Dona Abastança
«A caridade é amor»
Proclama dona Abastança
Esposa do comendador
Senhor da alta finança.FamĂlia necessitada
A boa senhora acode
Pouco a uns a outros nada
«Dar a todos não se pode.»Já se deixa ver
Que nĂŁo pode ser
Quem
O que tem
Dá a pedir vem.O bem da bolsa lhes sai
E sai caro fazer o bem
Ela dá ele subtrai
Fazem como lhes convém
Ela aos pobres dá uns cobres
Ele incansável lá vai
Com o que tira a quem nĂŁo tem
Fazendo mais e mais pobres.Já se deixa ver
Que nĂŁo pode ser
Dar
Sem ter
E ter sem tirar.Todo o que milhões furtou
Sempre ao bem-fazer foi dado
Pouco custa a quem roubou
Dar pouco a quem foi roubado.Oh engano sempre novo
De tĂŁo estranha caridade
Feita com dinheiro do povo
Ao povo desta cidade.
Poemas sobre Cidade de Manuel da Fonseca
2 resultadosPoemas da Infância
Segundo
Quando foi que demorei os olhos
sobre os seios nascendo debaixo das blusas,
das raparigas que vinham, Ă tarde, brincar comigo?…
… Como nasci poeta
devia ter sido muito antes que as mĂŁes se apercebessem disso
e fizessem mais largas as blusas para as suas meninas.
Quando, nĂŁo sei ao certo.Mas a histĂłria dos peitos, debaixo das blusas,
foi um grande mistério.
TĂŁo grande
que eu corria até ao cansaço.
E jogava pedradas a coisas impossĂveis de tocar,
como sejam os pássaros quando passam voando.E desafiava,
sem razĂŁo aparente,
rapazes muito mais velhos e fortes!
E uma vez,
de cima de um telhado,
joguei uma pedrada tĂŁo certeira
que levou o chapéu do Senhor Administrador!Em toda a vila
se falou logo num caso de polĂtica;
o Senhor Administrador
mandou vir da cidade uma pistola,
que mostrava, nos cafés, a quem a queria ver;
e os do partido contrário
deixaram crescer o musgo nos telhados
com medo daquela raiva de tiros para o cĂ©u…Tal era o mistĂ©rio dos seios nascendo debaixo das blusas!