Progresso Aparente
O homem progride em todos os sentidos. Domina a matĂ©ria, Ă© incontestável, mas ainda nĂŁo se sabe dominar a si mesmo. Sim, façam-se caminhos de ferro e telĂ©grafos, atravessem-se num abrir e fechar de olhos terras e mares, mas dirijam-se tambĂ©m as paixões como se conduzem os aerĂłstatos: abulam-se sobretudo as paixões malignas que, apesar das máximas liberais e fraternas da nossa Ă©poca, ainda nĂŁo perderam o seu domĂnio detestável sobre os nossos corações. É nisso que reside o verdadeiro progresso, e atĂ© a verdadeira felicidade! Mas, pelo contrário, atĂ© parece que os nossos instintos de cobiça e de gozo egoĂsta foram infindamente ainda mais excitados por todas estas inovações materiais.
O desejo de uma felicidade impossĂvel, que seria obtida independentemente na satisfação que nos vem da paz da alma, Ă© indissociável já de qualquer nova descoberta e parece fazer retroceder no tempo a quimera desse paraĂso dos sentidos.
Textos sobre Terra de Eugène Delacroix
3 resultadosO Verdadeiro Homem
É evidente que a natureza se preocupa bem pouco com o que o homem tem ou nĂŁo no espĂrito. O verdadeiro homem Ă© o homem selvagem, que se relaciona com a natureza tal como ela Ă©. Assim que o homem aguça a sua inteligĂŞncia, desenvolve as suas ideias e a forma de as exprimir, ou adquire novas necessidades, a natureza opõe-se aos seus desĂgnios em toda a linha. SĂł lhe resta violentá-la, continuamente. Ela, pelo seu lado, tambĂ©m nĂŁo fica quieta. Se ele suspende por momentos o trabalho que se impusera, ela torna-se de novo dominadora, invade-o, devora-o, destrĂłi ou desfigura a sua obra; dir-se-ia que acolhe com impaciĂŞncia as obras-primas da imaginação e da perĂcia do homem.
Que importam Ă ronda das estações, ao curso dos astros, dos rios e dos ventos, o PartĂ©non, SĂŁo Pedro de Roma e tantas outras maravilhas da arte? Um tremor de terra ou a lava de um vulcĂŁo reduzem-nos a nada; os pássaros farĂŁo os seus ninhos nas suas ruĂnas; os animais selvagens irĂŁo buscar os ossos dos construtores aos seus tĂşmulos entreabertos.
Felicidade Aparente
Ao reflectir sobre a frescura das recordações, sobre a cor encantada de que elas se revestem num passado longĂnquo, nĂŁo pude deixar de admirar esse trabalho involuntário da alma que separa e suprime na recordação desses momentos agradáveis tudo o que poderia diminuir o encanto do momento entĂŁo vivido.
(…) Poderá uma pessoa afirmar ter sido feliz num determinado momento da sua vida, que lhe parece encantador retrospectivamente? O prĂłprio facto de o recordar ao dar-se conta da felicidade que entĂŁo deve ter sentido deve satisfazĂŞ-lo. Mas ter-se-ia sentido efectivamente feliz nesse instante de pretensa felicidade?
Pode-se compara essa pessoa com um indivĂduo que possuĂsse uma parcela de terra em que estivesse escondido um tesouro, do qual ele, contudo, nĂŁo teria conhecimento. Poder-se-Ă considerar «rico» esse homem? Do mesmo modo nĂŁo considero feliz aquele que o Ă© sem se aperceber disso, ou sem saber a que ponto monta a sua felicidade.