Ă Minha Felicidade
Revejo os pombos de SĂŁo Marcos:
A praça estå silenciosa; ali se repousa a manhã.
Indolentemente envio os meus cantos para o seio da suave
frescura,
Como enxames de pombos para o azul
Depois torno a chamĂĄ-los
Para prender mais uma rima Ă s suas penas.
â Ă minha felicidade! Ă minha felicidade!Calmo cĂ©u, cĂ©u azul-claro, cĂ©u de seda,
Planas, protector, sobre o edifĂcio multicor
De que gosto, que digo eu?… Que receio, que invejo…
Como seria feliz bebendo-lhe a alma!
Alguma vez lha devolveria?
NĂŁo, nĂŁo falemos disso, Ăł maravilha dos olhos!
â Ă minha felicidade! Ă minha felicidade!Severa torre, que impulso leonino
Te levantou ali, triunfante e sem custo!
Dominas a praça com o som profundo dos teus sinos…
Serias, em francĂȘs, o seu «accent aigu»!
Se, como tu, eu ficasse aqui,
Saberia a seda que me prende…
â Ă minha felicidade! Ă minha felicidade!Afasta-te, mĂșsica. Deixa primeiro as sombras engrossar
E crescer até à noite escura e tépida.
Ă ainda muito cedo para ti, os teus arabescos de ouro
Ainda nĂŁo cintilam no seu esplendor de rosa;
Poemas sobre Receio
26 resultadosSe te Queres Matar
Se te queres matar, por que nĂŁo te queres matar?
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, tambĂ©m me mataria…
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas
A que chamamos o mundo?
A cinematografia das horas representadas
Por atores de convençÔes e poses determinadas,
O circo policromo do nosso dinamismo sem fĂm?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente…
Talvez, acabando, comeces…
E, de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E nĂŁo cantes, como eu, a vida por bebedeira,
NĂŁo saĂșdes como eu a morte em literatura!Fazes falta? Ă sombra fĂștil chamada gente!
NinguĂ©m faz falta; nĂŁo fazes falta a ninguĂ©m…
Sem ti correrĂĄ tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te…
Talvez peses mais durando, que deixando de durar…A mĂĄgoa dos outros?… Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa: pouco te chorarĂŁo…
O impulso vital apaga as lĂĄgrimas pouco a pouco,
FrĂgida
I
Balzac Ă© meu rival, minha senhora inglesa!
Eu quero-a porque odeio as carnaçÔes redondas!
Mas ele eternizou-lhe a singular beleza
E eu turbo-me ao deter seus olhos cor das ondas.II
Admiro-a. A sua longa e plĂĄcida estatura
ExpÔe a majestade austera dos invernos.
NĂŁo cora no seu todo a tĂmida candura;
Dançam a paz dos céus e o assombro dos infernos.III
Eu vejo-a caminhar, fleumĂĄtica, irritante,
Numa das mĂŁos franzindo um lençol de cambraia!…
NinguĂ©m me prende assim, fĂșnebre, extravagante,
Quando arregaça e ondula a preguiçosa saia!IV
Ouso esperar, talvez, que o seu amor me acoite,
Mas nunca a fitarei duma maneira franca;
Traz o esplendor do Dia e a palidez da Noite,
Ă, como o Sol, dourada, e, como a Lua, branca!V
Pudesse-me eu prostar, num meditado impulso,
à gélida mulher bizarramente estranha,
E trĂȘmulo depor os lĂĄbios no seu pulso,
Entre a macia luva e o punho de bretanha!…VI
Cintila ao seu rosto a lucidez das jĂłias.
Ao encarar consigo a fantasia pasma;
Enfim Fenece o Dia
Enfim fenece o dia,
Enfim chega da noite o triste espanto,
E nĂŁo chega desta alma o doce encanta
Enfim fica triunfante a tirania,
Vencido o sofrimento,
Sem alĂvio meu mal, eu sem alento,
A sorte sem piedade,
Alegre a emulação, triste a vontade,
O gosto fenecido,
Eu infelice enfim, Lauro esquecido…
Quem viu mais dura sorte?
Tantos males, amor, para uma morte?
NĂŁo basta contra a vida
Esta ausĂȘncia cruel, esta partida?NĂŁo basta tanta dor? tanto receio?
Tanto cuidado, ai triste, e tanto enleio?
NĂŁo basta estar ausente,
Para perder a vida infelizmente?
Se não também, cruel, neste conflito
Me negas o socorro de um escrito?
Porque esta dor que a alma me penetra
NĂŁo ache o maior bem na menor letra,
Ai! bem fazes, amor, tira-me tudo!
NĂŁo hĂĄ alĂvio, nĂŁo, nĂŁo hĂĄ escudo,
Que a vida me defenda,
Tudo me falte, enfim, tudo me ofenda,
Tudo me tire a vida,
Pois eu a nĂŁo perdi na despedida.
A Jovem Cativa
(André Chenier)
â âRespeita a foice a espiga que desponta;
Sem receio ao lagar o tenro pĂąmpano
Bebe no estio as lĂĄgrimas da aurora;
Jovem e bela também sou; turvada
A hora presente de infortĂșnio e tĂ©dio
Seja embora: morrer nĂŁo quero ainda!De olhos secos o estĂłico abrace a morte;
Eu choro e espero; ao vendaval que ruge
Curvo e levanto a tĂmida cabeça.
Se hå dias maus, também os hå felizes!
Que mel nĂŁo deixa um travo de desgosto?
Que mar nĂŁo incha a um temporal desfeito?Tu, fecunda ilusĂŁo, vives comigo.
Pesa em vĂŁo sobre mim cĂĄrcere escuro,
Eu tenho, eu tenho as asas da esperança:
Escapa da prisĂŁo do algoz humano,
Nas campinas do céu, mais venturosa,
Mais viva canta e rompe a filomela.Deve acaso morrer ? TranqĂŒila durmo,
TranqĂŒila velo; e a fera do remorso
NĂŁo me perturba na vigĂlia ou sono;
Terno afago me ri nos olhos todos
Quando apareço, e as frontes abatidas
Quase reanima um desusado jĂșbilo.Desta bela jornada Ă© longe o termo.
Triste Padeço
Aves que o ar discorrei,
No vĂŽo as asas batendo,
E por vossas penas conta
Ăs minhas meu sentimento.Compadecidas ouvi
De minha dor os excessos,
Mas em dizer que Ă© saudade,
Digo o que posso dizer-vos.
Triste padeço, e ausente
Os golpes dos meus receios
Nas batalhas da distĂąncia,
Nos desafios do tempo.Nas violĂȘncias, do que choro,
Dos alĂvios desespero,
Que nĂŁo adormece a queixa,
Quando a desperta o desvelo.Esmoreceu a esperança
Nas dilaçÔes do desejo
Prognosticando a ruĂna
Frenético o pensamento.Se meu mal são sintomas,
Mortais ausĂȘncias, e zelos,
Era o remédio esquecer-me,
Se em mim houvera esquecimento.Mas se faz no meu cuidado
OperaçÔes o veneno,
Viva de senti-lo quem,
NĂŁo morre de padecĂȘ-lo.JĂĄ que morro, ingrata sorte,
Ăs mĂŁos da tua porfia,
Deixa-me inquirir um dia
A causa da minha morte:Se amor com impulso forte
Me rendeu, como me aparta
Do bem, que na alma retrata
Minha doce saudade,