RaĂzes
Ehrenburg, que lia e traduzia os meus versos, repreendia-me: demasiada raiz, demasiadas raĂzes, nos teus versos. PorquĂŞ tantas? É verdade. As terras fronteiriças do Chile infiltraram as suas raĂzes na minha poesia e nunca puderam sair dela. A minha vida Ă© uma longa peregrinação que anda sempre Ă s voltas, que retorna sempre ao bosque austral, Ă selva perdida.
Ali, Ă© certo, as grandes árvores eram por vezes tombadas por setecentos anos de vida poderosa, ou arrancadas pelo furacĂŁo, ou queimadas pela neve, ou destruĂdas pelo incĂŞndio. Senti muitas vezes cair na profundidade da floresta as árvores titânicas: o roble que tomba com estrondo de catástrofe surda, como se batesse com mĂŁo colossal Ă s portas da terra pedindo sepultura. As raĂzes, porĂ©m, ficavam a descoberto, entregues ao tempo inimigo, Ă humidade, aos lĂquenes, ao aniquilamento progressivo.
Nada mais belo que aquelas grandes mĂŁos abertas, feridas e queimadas, que numa vereda do bosque nos indicam o segredo da árvore enterrada, o enigma que a folhagem mantinha, os mĂşsculos profundos do domĂnio vegetal. Trágicas e hirsutas, mostram-nos uma nova beleza: sĂŁo esculturas da profundidade — obras-primas secretas da natureza.Certa vez, caminhando com Rafael Alberti entre cascatas, matagais e bosques,
Textos sobre Costas
42 resultadosA Grande Vantagem da Vida
– A grande vantagem da vida Ă© ensinar-nos outra vez a chorar. A vida infantiliza. Fica-se maior no que nos faz ser mais pequenos. Cresce-se fora o que se vai perdendo por dentro. Passamos a infância a querer crescer, a adolescĂŞncia a querer crescer. E depois percebemos que sĂł quer crescer quem ainda se sente pequeno. Um adulto sente-se pequeno mas pensa ao contrário. Sente-se pequeno e quer ficar mais pequeno. Voltar ao tempo em que havia sonhos.
– Onde se perdem os sonhos?
– Todos os sonhos se perdem. Mesmo aqueles que vais ganhar, e vais ganhar muitos, se vão perder. Porque já deixaram de ser sonhos. Sonhaste aquilo, tiveste aquilo. E acabou. Lá se foi o sonho. O segredo é conseguir gerar novos sonhos. Sonhos que consigam ocupar o espaço em branco deixado pelo sonho perdido.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Mesmo que tenha sido ganho.
– Queria ser como tu.
– E eu queria ser como tu. Queria olhar para a frente e ver que o caminho não acaba, o caminho a perder de vista.
– O teu não se perde de vista?
– O meu faz-me perder a vista.