Poemas sobre Impulsos

16 resultados
Poemas de impulsos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

FrĂ­gida

I
Balzac Ă© meu rival, minha senhora inglesa!
Eu quero-a porque odeio as carnaçÔes redondas!
Mas ele eternizou-lhe a singular beleza
E eu turbo-me ao deter seus olhos cor das ondas.

II
Admiro-a. A sua longa e plĂĄcida estatura
ExpÔe a majestade austera dos invernos.
NĂŁo cora no seu todo a tĂ­mida candura;
Dançam a paz dos céus e o assombro dos infernos.

III
Eu vejo-a caminhar, fleumĂĄtica, irritante,
Numa das mĂŁos franzindo um lençol de cambraia!…
NinguĂ©m me prende assim, fĂșnebre, extravagante,
Quando arregaça e ondula a preguiçosa saia!

IV
Ouso esperar, talvez, que o seu amor me acoite,
Mas nunca a fitarei duma maneira franca;
Traz o esplendor do Dia e a palidez da Noite,
É, como o Sol, dourada, e, como a Lua, branca!

V
Pudesse-me eu prostar, num meditado impulso,
Ó gĂ©lida mulher bizarramente estranha,
E trĂȘmulo depor os lĂĄbios no seu pulso,
Entre a macia luva e o punho de bretanha!…

VI
Cintila ao seu rosto a lucidez das jĂłias.
Ao encarar consigo a fantasia pasma;

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Triste Padeço

Aves que o ar discorrei,
No vĂŽo as asas batendo,
E por vossas penas conta
Às minhas meu sentimento.

Compadecidas ouvi
De minha dor os excessos,
Mas em dizer que Ă© saudade,
Digo o que posso dizer-vos.
Triste padeço, e ausente
Os golpes dos meus receios
Nas batalhas da distĂąncia,
Nos desafios do tempo.

Nas violĂȘncias, do que choro,
Dos alĂ­vios desespero,
Que nĂŁo adormece a queixa,
Quando a desperta o desvelo.

Esmoreceu a esperança
Nas dilaçÔes do desejo
Prognosticando a ruĂ­na
Frenético o pensamento.

Se meu mal sĂŁo sintomas,
Mortais ausĂȘncias, e zelos,
Era o remédio esquecer-me,
Se em mim houvera esquecimento.

Mas se faz no meu cuidado
OperaçÔes o veneno,
Viva de senti-lo quem,
NĂŁo morre de padecĂȘ-lo.

JĂĄ que morro, ingrata sorte,
Às mãos da tua porfia,
Deixa-me inquirir um dia
A causa da minha morte:

Se amor com impulso forte
Me rendeu, como me aparta
Do bem, que na alma retrata
Minha doce saudade,

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É InĂștil Querer Parar o Homem

É inĂștil querer parar o Homem,
o que transforma a pedra em piso,
o piso em casa e a casa em fonte
de novas mĂșsicas da carne
sob as velocidades da luz e da sombra.
É inĂștil querer parar o Homem
acolher sempre um pouco de si prĂłprio
no mistério da vida a cavalgar
os cavalos aéreos da semùntica
sob uma indeferida eternidade.
É inĂștil querer parar o Homem
e o impulso que o transforma sempre
na pĂĄtria sem fim do ato livre
que arranca a vida e o tempo e as coisas
do espelho imĂłvel dos conceitos.
Ah, que mistério maior é este
que liga a liberdade e o homem
e une o homem a outros homens
como o curso de um rio ao mar!
(quando a noite Ă© una e indivisĂ­vel,
nos olhos da mulher que eu amo
acende-se o deus deste segredo
-e uma sombra sĂł nos transporta
ao fundo sem nome da vida.)

É inĂștil querer parar o Homem.
Do que morre fica o gesto alto
a ser o germe de outro gesto
que ainda nem vemos no tempo.

