Poemas sobre Inconscientes de Álvaro de Campos

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Poemas de inconscientes de Álvaro de Campos. Leia este e outros poemas de Álvaro de Campos em Poetris.

Existir Ă© Ser PossĂ­vel Haver Ser

Ah, perante esta Ășnica realidade, que Ă© o mistĂ©rio,
Perante esta Ășnica realidade terrĂ­vel — a de haver uma realidade,
Perante este horrĂ­vel ser que Ă© haver ser,
Perante este abismo de existir um abismo,
Este abismo de a existĂȘncia de tudo ser um abismo,
Ser um abismo por simplesmente ser,
Por poder ser,
Por haver ser!
— Perante isto tudo como tudo o que os homens fazem,
Tudo o que os homens dizem,
Tudo quanto constroem, desfazem ou se constrói ou desfaz através deles,
Se empequena!
NĂŁo, nĂŁo se empequena… se transforma em outra coisa —
Numa sĂł coisa tremenda e negra e impossĂ­vel,
Urna coisa que estå para além dos deuses, de Deus, do Destino
—Aquilo que faz que haja deuses e Deus e Destino,
Aquilo que faz que haja ser para que possa haver seres,
Aquilo que subsiste através de todas as formas,
De todas as vidas, abstratas ou concretas,
Eternas ou contingentes,
Verdadeiras ou falsas!
Aquilo que, quando se abrangeu tudo, ainda ficou fora,
Porque quando se abrangeu tudo nĂŁo se abrangeu explicar por que Ă© um tudo,

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Ode Triunfal

À dolorosa luz das grandes lĂąmpadas elĂ©ctricas da fĂĄbrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fĂșria!
Em fĂșria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lĂĄbios secos, Ăł grandes ruĂ­dos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensaçÔes,
Com um excesso contemporĂąneo de vĂłs, Ăł mĂĄquinas!

Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical –
Grandes trĂłpicos humanos de ferro e fogo e força –
Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro,
Porque o presente Ă© todo o passado e todo o futuro
E hå Platão e Virgílio dentro das måquinas e das luzes eléctricas
SĂł porque houve outrora e foram humanos VirgĂ­lio e PlatĂŁo,
E pedaços do Alexandre Magno do século talvez cinquenta,

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ReticĂȘncias

Arrumar a vida, pÎr prateleiras na vontade e na acção.
Quero fazer isto agora, como sempre quis, com o mesmo resultado;
Mas que bom ter o propĂłsito claro, firme sĂł na clareza, de fazer qualquer coisa!
Vou fazer as malas para o Definitivo,
Organizar Álvaro de Campos,
E amanhĂŁ ficar na mesma coisa que antes de ontem — um antes de ontem que Ă© sempre…
Sorrio do conhecimento antecipado da coisa-nenhuma que serei.
Sorrio ao menos; sempre Ă© alguma coisa o sorrir…
Produtos romĂąnticos, nĂłs todos…
E se nĂŁo fĂŽssemos produtos romĂąnticos, se calhar nĂŁo serĂ­amos nada.
Assim se faz a literatura…
Santos Deuses, assim até se faz a vida!
Os outros também são romùnticos,
Os outros também não realizam nada, e são ricos e pobres,
Os outros também levam a vida a olhar para as malas a arrumar,
Os outros também dormem ao lado dos papéis meio compostos,
Os outros também são eu.
Vendedeira da rua cantando o teu pregĂŁo como um hino inconsciente,
Rodinha dentada na relojoaria da economia polĂ­tica,
Mãe, presente ou futura, de mortos no descascar dos Impérios,

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