O Lázaro Da Pátria
Filho podre de antigos Goitacases,
Em qualquer parte onde a cabeça ponha,
Deixa circunferências de peçonha,
Marcas oriundas de úlceras e antrazes.Todos os cinocéfalos vorazes
Cheiram seu corpo. À noite, quando sonha,
Sente no tĂłrax a pressĂŁo medonha
Do bruto embate fĂ©rreo das tenazes,Mostra aos montes e aos rĂgidos rochedos
A hedionda elefantĂasis dos dedos…
Há um cansaço no Cosmos… Anoitece,Riem as meretrizes no Casino,
E o Lázaro caminha em seu destino
Para um fim que ele mesmo desconhece!
Sonetos sobre Corpo de Augusto dos Anjos
7 resultadosHino À Dor
Dor, saĂşde dos seres que se fanam,
Riqueza da alma, psĂquico tesouro,
Alegria das glândulas do choro
De onde todas as lágrimas emanam..És suprema! Os meus átomos se ufanam
De pertencer-te, oh! Dor, ancoradouro
Dos desgraçados, sol do cérebro, ouro
De que as próprias desgraças se engalanam!Sou teu amante! Ardo em teu corpo abstrato.
Com os corpúsculos mágicos do tacto
Prendo a orquestra de chamas que executas…E, assim, sem convulsĂŁo que me alvorece,
Minha maior ventura Ă© estar de posse
De tuas claridades absolutas!
A Um Epilético
Perguntarás quem sou?! – ao suor que te unta,
Ă€ dor que os queixos te arrebenta, aos trismos
Da epilepsia horrenda, e nos abismos
Ninguém responderá tua pergunta!Reclamada por negros magnetismos
Sua cabeça há de cair, defunta
Na aterradora operação conjunta
Da tarefa animal dos organismos!Mas apĂłs o antropĂłfago alambique
Em que Ă© mister todo o teu corpo fique
Reduzido a excreções de sânie e lodo,Como a luz que arde, virgem, num monturo,
Tu hás de entrar completamente puro
Para a circulação do Grande Todo!
Alucinação À Beira-Mar
Um medo de morrer meus pés esfriava.
Noite alta. Ante o telĂşrico recorte,
Na diuturna discĂłrdia, a equĂłrea coorte
Atordoadoramente ribombava!Eu, ególatra céptico, cismava
Em meu destino!… O vento estava forte
E aquela matemática da Morte
Com os seus números negros me assombrava!Mas a alga usufructuária dos oceanos
E os malacopterĂgios subraquianos
Que um castigo de espĂ©cie emudeceu,No eterno horror das convulsões marĂtimas
Pareciam tambĂ©m corpos de vĂtimas
Condenadas Ă Morte, assim como eu!
Vox Victiæ
Morto! ConsciĂŞncia quieta haja o assassino
Que me acabou, dando-me ao corpo vĂŁo
Esta volĂşpia de ficar no chĂŁo
Fruindo na tabidez sabor divino!Espiando o meu cadáver resupino,
No mar da humana proliferação,
outras cabeças aparecerão
Para compartilhar do meu destino!Na festa genetlĂaca do Nada,
Abraço-me com a terra atormentada
Em contubĂ©rnio convulsionador …E ai! Como Ă© boa esta volĂşpia obscura
Que une os ossos cansados da criatura
Ao corpo ubiqüitário do Criador!
Pecadora
Tinha no olhar cetĂneo, aveludado,
A chama cruel que arrasta os corações,
Os seios rijos eram dois brasões
Onde fulgia o simb’lo do Pecado.Bela, divina, o porte emoldurado
No mármore sublime dos contornos,
Os seios brancos, palpitantes, mornos,
Dançavam-lhe no colo perfumado.No entanto, esta mulher de grã beleza,
Moldada pela mĂŁo da Natureza,
Tornou-se a pecadora vil. Do fado,Do destino fatal, presa, morria
Uma noute entre as vascas da agonia
Tendo no corpo o verme do pecado!
Eterna Mágoa
O homem por sobre quem caiu a praga
Da tristeza do Mundo, o homem que Ă© triste
Para todos os séculos existe
E nunca mais o seu pesar se apaga!Não crê em nada, pois, nada há que traga
Consolo à Mágoa, a que só ele assiste.
Quer resistir, e quanto mais resiste
Mais se lhe aumenta e se lhe afunda a chaga.Sabe que sofre, mas o que nĂŁo sabe
E que essa mágoa infinda assim não cabe
Na sua vida, é que essa mágoa infindaTranspõe a vida do seu corpo inerme;
E quando esse homem se transforma em verme
É essa mágoa que o acompanha ainda!