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Tenho Mais Almas que Uma

Vivem em nĂłs inĂșmeros;
Se penso ou sinto, ignoro
Quem Ă© que pensa ou sente.
Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.

Tenho mais almas que uma.
HĂĄ mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.

Os impulsos cruzados
Do que sinto ou nĂŁo sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu ‘screvo.

O Cavaleiro

Talvez o espere ainda a Incomeçada
aquela que louvĂĄmos uma noite
quando o abril rompeu em nossas veias.
Talvez o espere a avĂł o pai amigos
e a mãe que disfarça às vezes uma lågrima.
Talvez o prĂłprio povo o espere ainda
quando subitamente fica melancĂłlico
propenso a acreditar em coisas misteriosas.

Algures dentro de nĂłs ele cavalga
algures dentro de nĂłs
entre mortos e mortos.
É talvez um impulso quando chega maio
ou as primeiras aves partem em setembro.

Cargas e cargas de cavalaria.
E cercos. Conquistas. NaufrĂĄgios naufrĂĄgios.
Quem sabe porquĂȘ. Quem sabe porquĂȘ.
Entre mortos e mortos
algures dentro de nĂłs.

Quem pode retĂȘ-lo?
Quem sabe a causa que sem cessar peleja?
E cavalga cavalga.

Sei apenas que Ă s vezes estremecemos:
Ă© quando irrompe de repente Ă  flor do ser
e nos deixa nas mĂŁos
uma espada e uma rosa.

O Que Amamos EstĂĄ Sempre Longe de NĂłs

O que amamos estĂĄ sempre longe de nĂłs:
e longe mesmo do que amamos – que nĂŁo sabe
de onde vem, aonde vai nosso impulso de amor.

O que amamos estĂĄ como a flor na semente,
entendido com medo e inquietude, talvez
sĂł para em nossa morte estar durando sempre.

Como as ervas do chĂŁo, como as ondas do mar,
os acasos se vĂŁo cumprindo e vĂŁo cessando.
Mas, sem acaso, o amor lĂ­mpido e exacto jaz.

NĂŁo necessita nada o que em si tudo ordena:
cuja tristeza unicamente pode ser
o equĂ­voco do tempo, os jogos da cegueira

com setas negras na escuridĂŁo.

Vocação de Poeta

Recentemente, ao repousar
Sob essa folhagem
Ouvi bater, tiquetaque,
Suavemente, como em compasso.
Aborrecido, fiz uma careta,
Depois, abandonando-me,
Acabei, como um poeta,
Por imitar o mesmo tiquetaque.

Ouvindo assim, upa,
Saltar as sĂ­labas,
Desatei de repente a rir,
Durante um bom quarto de hora.
Tu poeta? Tu poeta?
Estarås assim mal da cabeça?
«Sim, senhor, vocĂȘ Ă© poeta»,
Diz Pic, o PĂĄssaro, encolhendo os ombros.

Quem espero eu sob este arbusto?
Quem estarei a espreitar como um ladrĂŁo?
Uma palavra? Uma imagem?
Logo a minha ruĂ­na aparece.
Nada do que rasteja, ou que saltite
Escapa ao impulso dos meus versos,
«Sim, senhor, vocĂȘ Ă© poeta»,
Diz Pic, o PĂĄssaro, encolhendo os ombros.

A rima Ă© como uma flecha,
Que temor, que tremor,
Ao penetrar no coração,
Lagarto a contorcer-se!
Morrereis assim, pobres diabos,
Ou ficareis embriagados,
«Sim, senhor, vocĂȘ Ă© poeta»,
Diz Pic, o PĂĄssaro, encolhendo os ombros.

VersĂ­culos informes que se atropelam,
Pequenas palavras loucas, que efervescĂȘncia
Até que, linha a linha,

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Fragmento Terceiro

I

Campos de ira, tĂŁo vasto sentimento
vos afasta. Ă­ris morta! Os actos radicais
constroem, em projeto, um frĂĄgil
universo – a tinta, o espaço óptico.
Descansam os sentidos sobre prĂłdigas
defesas: os filtros turvos, as precauçÔes
na sua cura. Os nervos tersos
da anålise da vida e da matéria.

