Sonetos sobre Sangue de Cruz e Souza

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Sonetos de sangue de Cruz e Souza. Leia este e outros sonetos de Cruz e Souza em Poetris.

LĂ©sbia

CrĂłton selvagem, tinhorĂŁo lascivo,
Planta mortal, carnĂ­vora, sangrenta,
Da tua carne báquica rebenta
A vermelha explosĂŁo de um sangue vivo.

Nesse lábio mordente e convulsivo,
Ri, ri risadas de expressĂŁo violenta
O Amor, trágico e triste, e passe, lenta,
A morte, o espasmo gĂ©lido, aflitivo…

LĂ©sbia nervosa, fascinante e doente,
Cruel e demonĂ­aca serpente
Das flamejantes atracões do gozo.

Dos teus seios acĂ­dulos, amargos,
Fluem capros aromas e os letargos,
Os Ăłpios de um luar tuberculoso…

Post Mortem

Quando do amor das Formas inefáveis
No teu sangue apagar-se a imensa chama,
Quando os brilhos estranhos e variáveis
Esmorecerem nos troféus da Fama.

Quando as níveas Estrelas invioláveis,
Doce velário que um luar derrama,
Nas clareiras azuis ilimitáveis
Clamarem tudo o que o teu Verso clama.

Já terás para os báratros descido,
Nos cilĂ­cios da Morte revestido,
PĂ©s e faces e mĂŁos e olhos gelados…

Mas os teus Sonhos e Visões e Poemas
Pelo alto ficarĂŁo de eras supremas
Nos relevos do Sol eternizados!

Boca Imortal

Abre a boca mordaz num riso convulsivo
Ă“ fera sensual, luxuriosa fera!
Que essa boca nervosa, em riso de pantera,
Quando ri para mim lembra um capro lascivo.

Teu olhar dá-me febre e dá-me um brusco e vivo
Tremor as carnes, que eu, se ele em mim reverbera,
Fico aceso no horror da paixĂŁo que ele gera,
Inflamada, fatal, dum sangue rubro e ativo.

Mas a boca produz tais sensações de morte,
O teu riso, afinal, Ă© tĂŁo profundo e forte
E tem de tanta dor tantas negras raĂ­zes;

Rigolboche do tom, Ăł flor pompadouresca!
Que és, para mim, no mundo, a trágica e dantesca
Imperatriz da Dor, entre as imperatrizes!

Salve! Rainha!

Ă“ sempre virgem Maria, concebida
sem pecado original, desde o
primeiro instante do teu ser…

MĂŁe de MisericĂłrdia, sem pecado
Original, desde o primeiro instante!
Salve! Rainha da MansĂŁo radiante,
Virgem do Firmamento constelado…

Teu coração de espadas lacerado,
Sangrando sangue e fel martirizante,
Escute a minha Dor, a torturante,
A Dor do meu soluço eternizado.

A minha Dor, a minha Dor suprema,
A Dor estranha que me prende, algema
Neste Vale de lágrimas profundo…

Salve! Rainha! por quem brado e clamo
E brado e brado e com angĂşstia chamo,
Chamo, atravĂ©s das convulsões do mundo!…

Cristo

Cristo morreu, Ăł tristes criaturas,
Era matéria como vós, morreu;
E quando a noite sepulcral desceu
Gelou com ele o oceano das ternuras.

Nunca outro sol de irradiações mais puras
Subiu tĂŁo alto e tanto resplendeu,
Nunca ninguém tão firme combateu
Da humanidade todas as torturas.

Morreu, que se ele, o Deus, ressuscitasse,
Limpa de sangue e lágrimas a face,
Os seus olhos tranqĂĽilos, virginais,

Dons inefáveis, corações piedosos,
Tinham de abrir-se muito dolorosos,
Também chorando quando vós chorais!