Poesia Depois da Chuva
A Maria Guiomar
Depois da chuva o Sol – a graça.
Oh! a terra molhada iluminada!
E os regos de água atravessando a praça
– luz a fluir, num fluir imperceptĂvel quase.Canta, contente, um pássaro qualquer.
Logo a seguir, nos ramos nus, esvoaça.
O fundo Ă© branco – cal fresquinha no casario da praça.Guizos, rodas rodando, vozes claras no ar.
Tão alegre este Sol! Há Deus. (Tivera-O eu negado
antes do Sol, nĂŁo duvidava agora.)
Ă“ Tarde virgem, Senhora Aparecida! Ă“ Tarde igual
Ă s manhĂŁs do princĂpio!E tu passaste, flor dos olhos pretos que eu admiro.
Grácil, tĂŁo grácil!… Pura imagem da Tarde…
Flor levada nas águas, mansamente…(FluĂa a luz, num fluir imperceptĂvel quase…)
Citações sobre Regos
4 resultadosNa Tua Voz, IrmĂŁo
Estavam sentados e nĂŁo falavam. Cada um olhava para um lado que nĂŁo via. Atrás dos rostos tristes, cismavam. Pensando, MoisĂ©s dizia palavras ao irmĂŁo, esperançado de que ele as ouvisse; no pensamento, dizia será um instante e trará a solidĂŁo. Pela primeira vez, gritaremos o nome um do outro. Já reparaste?, nunca precisámos de nos chamar. NĂŁo sei como Ă© o meu nome na tua voz. Na tua voz, irmĂŁo, irmĂŁo. NĂŁo sei como Ă© o teu nome na minha voz. Pela primeira vez, gritaremos o nome um do outro, e o desespero será a antecâmara de uma dor triste a que nos habituaremos, como se habitua um homem sem coração ao espaço negro no peito. Viveste sempre na minha vida, e eu estive sempre contigo quando sorriste. Hoje, a solidĂŁo. Desapareceremos um do outro, deixaremos de ser nĂłs para sermos sĂł tu e sĂł eu. Mas nĂŁo esqueceremos. E lembrarmo-nos será o maior sofrimento, recordarmos o que fomos onde estivermos e nĂŁo podermos ser mais nada nesse dia. Lembrarmo-nos de quando acordávamos e olhávamos um para o outro, pois tĂnhamos acordado ao mesmo tempo e tĂnhamos ao mesmo tempo pensado em ver-nos. Lembrarmo-nos de falar na nossa maneira de falar,
Corpo de Mulher…
Corpo de mulher, brancas colinas, coxas
[brancas,
pareces-te com o mundo na tua atitude de
[entrega.
O meu corpo de lavrador selvagem escava em ti
e faz saltar o filho do mais fundo da terra.Fui sĂł como um tĂşnel. De mim fugiam os
[pássaros,
e em mim a noite forçava a sua invasão
[poderosa.
Para sobreviver forjei-te como uma arma,
como uma flecha no meu arco, como uma pedra
na minha funda.Mas desce a hora da vingança, e eu amo-te.
Corpo de pele, de musgo, de leite ávido e firme.
Ah os copos do peito! Ah os olhos de ausĂŞncia!
Ah as rosas do pĂşbis! Ah a tua voz lenta e
[triste!Corpo de mulher minha, persistirei na tua graça.
Minha sede, minha ânsia sem limite, meu
[caminho indeciso!
Escuros regos onde a sede eterna continua,
e a fadiga continua, e a dor infinita.
Chuva E Sol
Agrada Ă vista e Ă fantasia agrada
Ver-te, através do prisma de diamantes
Da chuva, assim ferida e atravessada
Do sol pelos venábulos radiantes…Vais e molhas-te, embora os pĂ©s levantes:
– Par de pombos, que a ponta delicada
Dos bicos metem nágua e, doidejantes,
Bebem nos regos cheios da calçada…Vais, e, apesar do guarda-chuva aberto,
Borrifando-te colmam-te as goteiras
De pérolas o manto mal coberto;E estrelas mil cravejam-te, fagueiras,
Estrelas falsas, mas que assim de perto,
Rutilam tanto, como as verdadeiras…