Vós, Crédulos Mortais, Alucinados
Vós, crédulos mortais, alucinados
de sonhos, de quimeras, de aparĂȘncias
colheis por uso erradas consequĂȘncias
dos acontecimentos desastrados.Se à perdição correis precipitados
por cegas, por fogosas, impaciĂȘncias,
indo a cair, gritais que sĂŁo violĂȘncias
de inexoråveis céus, de negros fados.Se um celeste poder tirano e duro
Ă s vezes extorquisse as liberdades,
que prestava, ó Razão, teu lume puro?Não forçam coraçÔes as divindades,
fado amigo nĂŁo hĂĄ nem fado escuro:
fados são as paixÔes, são as vontades.
Sonetos sobre PaixĂŁo de Manuel Maria Barbosa du Bocage
5 resultadosNada se Pode Comparar Contigo
O ledo passarinho, que gorjeia
D’alma exprimindo a cĂąndida ternura;
O rio transparente, que murmura,
E por entre pedrinhas serpenteia;O Sol, que o céu diåfano passeia,
A Lua, que lhe deve a formosura,
O sorriso da Aurora, alegre e pura,
A rosa, que entre os Zéfiros ondeia;A serena, amorosa Primavera,
O doce autor das glĂłrias que consigo,
A Deusa das paixÔes e de Citera;Quanto digo, meu bem, quanto não digo,
Tudo em tua presença degenera.
Nada se pode comparar contigo.
Nascemos para Amar
Nascemos para amar; a Humanidade
Vai, tarde ou cedo, aos laços da ternura.
Tu és doce atractivo, ó Formosura,
Que encanta, que seduz, que persuade.Enleia-se por gosto a liberdade;
E depois que a paixĂŁo na alma se apura,
Alguns entĂŁo lhe chamam desventura,
Chamam-lhe alguns entĂŁo felicidade.Qual se abisma nas lĂŽbregas tristezas,
Qual em suaves jĂșbilos discorre,
Com esperanças mil na ideia acesas.Amor ou desfalece, ou påra, ou corre:
E, segundo as diversas naturezas,
Um porfia, este esquece, aquele morre.
Meu Ser Evaporei na Luta Insana
Meu ser evaporei na luta insana
Do tropel de paixÔes que me arrastava:
Ah! cego eu cria, ah! mĂsero eu sonhava
Em mim quasi imortal a essĂȘncia humana!De que inĂșmeros sĂłis a mente ufana
ExistĂȘncia falaz me nĂŁo dourava!
Mas eis sucumbe Natureza escrava
Ao mal, que a vida em sua origem dana.Prazeres, sĂłcios meus, e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta em si nĂŁo coube,
No abismo vos sumiu dos desenganosDeus, Ăł Deus!… quando a morte a luz me roube,
Ganhe um momento o que perderam anos,
Saiba morrer o que viver nĂŁo soube.
Sobre Estas Duras, Cavernosas Fragas
Sobre estas duras, cavernosas fragas,
Que o marinho furor vai carcomendo,
Me estĂŁo negras paixĂ”es n’alma fervendo
Como fervem no pego as crespas vagas.Razão feroz, o coração me indagas,
De meus erros e sombra esclarecendo,
E vĂĄs nele (ai de mim!) palpando, e vendo
De agudas Ăąnsias venenosas chagas.Cego a meus males, surdo a teu reclamo,
Mil objectos de horror co’a ideia eu corro,
Solto gemidos, lĂĄgrimas derramo.RazĂŁo, de que me serve o teu socorro?
Mandas-me nĂŁo amar, eu ardo, eu amo;
Dizes-me que sossegue: eu peno, eu morro.