Poemas sobre Vista

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Poemas de vista escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Segredo do Mar

A “Flor do Mar” avançando
Navegava, navegava,
Lá para onde se via
O vulto que ela buscava.

Era tão grande, tão grande
Que a vista toda tapava.

E Bartolomeu erguido
Aos marinheiros bradava
Que ninguém tivesse medo
Do gigante que ali estava.

E mais perto agora estão
Do que procurando vão!

Bartolomeu que viu?
Que descobriu o valente?
– Que o gigante era um penedo
que tinha forma de gente?

Que era dantes o mar? Um quarto escuro
Onde os meninos tinham medo de ir.
Agora o mar é livre e é seguro
E foi um português que o foi abrir.

Esqueço-me das Horas Transviadas

PASSOS DA CRUZ

Esqueço-me das horas transviadas
o Outono mora mágoas nos outeiros
E põe um roxo vago nos ribeiros…
Hóstia de assombro a alma, e toda estradas…

Aconteceu-me esta paisagem, fadas
De sepulcros a orgíaco… Trigueiros
Os céus da tua face, e os derradeiros
Tons do poente segredam nas arcadas…

No claustro seqüestrando a lucidez
Um espasmo apagado em ódio à ânsia
Põe dias de ilhas vistas do convés

No meu cansaço perdido entre os gelos
E a cor do outono é um funeral de apelos
Pela estrada da minha dissonância…

Mortalmente Compramos Ter Mais Vida que a Vida

A abelha que, voando, freme sobre
A colorida flor, e pousa, quase
Sem diferença dela
À vista que não olha,

Não mudou desde Cecrops. Só quem vive
Uma vida com ser que se conhece
Envelhece, distinto
Da espécie de que vive.

Ela é a mesma que outra que não ela.
Só nós — ó tempo, ó alma, ó vida, ó morte! —
Mortalmente compramos
Ter mais vida que a vida.

Por estes Campos sem Fim

Por estes campos sem fim,
onde a vista assim se estende,
que verei, triste de mim,
pois ver-vos se me defende?

Todos estes campos cheios
são de saudade e pesar,
que vem para me matar,
debaixo de céus alheios.
Em terra estranha e em ar,
mal sem meio e mal sem fim,
dor que ninguém não entende,
até quão longe se estende
o vosso poder em mim!

Vírgula

Eu menino às onze horas e trinta minutos
a procurar o dia em que não te fale
feito de resistências e ameaças — Este mundo
compreende tanto no meio em que vive
tanto no que devemos pensar.

A experiência o contrário da raiz originária aliás
demasiado formal para que se possa acreditar
no mais rigoroso sentido da palavra.

Tanta metafísica eu e tu
que já não acreditamos como antes
diferentes daquilo que entendem os filósofos
— constitui uma realidade
que não consegue dominar (nem ele próprio)
as forças primitivas
quando já se tem pretendido ordens à vida humana
em conflito com outras surge agora
a necessidade dos Oásis Perdidos.

E vistas assim as coisas fragmentariamente é certo
e a custo na imensidão da desordem
a que terão de ser constantemente arrancadas
— são da máxima importância as Velhas Concepções pois
a cada momento corremos grandes riscos
desconcertantes e de sinistra estranheza.

Resulta isto dum olhar rápido sobre a cidade desconhecida.
E abstraindo dos versos que neste poema se referem ao mundo humano
vemos que ninguém até hoje se apossou do homem
como o frágil véu que nos separa vedados e proibidos.

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Posfácio à Toca do Lobo

– Pai, vem da morte e vamos às perdizes.
Vejo a aurora, que tinge do seu rajo
de dente a dente a Serra de Soajo…
– Ciprestes, desatai-o das raízes!

– Este Inverno as perdizes estão em barda:
criaram-se as ninhadas sem granizo.
Vamos chumbar dos perdigões o guizo,
anda matar securas da espingarda.

A tua Holland… O animal de presa…
O azul brunido… Velha e como nova…
Bem a merecias a alegrar-te a cova.
Penou-te de saudades, com certeza.

