Sonetos sobre Imortais

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Sonetos de imortais escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Camões IV

Um dia, junto Ă  foz de brando e amigo
Rio de estranhas gentes habitado,
Pelos mares aspérrimos levado,
Salvaste o livro que viveu contigo.

E esse que foi Ă s ondas arrancado,
Já livre agora do mortal perigo,
Serve de arca imortal, de eterno abrigo,
Não só a ti, mas ao teu berço amado.

Assim, um homem sĂł, naquele dia,
Naquele escasso ponto do universo,
Língua, história, nação, armas, poesia,

Salva das frias mĂŁos do tempo adverso.
E tudo aquilo agora o desafia.
E tão sublime preço cabe em verso.

To Sleep, To Dream

Dormir, sonhar — o poeta inglĂŞs o disse…
Ah! Mas se a gente nunca mais sonhasse
Ah! Mas se a gente nunca mais dormisse
E a ilusões não mais acalentasse?

E o que importava que o futuro risse
De um visionário que tal cousa ideasse;
Se nĂŁo seria o Ăşnico que abrisse
Uma exceção da vida humana Ă  face?…

Se os imortais filĂłsofos modernos
Que derrubaram todos os infernos,
Que destruĂ­ram toda a teogonia.

Orientando a triste humanidade,
Deixaram, mais e mais, a piedade
Inteiramente desolada e fria?

MarĂ­lia De Dirceu

Soneto 8

Nascer no berço da maior grandeza,
De palmas e de louros rodeado,
Deve-se aos grandes pais, ao tronco honrado,
Que ilustra deste longe a natureza.

Se porém muito mais se adora e preza
O Dom que o nobre sangue traz herdado,
Pela prĂłpria virtude sustentado,
Feliz o objeto da presente empresa.

De mil herĂłis, no Tejo vencedores,
Um ramo nasce, um ramo que a memĂłria
Faz imortal de seus progenitores.

Eu leio em vaticĂ­nio a sua histĂłria:
Une Francisco, a par de seus maiores
Ao herdado esplendor a prĂłpria glĂłria.

O Assinalado

Tu és o louco da imortal loucura,
O louco da loucura mais suprema.
A Terra Ă© sempre a tua negra algema,
Prende-te nela a extrema Desventura.

Mas essa mesma algema de amargura,
Mas essa mesma Desventura extrema
Faz que tu’alma suplicando gema
E rebente em estrelas de ternura.

Tu és o Poeta, o grande Assinalado
Que povoas o mundo despovoado,
De belezas etrenas, pouco a pouco…

Na Natureza prodigiosa e rica
Toda a audácia dos nervos justifica
Os teus espasmos imortais de louco!

Almas Indecisas

Almas ansiosas, trĂŞmulas, inquietas,
Fugitivas abelhas delicadas
Das colméias de luz das alvoradas,
Almas de melancĂłlicos poetas.

Que dor fatal e que emoções secretas
vos tornam sempre assim desconsoladas,
Na pungĂŞncia de todas as espadas,
Na dolĂŞncia de todos os ascetas?!

Nessa esfera em que andais, sempre indecisa,
Que tormento cruel vos nirvaniza,
Que agonias titânicas são estas?!

Por que nĂŁo vindes, Almas imprevistas,
Para a missĂŁo das lĂ­mpidas Conquistas
E das augustas, imortais Promessas?!

Ă€ Fragilidade da Vida Humana

Esse baixel nas praias derrotado
Foi nas ondas Narciso presumido;
Esse farol nos céus escurecido
Foi do monte libré, gala do prado.

Esse nácar em cinzas desatado
Foi vistoso pavĂŁo de Abril florido;
Esse estio em vesĂşvios encendido
Foi Zéfiro suave em doce agrado.

Se a nau, o sol, a rosa, a Primavera
Estrago, eclipse, cinza, ardor cruel
Sentem nos auges de um alento vago,

Olha, cego imortal, e considera
Que és rosa, primavera, sol, baixel,
Para ser cinza, eclipse, incĂŞndio, estrago.

Alma Solitária

Ă“ alma doce e triste e palpitante!
Que cítaras soluçam solitárias
Pelas Regiões longínquas, visionárias
Do teu Sonho secreto e fascinante!

Quantas zonas de luz purificante,
Quantos silêncios, quantas sombras várias
De esferas imortais imaginárias
Falam contigo, Ăł Alma cativante!

