortais, o terno Elmano;
Morri de ingratidões, matou-me Isabela.”

Diversos Dões Reparte O Céu Benino

Diversos dões reparte o Céu benino,
e quer que cada ĂĽa um sĂł possua;
assi, ornou de casto peito a LĂĽa,
ornamento do assento cristalino.

De graça, a Mãe fermosa do Minino,
que nessa vista tem perdido a sua;
Palas, de discrição, que imite a tua;
do valor, Juno, só de império dino.

Mas junto agora o mesmo CĂ©u derrama
em ti o mais que tinha, e foi o menos,
em respeito do Autor da natureza;

que, a seu pesar, te dĂŁo, fermosa Dama,
Diana, honestidade, e graça, Vénus,
Palas o aviso seu, Juno a nobreza.

Em Amor não há Senão Enganos

Suspiros inflamados que cantais
A tristeza com que eu vivi tĂŁo cedo;
Eu morro e nĂŁo vos levo, porque hei medo
Que ao passar do Leteo vos percais.

Escritos para sempre já ficais
Onde vos mostrarĂŁo todos co’o dedo,
Como exemplo de males; e eu concedo
Que para aviso de outros estejais.

Em quem, pois, virdes largas esperanças
De Amor e da Fortuna (cujos danos
Alguns terão por bem-aventuranças),

Dizei-lhe que os servistes muitos anos,
E que em Fortuna tudo são mudanças,
E que em Amor não há senão enganos.

Enquanto Quis Fortuna Que Tivesse

Enquanto quis Fortuna que tivesse
esperança de algum contentamento,
o gosto de um suave pensamento
me fez que seus efeitos escrevesse.

Porém, temendo Amor que aviso desse
minha escritura a algum juĂ­zo isento,
escureceu-me o engenho co tormento,
para que seus enganos nĂŁo dissesse.

Ă“ vĂłs que Amor obriga a ser sujeitos
a diversas vontades! Quando lerdes
num breve livro casos tĂŁo diversos,

verdades puras sĂŁo, e nĂŁo defeitos…
E sabei que, segundo o amor tiverdes,
tereis o entendimento de meus versos!

LXVI

NĂŁo te assuste o prodĂ­gio: eu, caminhante,
Sou uma voz, que nesta selva habito;
Chamei-me o pastor Fido; de um delito
Me veio o meu estrago; eu fui amante.

Uma ninfa perjura, uma inconstante
Neste estado me pĂ´s: do peito aflito,
Por eterno castigo, arranco um grito,
Que desengane o peregrino errante.

Se em ti se dá piedade, ó passageiro,
(Que assim o pede a minha sorte escura)
Atende ao meu aviso derradeiro:

Lágrimas não te peço, nem ternura:
Por voto um desengano, te requeiro
Que consagres Ă  minha sepultura.