Sonetos sobre Caos de Cruz e Souza

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Sonetos de caos de Cruz e Souza. Leia este e outros sonetos de Cruz e Souza em Poetris.

O Anjo Da Redenção

Soberbo, branco, etereamente puro,
Na mão de neve um grande facho aceso,
Nas nevroses astrais dos sóis surpreso,
Das trevas deslumbrando o caos escuro.

Portas de bronze e pedra, o horrendo muro
Da masmorra mortal onde estás preso
Desce, penetra o Arcanjo branco, ileso
Do ódio bifronte, torso, torvo e duro.

Maravilhas nos olhos e prodígios
Nos olhos, chega dos azuis litígios
Desce à tua caverna de bandido.

E sereno, agitando o estranho facho,
Põe-te aos pés e a cabeça, de alto a baixo,
Auréolas imortais de Redimido!

Nerah

(Inspirado no elegante conto de Virgílio Várzea)
A Vítor Lobato

Nerah não brinca mais, não dança mais. — E agora
Que vão-se apropinquando os tempos invernosos,
Nerah traz uns receios tímidos, nervosos,
De quem teme mudar-se em noite, sendo aurora.

Seus sonhos de cristal, translúcidos, antigos
Se vão embora, embora à vinda dos invernos,
Seguindo em debandada os úmidos galernos —
— lembrando um roto bando informe de mendigos.

Não canta o sabiá que triste na gaiola,
Parece, com o olhar, pedir-lhe a casta esmola
De um riso — aquela flor que esvai-se, branca e fria.

Em tudo a fina seta aguda de aflições!
Na própria atmosfera um caos de interjeições!
Em tudo uma mortalha, em tudo uma agonia.

Fruto Envelhecido

Do coração no envelhecido fruto
É só desolação e é só tortura.
O frio soluçante da amargura
Envolve o coração num fundo luto.

O fantasma da Dor pérfido e astuto
Caminha junto a toda a criatura.
A alma por mais feliz e por mais pura
Tem de sofrer o esmagamento bruto.

É preciso humildade, é necessário
Fazer do coração branco sacrário
E a hóstia elevar do Sentimento eterno.

Em tudo derramar o amor profundo,
Derramar o perdão no caos do mundo,
Sorrir ao céu e bendizer o Inferno!

Demônios

A língua vil, ignívoma, purpúrea
Dos pecados mortais bava e braveja,
Com os seres impoluídos mercadeja,
Mordendo-os fundo injúria por injúria.

É um grito infernal de atroz luxúria,
Dor de danados, dor do Caos que almeja
A toda alma serena que viceja,
Só fúria, fúria, fúria, fúria, fúria!

São pecados mortais feitos hirsutos
Demônios maus que os venenosos frutos
Morderam com volúpia de quem ama…

Vermes da Inveja, a lesma verde e oleosa,
Anões da Dor torcida e cancerosa,
Abortos de almas a sangrar na lama!

Alucinação

Ó solidão do Mar, ó amargor das vagas,
Ondas em convulsões, ondas em rebeldia,
Desespero do Mar, furiosa ventania,
Boca em fel dos tritões engasgada de pragas.

Velhas chagas do sol, ensangüentadas chagas
De ocasos purpurais de atroz melancolia,
Luas tristes, fatais, da atra mudez sombria
Da trágica ruína em vastidões pressagas.

Para onde tudo vai, para onde tudo voa,
Sumido, confundido, esboroado, à-toa,
No caos tremendo e nu dos tempo a rolar?

Que Nirvana genial há de engolir tudo isto –
– Mundos de Inferno e Céu, de Judas e de cristo,
Luas, chagas do sol e turbilhões do Mar?!