A Doença da Disciplina
Das feições de alma que caracterizam o povo português, a mais irritante é, sem dúvida, o seu excesso de disciplina. Somos o povo disciplinado por excelência. Levamos a disciplina social àquele ponto de excesso em que cousa nenhuma, por boa que seja — e eu não creio que a disciplina seja boa — por força que há-de ser prejudicial.
TĂŁo regrada, regular e organizada Ă© a vida social portuguesa que mais parece que somos um exĂ©rcito de que uma nação de gente com existĂŞncias individuais. Nunca o portuguĂŞs tem uma acção sua, quebrando com o meio, virando as costas aos vizinhos. Age sempre em grupo, sente sempre em grupo, pensa sempre em grupo. Está sempre Ă espera dos outros para tudo. E quando, por um milagre de desnacionalização temporária, pratica a traição Ă Pátria de ter um gesto, um pensamento, ou um sentimento independente, a sua audácia nunca Ă© completa, porque nĂŁo tira os olhos dos outros, nem a sua atenção da sua crĂtica.
Parecemo-nos muito com os alemĂŁes. Como eles, agimos sempre em grupo, e cada um do grupo porque os outros agem.
Por isso aqui, como na Alemanha, nunca Ă© possĂvel determinar responsabilidades; elas sĂŁo sempre da sexta pessoa num caso onde sĂł agiram cinco.
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