Sonetos sobre Sentimentos de Cruz e Souza

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Sonetos de sentimentos de Cruz e Souza. Leia este e outros sonetos de Cruz e Souza em Poetris.

Silêncios

Largos Silêncios interpretativos,
Adoçados por funda nostalgia,
Balada de consolo e simpatia
Que os sentimentos meus torna cativos.

Harmonia de doces lenitivos,
Sombra, segredo, lágrima, harmonia
Da alma serena, da alma fugidia
Nos seus vagos espasmos sugestivos.

Ó Silêncios! ó cândidos desmaios,
Vácuos fecundos de celestes raios
De sonhos, no mais límpido cortejo…

Eu vos sinto os mistérios insondáveis,
Como de estranhos anjos inefáveis
O glorioso esplendor de um grande beijo!

Sempre O Sonho

Para encantar os círculos da Vida
Ë ser tranqüilo, sonhador, confiante,
Sempre trazer o coração radiante
Como um rio e rosais junto de ermida.

Beber na vinha celestial, garrida
Das estrelas o vinho flamejante
E caminhar vitorioso e ovante
Como um deus, com a cabeça enflorescida.

Sorrir, amar para alargar os mundoe
Do Sentimento e para ter profundos
Momentos de momentos soberanos.

Para sentir em torno à terra ondeando
Um sonho, sempre um sonho além rolando
Vagas e vagas de imortais oceanos.

O Cego Do Harmonium

Esse cego do harmonium me atormenta
E atormentando me seduz, fascina.
A minh’alma para ele vai sedenta
Por falar com a sua alma peregrina.

O seu cantar nostálgico adormenta
Como um luar de mórbida neblina.
O harmonium geme certa queixa lenta,
Certa esquisita e lânguida surdina.

Os seus olhos parecem dois desejos
Mortos em flor, dois luminosos beijos
Fanados, apagados, esquecidos…

Ah! eu não sei o sentimento vário
Que prende-me a esse cego solitário,
De olhos aflitos como vãos gemidos!

Mundo Inaccessível

Tu’alma lembra um mundo inaccessível
Onde só astros e águias vão pairando,
Onde só se escuta, trágica, cantando,
A sinfonia da Amplidão terrível!

Alma nenhuma, que não for sensível,
Que asas não tenha para as ir vibrando,
Essa região secreta desvendando,
Falece, morre, num pavor incrível!

É preciso ter asas e ter garras
Para atingir aos ruídos de fanfarras
Do mundo da tu’alma augusta e forte.

É preciso subir ígneas montanhas
E emudecer, entre visões estranhas,
Num sentimento mais sutil que a Morte!

Eternidade Retrospectiva

Eu me recordo de já ter vivido,
Mudo e só, por olímpicas Esferas,
onde era tudo velhas primaveras
E tudo um vago aroma indefinido.

Fundas regiões do Pranto e do Gemido
Onde as almas mais graves, mais austeras
Erravam como trêmulas quimeras
Num sentimento estranho e comovido.

As estrelas, longínquas e veladas,
Recordavam violáceas madrugadas,
Um clarão muito leve de saudade.

Eu me recordo d’imaginativos
Luares liriais, contemplativos
Por onde eu já vivi na Eternidade!

Eterno Sonho

Quelle est donc cette femme?
Je ne comprendrai pas.
Félix Arvers

Talvez alguém estes meus versos lendo
Não entenda que amor neles palpita,
Nem que saudade trágica, infinita
Por dentro dele sempre está vivendo.

Talvez que ela não fique percebendo
A paixão que me enleva e que me agita,
Como de uma alma dolorosa, aflita
Que um sentimento vai desfalecendo.

E talvez que ela ao ler-me, com piedade,
Diga, a sorrir, num pouco de amizade,
Boa, gentil e carinhosa e franca:

— Ah! bem conheço o teu afeto triste…
E se em minha alma o mesmo não existe,
É que tens essa cor e é que eu sou branca!

Domus Aurea

De bom amor e de bom fogo claro
Uma casa feliz se acaricia…
Basta-lhe luz e basta-lhe harmonia
Para ela não ficar ao desamparo.

O Sentimento, quando é nobre e raro,
Veste tudo de cândida poesia…
Um bem celestial dele irradia,
Um doce bem, que não é parco e avaro.

Um doce bem que se derrama em tudo,
Um segredo imortal, risonho e mudo,
Que nos leva debaixo da sua asa.

E os nossos olhos ficam rasos d’água
Quando, rebentos de uma oculta mágoa,
São nossos filhos todo o céu da casa.

Sentimentos Carnais

Sentimentos carnais, esses que agitam
Todo o teu ser e o tornam convulsivo…
Sentimentos indômitos que gritam
Na febre intensa de um desejo altivo.

Ânsias mortais, angústias que palpitam,
Vãs dilacerações de um sonho esquivo,
Perdido, errante, pelos céus, que fitam
Do alto, nas almas, o tormento vivo.

Vãs dilacerações de um Sonho estranho,
Errante, como ovelhas de um rebanho,
Na noite de hóstias de astros constelada…

Errante, errante, ao turbilhão dos ventos,
Sentimentos carnais, vãos sentimentos
De chama pelos tempos apagada…