Rebelado
Ri tua face um riso acerbo e doente,
Que fere, ao mesmo tempo que contrista…
Riso de ateu e riso de budista
Gelado no Nirvana impenitente.Flor de sangue, talvez, e flor dolente
De uma paixão espiritual de artista,
Flor de Pecado sentimentalista
Sangrando em riso desdenhosamente.Da alma sombria de tranqüilo asceta
Bebeste, entanto, a morbidez secreta
Que a febre das insânias adormece.Mas no teu lábio convulsivo e mudo
Mesmo até riem, com desdéns de tudo,
As sílabas simbólicas da Prece!
Sonetos sobre Artista de Cruz e Souza
5 resultadosDe Mayseder Gentil O Vulto Ingente
De Mayseder gentil o vulto ingente
De Corelli, de Spohr e de Nardini,
De Ole Bull supernal, de Veracini
Inspirados por Deus c’o plectro ardente;Dessa lira febril, áurea, potente
Do artista sem par, de Paganini;
De Viotti dinal, do herói Tardini,
De Lafont, de Baillot, Eck e Laurenti:Sois rival feliz! e nesse crânio
Há em jorros, oh céus! extravasando
O ardor musical, o ardor titâneo…Já bem cedo, veloz, ides galgando
Lá da glória os degraus, o supedâneo
Sobre um trono de luz rindo e cantando.
Amor
Nas largas mutações perpétuas do universo
O amor é sempre o vinho enérgico, irritante…
Um lago de luar nervoso e palpitante…
Um sol dentro de tudo altivamente imerso.Não há para o amor ridículos preâmbulos,
Nem mesmo as convenções as mais superiores;
E vamos pela vida assim como os noctâmbulos
à fresca exalação salúbrica das flores…E somos uns completos, célebres artistas
Na obra racional do amor — na heroicidade,
Com essa intrepidez dos sábios transformistas.Cumprimos uma lei que a seiva nos dirige
E amamos com vigor e com vitalidade,
A cor, os tons, a luz que a natureza exige!…
O Grande Momento
Inicia-te, enfim, Alma imprevista,
Entra no seio dos Iniciados.
Esperam-te de luz maravilhados
Os Dons que vão te consagrar Artista.Toda uma Esfera te deslumbra a vista,
Os ativos sentidos requintados.
Céus e mais céus e céus transfigurados
Abrem-te as portas da imortal Conquista.Eis o grande Momento prodigioso
Para entrares sereno e majestoso
Num mundo estranho d’esplendor sidéreo.Borboleta de sol, surge da lesma…
Oh! vai, entra na posse de ti mesma,
Quebra os selos augustos do Mistério!
Êxtase De Mármore
À grande atriz Apolônia.
O mármore profundo e cinzelado
De uma estátua viril, deliciosa;
Essa pedra que geme, anseia e goza
Num misticismo altíssimo e calado;Essa pedra imortal — campo rasgado
A comoção mais íntima e nervosa
Da alma do artista, de um frescor de rosa,
Feita do azul de um céu muito azulado;Se te visse o clarão que pelos ombros
Teus, rola, cai, nos múltiplos assombros
Da Arte sonora, plena de harmonia;O mármore feliz que é muito artista
Também — como tu és — à tua vista
De humildade e ciúme, coraria!