Amiga
Deixa-me ser a tua amiga, Amor,
A tua amiga só, já que não queres
Que pelo teu amor seja a melhor,
A mais triste de todas as mulheres.Que só, de ti, me venha mágoa e dor
O que me importa a mim?! O que quiseres
É sempre um sonho bom! Seja o que for,
Bendito sejas tu por mo dizeres!Beija-me as mĂŁos, Amor, devagarinho…
como se os dois nascĂŞssemos irmĂŁos,
Aves cantando, ao sol, no mesmo ninho…Beija-mas bem!…Que fantasia louca
Guardar assim, fechados, nestas mĂŁos,
Os beijos que sonhei prá minha boca!…
Sonetos sobre Aves de Florbela Espanca
5 resultadosNeurastenia
Sinto hoje a alma cheia de tristeza!
Um sino dobra em mim Ave-Marias!
Lá fora, a chuva, brancas mãos esguias,
Faz na vidraça rendas de Veneza…O vento desgrenhado chora e reza
Por alma dos que estĂŁo nas agonias!
E flocos de neve, aves brancas, frias,
Batem as asas pela Natureza…Chuva…tenho tristeza! Mas porquĂŞ?!
Vento…tenho saudades! Mas de quĂŞ?!
Ă“ neve que destino triste o nosso!Ă“ chuva! Ă“ vento! Ă“ neve! Que tortura!
Gritem ao mundo inteiro esta amargura,
Digam isto que sinto que eu nĂŁo posso !!…
Suavidade
Poisa a tua cabeça dolorida
TĂŁo cheia de quimeras, de ideal
Sobre o regaço brando e maternal
Da tua doce IrmĂŁ compadecida.Hás de contar-me nessa voz tĂŁo q’rida
Tua dor infantil e irreal,
E eu, pra te consolar, direi o mal
Que Ă minha alma profunda fez a Vida.E hás de adormecer nos meus joelhos…
E os meus dedos enrugados, velhos,
HĂŁo de fazer-se leves e suaves…HĂŁo de poisar-se num fervor de crente,
Rosas brancas tombando docemente
Sobre o teu rosto, como penas d’aves…
Sou Eu!
Ă€ minha ilustre camarada Laura haves
Pelos campos em fora, pelos combros,
Pelos montes que embalam a manhĂŁ,
Largo os meus rubros sonhos de pagĂŁ,
Enquanto as aves poisam nos meus ombros…Em vĂŁo me sepultaram entre escombros
De catedrais duma escultura vĂŁ!
Olha-me o loiro sol tonto de assombros,
as nuvens, a chorar, chamam-me irmĂŁ!Ecos longĂnquos de ondas… de universos..
Ecos dum Mundo… dum distante AlĂ©m,
Donde eu trouxe a magia dos meus versos!Sou eu! Sou eu! A que nas mĂŁos ansiosas
Prendeu da vida, assim como ninguém,
Os maus espinhos sem tocar nas rosas!
Da Minha Janela
Mar alto! Ondas quebradas e vencidas
Num soluçar aflito, murmurado…
VĂ´o de gaivotas, leve, imaculado,
Como neves nos pĂncaros nascidas!Sol! Ave a tombar, asas já feridas,
Batendo ainda num arfar pausado…
Ă“ meu doce poente torturado
Rezo-te em mim, chorando, mãos erguidas!Meu verso de Samain cheio de graça,
Inda não és clarão já és luar
Como um branco lilás que se desfaça!Amor! Teu coração trago-o no peito…
Pulsa dentro de mim como este mar
Num beijo eterno, assim, nunca desfeito!…