Sonetos Interrogativos

507 resultados
Sonetos interrogativos sobre diversos assuntos para ler e compartilhar. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Auto-Retrato

O’Neill (Alexandre), moreno portuguĂȘs,
cabelo asa de corvo; da angĂșstia da cara,
nariguete que sobrepuja de través
a ferida desdenhosa e nĂŁo cicatrizada.

Se a visagem de tal sujeito Ă© o que vĂȘs
(omita-se o olho triste e a testa iluminada)
o retrato moral tambĂ©m tem os seus quĂȘs
(aqui, uma pequena frase censurada…)

No amor? No amor crĂȘ (ou nĂŁo fosse ele O’Neill!)
e tem a veleidade de o saber fazer
(pois amor nĂŁo hĂĄ feito) das maneiras mil

que sĂŁo a semovente estĂĄtua do prazer.
Mas sofre de ternura, bebe de mais e ri-se
do que neste soneto sobre si mesmo disse…

Soneto De Natal

Um homem, – era aquela noite amiga,
Noite cristĂŁ, berço do Nazareno, –
Ao relembrar os dias de pequeno,
E a viva dança, e a lépida cantiga,

Quis transportar ao verso doce e ameno
As sensaçÔes da sua idade antiga,
Naquela mesma velha noite amiga,
Noite cristã, berço do Nazareno.

Escolheu o soneto… A folha branca
Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca,
A pena nĂŁo acode ao gesto seu.

E, em vĂŁo lutando contra o metro adverso,
SĂł lhe saiu este pequeno verso:
“Mudaria o Natal ou mudei eu?”

GadĂȘa Pelichek SebastiĂŁo

GadĂȘa… Pelichek… SebastiĂŁo…
Lobo Alvim… Ah, meus velhos camaradas!
Aonde foram vocĂȘs? Onde Ă© que estĂŁo
Aquelas nossas ideais noitadas?

Fiquei sozinho… Mas nĂŁo creio, nĂŁo,
Estejam nossas almas separadas!
Às vezes sinto aqui, nestas calçadas,
O passo amigo de vocĂȘs… E entĂŁo

NĂŁo me constranjo de sentir-me alegre,
De amar a vida assim, por mais que ela nos minta…
E no meu romantismo vagabundo

Eu sei que nestes céus de Porto Alegre
É para nós que inda S. Pedro pinta
Os mais belos crepĂșsculos do mundo!…

Amor De Mentiras

“Amor… De Mentiras…”
II
Eram brancas as mĂŁos, brancas e puras,
mĂŁos de lĂŁ, de pelĂșcia, mĂŁos amadas…
Como prever, vendo-as fazer ternuras,
que nas unhas traziam emboscadas ?

Era tĂŁo doce o olhar… em conjeturas
felizes, e em promessas impensadas…
Como enxergar, portanto, as amarguras
e as frias traiçÔes nele guardadas ?

Como pensar em duas, se somente
uma eu tinha em meus braços, e adorava,
e a outra, – uma impostora, – se mantinha ausente.

E, afinal, como ver, nessa alegria,
que o amor que tanta Vida me ofertava
seria o mesmo que me mataria ?

Os Parceiros

Sonhar Ă© acordar-se para dentro:
de sĂșbito me vejo em pleno sonho
e no jogo em que todo me concentro
mais uma carta sobre a mesa ponho.

Mais outra! É o jogo atroz do Tudo ou Nada!
E quase que escurece a chama triste…
E, a cada parada uma pancada,
o coração, exausto, ainda insiste.

Insiste em quĂȘ?Ganhar o quĂȘ? De quem?
O meu parceiro…eu vejo que ele tem
um riso silencioso a desenhar-se

numa velha caveira carcomida.
Mas eu bem sei que a morte Ă© seu disfarce…
Como também disfarce é a minha vida!

O Morcego

Meia noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vĂȘde:
Na bruta ardĂȘncia orgĂąnica da sede,
Morde-me a goela Ă­gneo e escaldante molho.

“Vou mandar levantar outra parede…”
– Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o tecto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocĂĄ-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tĂŁo feio parto?!

A ConsciĂȘncia Humana Ă© este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!

Amor, se te Repito

Amor, se te repito, se te clamo
se te exijo e te cravo em mim, se espero
sabendo que nĂŁo vens, e se te gero
em cada instante meu, e se te amo,

amor, se te reservo o que mais quero,
se te acredito exacto e te reclamo,
se te adivinho e sonho e te proclamo
Deus, coração e påtria, o que venero.

Amor, se te situo necessĂĄrio,
se me unifico em ti, eu que fui vĂĄrio
e fraco para todas as batalhas,

em nome de que glĂłria irei firmado
a conquistar-te, amor, se nem me Ă© dado
pedir no instante extremo que me valhas?