Aqui a tens. Porque era ver-te, olhá-la,
sequer um dia que não fosse vê-la.
Olha deluz-se a derradeira estrela,
já folga a luz no lustra aqui da sala.

Trinta anos depois, caçar contigo,
e sempre conversando e à chalaça…
Mais que perdizes, hoje, melhor caça
É matar fomes do caçar antigo.

Ver-te sorrir à escapatória sonsa
da velha que não viu «perdiz nem chasco!»
E o Lorde a anunciá-la sob o fasco,
e tu lambendo o cigarrinho de onça…

Ó pai, se não vivias há trinta anos,
também há trinta eu não vivia,

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Já quasi até Morria

Já quasi até morria
C’os olhos nos da amada.
E ela que se sentia
Não menos abrasada:
– “Ai, caro Atfes! – dizia –
Não morras inda, espera
Que eu contigo morrer também quisera”
A ânsia com que acabava
A vida, Atfes, refreia,
E, enquanto a dilatava,
Morte maior o anseia.
Os olhos não tirava
Dos do ídolo querido,
Nos quais bebia o Néctar diluído.

Quando a gentil Pastora,
Sentindo já chegada
Do doce gosto a hora,
Com a vista perturbada
Disse, tremendo: – “Agora
Morre, que eu morro, amor”
– “E eu – disse ele – contigo”
Viram-se desta sorte
Os dois finos amantes
Mortos ambos de um tal corte;
E os golpes penetrantes
Desta casta de morte
Tanto lhe agradaram,
Que para mais morrer recuscitaram.

Não sei o quê desgosta

Não sei o quê desgosta
A minha alma doente.
Uma dor suposta
Dói-me realmente.

Como um barco absorto
Em se naufragar
À vista do porto
E num calmo mar,

Por meu ser me afundo,
Pra longe da vista
Durmo o incerto mundo.

Se Eu Morrer Novo

Se eu morrer novo,
Sem poder publicar livro nenhum,
Sem ver a cara que têm os meus versos em letra impressa,
Peço que, se se quiserem ralar por minha causa,
Que não se ralem.
Se assim aconteceu, assim está certo.

Mesmo que os meus versos nunca sejam impressos,
Eles lá terão a sua beleza, se forem belos.
Mas eles não podem ser belos e ficar por imprimir,
Porque as raízes podem estar debaixo da terra
Mas as flores florescem ao ar livre e à vista.
Tem que ser assim por força. Nada o pode impedir.

Se eu morrer muito novo, oiçam isto:
Nunca fui senão uma criança que brincava.
Fui gentio como o sol e a água,
De uma religião universal que só os homens não têm.
Fui feliz porque não pedi cousa nenhuma,
Nem procurei achar nada,
Nem achei que houvesse mais explicação
Que a palavra explicação não ter sentido nenhum.

Não desejei senão estar ao sol ou à chuva —
Ao sol quando havia sol
E à chuva quando estava chovendo (E nunca a outra cousa),

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A Vida Leve

Só o ter flores pela vista fora
Nas áleas largas dos jardins exatos
Basta para podermos
Achar a vida leve.

De todo o esforço seguremos quedas
As mãos, brincando, pra que nos não tome
Do pulso, e nos arraste.
E vivamos assim,

Buscando o mínimo de dor ou gozo,
Bebendo a goles os instantes frescos,
Translúcidos como água
Em taças detalhadas,

Da vida pálida levando apenas
As rosas breves, os sorrisos vagos,
E as rápidas carícias
Dos instantes volúveis.

Pouco tão pouco pesará nos braços
Com que, exilados das supernas luzes,
‘Scolherrnos do que fomos
O melhor pra lembrar

Quando, acabados pelas Parcas, formos,
Vultos solenes de repente antigos,
E cada vez mais sombras,
Ao encontro fatal

Do barco escuro no soturno rio,
E os nove abraços do horror estígio,
E o regaço insaciável
Da pátria de Plutão.

Mestre

Mestre, meu mestre querido,
Coração do meu corpo intelectual e inteiro!
Vida da origem da minha inspiração!
Mestre, que é feito de ti nesta forma de vida?