II

Desviam-se dos livros. Hoje escreve
contra a morte dos olhos, a existĂȘncia
passĂ­vel de leitura. Ineptos, os sons
perdem-se na encosta. o vento fere
ainda? Inscrito
na årea da cabeça, é esse rastro
ainda vivo. Domino a sua queda, os seus poderes
punitivos, a sua força hereditåria.

III

Persistir no imĂłvel. Preencher
os anos que nos moldam
no vigor da fibra, no duro movimento
interior — a que destino, a que imaturo
ritmo, sem preço? Pois é o caro
prémio deste dorso
de o cumprir, pensar, até ao fim.
Ou de saber adestrå-lo até que,
exausto, sĂł impulso
vigore — a morte lida
num prĂłximo sentido, ainda vivo.

IV

Como contacto Ășnico,

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Hino Ă  SolidĂŁo

Diz-se que a solidĂŁo torna a vida um deserto;
Mas quem sabe viver com a sua alma nunca
Se encontra sĂł; a Alma Ă© um mundo, um mundo
[aberto
Cujo åtrio, a nossos pés, de pétalas se junca.

Mundo vasto que mil existĂȘncias povoam:
Imagens, concepçÔes, formas do sentimento,
— Sonhos puros que nele em beleza revoam
E ficam a brilhar, sĂłis do seu firmamento.

Dia a dia, hora a hora, o Pensamento lavra
Esse fecundo chĂŁo onde se esconde e medra
A semente que vai germinar na Palavra,
Cantar no Som, flores na Cor, sorrir na Pedra!

Basta que certa luz de seus raios aqueça
A semente que jaz na sua leiva escondida,
Para que ela, a sorrir, desabroche e floresça,
De perfumes enchendo as estradas da Vida.

Sei que embora essa luz nem para todos tenha
O mesmo brilho, o mesmo impulso criador,
Da GlĂłria, sempre vĂŁ, todo o asceta desdenha,
Vivendo como um deus no seu mundo interior.

E que mundo sublime, esse em que ele se agita!
Mundo que de si mesmo e em si mesmo criou,

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Entre a Flor e o Tempo

Também de dor se morre pois é morte
o sentimento ausente. O ser feliz
Ă© ser presente, sem que mais importe
esse profundo sulco e a cicatriz
que no corpo nos marca o sofrimento.
Assim Ă© nossa vida, sempre o lance
de viver, mesmo em dor, e dos momentos
erguer templos, embora breve o alcance
em nĂłs do tempo. E o que restar do ardor
com que se vive o amor enfim carrega
em rosa mais perfeita e em outro amor
sonhado da extensĂŁo de nossa entrega.
No impulso com que o espaço alcança o tempo
a vida se ergue além do sofrimento.

Ó Minha Felicidade

Revejo os pombos de SĂŁo Marcos:
A praça estå silenciosa; ali se repousa a manhã.
Indolentemente envio os meus cantos para o seio da suave
frescura,
Como enxames de pombos para o azul
Depois torno a chamĂĄ-los
Para prender mais uma rima Ă s suas penas.
— Ó minha felicidade! Ó minha felicidade!

Calmo céu, céu azul-claro, céu de seda,
Planas, protector, sobre o edifĂ­cio multicor
De que gosto, que digo eu?… Que receio, que invejo…
Como seria feliz bebendo-lhe a alma!
Alguma vez lha devolveria?
NĂŁo, nĂŁo falemos disso, Ăł maravilha dos olhos!
— Ó minha felicidade! Ó minha felicidade!

