Verosimilhança não é Verdade
Quase sempre as suspeitas nos inquietam; somos sempre o joguete desses boatos de opiniĂŁo, que tantas vezes põe em fuga um exĂ©rcito, quanto mais um simples indivĂduo. (…) nĂłs rendemo-nos prontamente Ă opiniĂŁo. NĂŁo fazemos a crĂtica das razões que nos levam ao temor, nĂŁo as esquadrinhamos. Perdemos todo o sangue-frio, batemos em retirada, como os soldados expulsos do seu campo Ă vista da nuvem de poeira que levanta uma tropa a galope, ou tomados de terror colectivo por causa de um boato semeado sem garante.
NĂŁo sei como, mas as falsidades perturbam-nos desde logo. A verdade traz consigo a sua prĂłpria medida; tudo quanto se funda sobre uma incerteza, porĂ©m, fica entregue Ă conjectura e Ă s fantasias de um espĂrito perturbado.
Eis porque, entre as mais diversas formas do medo, nĂŁo há outra mais desastrosa, mais incoercĂvel que o medo pânico. Nos casos ordinários, a reflexĂŁo Ă© falha; nestes, a inteligĂŞncia está ausente.
Interroguemos, pois, cuidadosamente a realidade. É verosĂmil que uma desgraça venha a produzir-se? Verosimilhança nĂŁo Ă© verdade. Quantos acontecimentos ocorreram sem que os esperássemos! Quantos acontecimentos esperados que jamais ocorreram! Mesmo que venham a produzir-se, que Ă© que lucraremos em nos anteciparmos Ă nossa dor?
Textos sobre Terror de SĂ©neca
2 resultadosRegras de Conduta para Viver sem Sobressaltos
Vou indicar-te quais as regras de conduta a seguir para viveres sem sobressaltos. (…) Passa em revista quais as maneiras que podem incitar um homem a fazer o mal a outro homem: encontrarás a esperança, a inveja, o Ăłdio, o medo, o desprezo. De todas elas a mais inofenÂsiva Ă© o desprezo, tanto que muitas pessoas se tĂŞm sujeitado a ele como forma de passarem despercebidas. Quem despreza o outro calca-o aos pĂ©s, Ă© evidente, mas passa adiante; ninguĂ©m se afadiga teimosamente a fazer mal a alguĂ©m que despreza. É como na guerra: ninguĂ©m liga ao soldado caĂdo, combate-se, sim, quem se ergue a fazer frente.
Quanto Ă s esperanças dos desonestos, bastar-te-á, para evitá-las, nada possuĂres que possa suscitar a pĂ©rfida cobiça dos outros, nada teres, em suma, que atraia as atenções, porquanto qualquer objecto, ainda que pouco valioso, suscita desejos se for pouco usual, se for uma raridade. Para escapares Ă inveja deverás nĂŁo dar nas vistas, nĂŁo gabares as tuas propriedades, saberes gozar discretamente aquilo que tens. Quanto ao Ăłdio, ou derivará de alguma ofensa que tenhas feito (e, neste caso, bastar-te-á nĂŁo lesares ninguĂ©m para o evitares), ou será puramente gratuito, e entĂŁo será o senso comum quem te poderá proteger.