Não cuidaste se morrerias, se viverias, nem de ti nem de nada,
Alma abstracta e visual até aos ossos.
Atenção maravilhosa ao mundo exterior sempre múltiplo,
Refúgio das saudades de todos os deuses antigos,
Espírito humano da terra materna,
Flor acima do dilúvio da inteligência subjectiva…

Mestre, meu mestre!
Na angústia sensacionalista de todos os dias sentidos,
Na mágoa quotidiana das matemáticas de ser,
Eu, escrevo de tudo como um pó de todos os ventos,
Ergo as mãos para ti, que estás longe, tão longe de mim!

Meu mestre e meu guia!
A quem nenhuma coisa feriu, nem doeu, nem perturbou,
Seguro como um sol fazendo o seu dia involuntariamente,
Natural como um dia mostrando tudo,
Meu mestre, meu coração não aprendeu a tua serenidade.
Meu coração não aprendeu nada.
Meu coração não é nada,
Meu coração está perdido.

Mestre, só seria como tu se tivesse sido tu.

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O Pai

Terra de semente inculta e bravia,
terra onde não há esteiros ou caminhos,
sob o sol minha vida se alonga e estremece.

Pai, nada podem teus olhos doces,
como nada puderam as estrelas
que me abrasam os olhos e as faces.

Escureceu-me a vista o mal de amor
e na doce fonte do meu sonho
outra fonte tremida se reflecte.

Depois… Pergunta a Deus porque me deram
o que me deram e porque depois
conheci a solidão do céu e da terra.

Olha, minha juventude foi um puro
botão que ficou por rebentar e perde
a sua doçura de seiva e de sangue.

O sol que cai e cai eternamente
cansou-se de a beijar… E o outono.
Pai, nada podem teus olhos doces.

Escutarei de noite as tuas palavras:
… menino, meu menino…

E na noite imensa
com as feridas de ambos seguirei.

Tradução de Rui Lage

Acima da Verdade Estão os Deuses

Acima da verdade estão os deuses.
A nossa ciência é uma falhada cópia
Da certeza com que eles
Sabem que há o Universo.

Tudo é tudo, e mais alto estão os deuses,
Não pertence à ciência conhecê-los,
Mas adorar devemos
Seus vultos como às flores,

Porque visíveis à nossa alta vista,
São tão reais como reais as flores
E no seu calmo Olimpo
São outra Natureza.

A Manhã

A rosada manhã serena desce
Sobre as asas do Zéfiro orvalhadas;
Um cristalino aljôfar resplandece
Pelas serras de flores marchetadas;
Fugindo as lentas sombras dissipadas
Vão em sutil vapor, que se converte
Em transparentes nuvens prateadas.
Saúdam com sonora melodia
As doces aves na frondosa selva
O astro que benéfico alumia
Dos altos montes a florida relva;

Uma a cantiga exprime modulada
Com suave gorjeio, outra responde
Cos brandos silvos da garganta inflada,
Como os raios, partindo do horizonte,
Ferem, brilhando com diversas cores,
As claras águas de serena fonte.

Salve, benigna luz, que os resplandores,
Qual perene corrente cristalina,
Que de viçoso prado anima as flores,
Difundes da celeste azul campina,
Vivificando a lassa natureza,
Que no seio da noite tenebrosa
O moribundo sonho tinha presa.

Como alegre desperta e radiosa!
De encantos mil ornada se levanta,
Qual do festivo leito a nova esposa!
A mesma anosa, carcomida planta
Co matutino orvalho reverdece.
A úmida cabeça ergue viçosa
A flor, que rociada resplandece,
E risonha,

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Inutilmente Parecemos Grandes

O mar jaz; gemem em segredo os ventos
Em Eolo cativos;
Só com as pontas do tridente as vastas
Águas franze Netuno;
E a praia é alva e cheia de pequenos
Brilhos sob o sol claro.
Inutilmente parecemos grandes.
Nada, no alheio mundo,
Nossa vista grandeza reconhece
Ou com razão nos serve.
Se aqui de um manso mar meu fundo indício
Três ondas o apagam,
Que me fará o mar que na atra praia
Ecoa de Saturno?