Severa torre, que impulso leonino
Te levantou ali, triunfante e sem custo!
Dominas a praça com o som profundo dos teus sinos…
Serias, em francĂȘs, o seu «accent aigu»!
Se, como tu, eu ficasse aqui,
Saberia a seda que me prende…
— Ó minha felicidade! Ó minha felicidade!

Afasta-te, mĂșsica. Deixa primeiro as sombras engrossar
E crescer até à noite escura e tépida.
É ainda muito cedo para ti, os teus arabescos de ouro
Ainda nĂŁo cintilam no seu esplendor de rosa;

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Os Grandes Indiferentes

Ouvi contar que outrora, quando a Pérsia
Tinha nĂŁo sei qual guerra,
Quando a invasĂŁo ardia na cidade
E as mulheres gritavam,
Dois jogadores de xadrez jogavam
O seu jogo contĂ­nuo.

À sombra de ampla árvore fitavam
O tabuleiro antigo,
E, ao lado de cada um, esperando os seus
Momentos mais folgados,
Quando havia movido a pedra, e agora
Esperava o adversĂĄrio.
Um pĂșcaro com vinho refrescava
Sobriamente a sua sede.

Ardiam casas, saqueadas eram
As arcas e as paredes,
Violadas, as mulheres eram postas
Contra os muros caĂ­dos,
Traspassadas de lanças, as crianças
Eram sangue nas ruas…
Mas onde estavam, perto da cidade,
E longe do seu ruĂ­do,
Os jogadores de xadrez jogavam
O jogo de xadrez.

Inda que nas mensagens do ermo vento
Lhes viessem os gritos,
E, ao refletir, soubessem desde a alma
Que por certo as mulheres
E as tenras filhas violadas eram
Nessa distĂąncia prĂłxima,
Inda que, no momento que o pensavam,
Uma sombra ligeira
Lhes passasse na fronte alheada e vaga,

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Se te Queres Matar

Se te queres matar, por que nĂŁo te queres matar?
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, tambĂ©m me mataria…
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas
A que chamamos o mundo?
A cinematografia das horas representadas
Por atores de convençÔes e poses determinadas,
O circo policromo do nosso dinamismo sem fĂ­m?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente…
Talvez, acabando, comeces…
E, de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E nĂŁo cantes, como eu, a vida por bebedeira,
NĂŁo saĂșdes como eu a morte em literatura!

Fazes falta? Ó sombra fĂștil chamada gente!
NinguĂ©m faz falta; nĂŁo fazes falta a ninguĂ©m…
Sem ti correrĂĄ tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te…
Talvez peses mais durando, que deixando de durar…

A mĂĄgoa dos outros?… Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa: pouco te chorarĂŁo…
O impulso vital apaga as lĂĄgrimas pouco a pouco,

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CĂąntico Negro

“Vem por aqui” – dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: “vem por aqui!”
Eu olho-os com olhos lassos,
(Hå, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali…

A minha glĂłria Ă© esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
– Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre Ă  minha mĂŁe

NĂŁo, nĂŁo vou por aĂ­! SĂł vou por onde
Me levam meus prĂłprios passos…

Se ao que busco saber nenhum de vĂłs responde
Por que me repetis: “vem por aqui!”?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aĂ­…

Se vim ao mundo, foi
SĂł para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vĂłs
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstĂĄculos?…
Corre,

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Enfermaria Nove

13

Correram as cortinas: construĂ­ram
um Ășltimo lugar, – indefinido
trĂąnsito: funesto, ou devido
aos olhos que dez vezes jĂĄ o viram

erguido sobre o chĂŁo de um tal piso.
RidĂ­culo volume; mas o pano
destrĂłi passo e sonho, – desengano
crescendo no espelho quase liso.

Um pouco mais de luz: a de nĂŁo ser.
E o golpe, em si, torna-se breve:
o tempo do transporte, – se um braço

avança no desejo de prender.
E o corpo dilui-se quando leve
impulso diminui, – ou se diz lasso.