Ilumina-se a Igreja por Dentro da Chuva

Ilumina-se a igreja por dentro da chuva deste dia,
E cada vela que se acende é mais chuva a bater na vidraça…

Alegra-me ouvir a chuva porque ela é o templo estar aceso,
E as vidraças da igreja vistas de fora são o som da chuva ouvido por dentro …

O esplendor do altar-mor é o eu não poder quase ver os montes
Através da chuva que é ouro tão solene na toalha do altar…

Soa o canto do coro, latino e vento a sacudir-me a vidraça
E sente-se chiar a água no fato de haver coro…

A missa é um automóvel que passa
Através dos fiéis que se ajoelham em hoje ser um dia triste…
Súbito vento sacode em esplendor maior
A festa da catedral e o ruído da chuva absorve tudo
Até só se ouvir a voz do padre água perder-se ao longe
Com o som de rodas de automóvel…

E apagam-se as luzes da igreja
Na chuva que cessa …

O Sonho

Amor querido, por nada menos que tu
Teria eu interrompido este sonho feliz:
Era um tema
Para a razão, demasiado forte para fantasia.
Portanto, sabiamente, me acordaste; porém
O meu sonho não terminou, continuou contigo.
És tão verdadeira que bastam os pensamentos de ti
Para tornar sonhos realidade, fábulas em história.
Vem a meus braços, pois se pensaste ser melhor
Que não sonhasse todo o meu sonho, concretizemos o resto.

Como o relâmpago, ou a luz da vela,
Teus olhos, e não o teu ruído, me acordaram;
Porém pensei que eras
(Tu que amas a verdade) um Anjo — à primeira vista.
Mas quando vi que vias o meu coração
E os meus pensamentos, para além da arte do anjo,
Como sabias do meu sonho, como sabias quando
O excesso de gozo me acordaria, e então vieste,
Devo confessar que no mínimo, seria
Ultrajante, pensar-te outra coisa que não tu.

Vindo e ficando mostrou-me que tu és tu.
Mas o levantares-te faz-me duvidar, e temo agora
Que tu já não sejas tu.
E fraco o amor quando o medo é tão forte como ele;

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Paixão

Supõe que de uma praia, rocha ou monte,
Com essa vista embaciada e turva
Que dá aos olhos entranhável dor,
Tinhas podido ver transpor a curva
Pouco a pouco do líquido horizonte
A barca saudosa que levasse
Aquele a quem primeiro uniste a face
E o teu primeiro amor!

Depois, que toda mágoa e saudade,
Da mesma rocha ou alcantil deserto,
Olhando avidamente para o mar…
Vias na solitária imensidade
Vagas ficções de um pensamento incerto
Surgir das ondas, desfazer-se em espuma,
Não alvejando nunca vela alguma…
E sempre a suspirar!

Até que à luz de uma intuição sublime
De alma arrancavas o gemido extremo
De saudade, desespero e dor!…
Pois é assim que eu sofro, assim que eu gemo,
Que nuvem negra o coração me oprime,
Nuvem de mágoa, nuvem de ciúme,
Em te não vendo à hora do costume…
Meu anjo e meu amor!

O Fogo no Canavial

A imagem mais viva do inferno.
Eis o fogo em todos seus vícios:
eis a ópera, o ódio, o energúmeno,
a voz rouca de fera em cio.

E contagioso, como outrora
foi, e hoje não é mais, o inferno:
ele se catapulta, exporta,
em brulotes de curso aéreo,

em petardos que se disparam
sem pontaria, intransitivos;
mas que queimada a palha dormem,
bêbados, curtindo seu litro.

(O inferno foi fogo de vista,
ou de palha, queimou as saias:
deixou nua a perna da cana,
despiu-a, mas sem deflorá-la).

Este Seu Escasso Campo

Este, seu ‘scasso campo ora lavrando,
Ora solene, olhando-o com a vista
De quem a um filho olha, goza incerto
A não-pensada vida.
Das fingidas fronteiras a mudança
O arado lhe não tolhe, nem o empece
Per que concílios se o destino rege
Dos povos pacientes.
Pouco mais no presente do futuro
Que as ervas que arrancou, seguro vive
A antiga vida que não torna, e fica,
Filhos, diversa e sua.