Que chama acende os teus farĂłis noturnos
E veste os teus mistériosa taciturnos
Dos esplendores do arco de aliança?

Por que és assim, melancolicamente,
Como um arcanjo infante, adolescente,
Esquecido nos vales da Esperança?!

Floresce!

Floresce, vive para a Natureza,
Para o Amor imortal, largo e profundo.
O Bem supremo de esquecer o mundo
Reside nessa lĂ­mpida grandeza.

Floresce para a FĂ©, para a Beleza
Da Luz que Ă© como um vasto mar sem fundo,
Amplo, inflamado, mágico, fecundo,
De ondas de resplendor e de pureza.

Andas em vĂŁo na Terra, apodrecendo
Ă€ toa pelas trevas, esquecendo
A Natureza e os seus aspectos calmos.

Diante da luz que a Natureza encerra
Andas a apodrecer por sobre a Terra,
Antes de apodrecer nos sete palmos!

Horas De Sombra

Horas de sombra, de silĂŞncio amigo
Quando há em tudo o encanto da humildade
E que o anjo branco e belo da saudade
Roga por nĂłs o seu perfil antigo.

Horas que o coração não vê perigo
De gozar, de sentir com liberdade…
Horas da asa imortal da Eternidade
Aberta sobre tumular jazigo.

Horas da compaixĂŁo e da clemĂŞncia,
Dos segredos sagrados da existĂŞncia,
De sombras de perdĂŁo sempre benditas.

Horas fecundas, de mistério casto,
Quando dos céus desce, profundo e vasto,
O repouso das almas infinitas.

Metempsicose

Agora, já que apodreceu a argila
Do teu corpo divino e sacrossanto;
Que embalsamaram de magoado pranto
A tua carne, na mudez tranqĂĽila,

Agora, que nos Céus, talvez, se asila
Aquela graça e luminoso encanto
De virginal e pálido amaranto
Entre a Harmonia que nos Céus desfila.

Que da morte o estupor macabro e feio
Congelou as magnĂłlias do teu seio,
Por entre catalĂ©pticas visões…

Surge, Bela das Belas, na Beleza
Do transcendentalismo da Pureza,
Nas brancas, imortais Ressurreições!

Corpo

VII

Pompas e pompas, pompas soberanas
Majestade serene da escultura
A chama da suprema formosura,
A opulĂŞncia das pĂşrpuras romanas.

As formas imortais, claras e ufanas,
Da graça grega, da beleza pura,
Resplendem na arcangélica brancura
Desse teu corpo de emoções profanas.

Cantam as infinitas nostalgias,
Os mistérios do Amor, melancolias,
Todo o perfume de eras apagadas…

E as águias da paixão, brancas, radiantes,
Voam, revoam, de asas palpitantes,
No esplendor do teu corpo arrebatadas!

Supremo Desejo

Eternas, imortais origens vivas
Da Luz, do Aroma, segredantes vozes
Do mar e luares de contemplativas,
Vagas visões volĂşpicas, velozes…

Aladas alegrias sugestivas
De asa radiante e branca de albornozes,
Tribos gloriosas, fulgidas, altivas,
De condores e de águias e albatrozes…

Espiritualizai nos Astros louros,
Do sol entre os clarões imorredouros
Toda esta dor que na minh’alma clama…

Quero vĂŞ-la subir, ficar cantando
Na chama das Estrelas, dardejando
Nas luminosas sensações da chama.

O Anjo Da Redenção

Soberbo, branco, etereamente puro,
Na mĂŁo de neve um grande facho aceso,
Nas nevroses astrais dos sĂłis surpreso,
Das trevas deslumbrando o caos escuro.

Portas de bronze e pedra, o horrendo muro
Da masmorra mortal onde estás preso
Desce, penetra o Arcanjo branco, ileso
Do Ăłdio bifronte, torso, torvo e duro.

Maravilhas nos olhos e prodĂ­gios
Nos olhos, chega dos azuis litĂ­gios
Desce Ă  tua caverna de bandido.

E sereno, agitando o estranho facho,
Põe-te aos pés e a cabeça, de alto a baixo,
Auréolas imortais de Redimido!

EspĂ­rito Imortal

EspĂ­rito imortal que me fecundas
Com a chama dos viris entusiasmos,
Que transformas em gládios os sarcasmos
Para punir as multidões profundas!

Ă“ alma que transbordas, que me inundas
De brilhos, de ecos, de emoções, de pasmos
E fazes acordar de atros marasmos
Minh’alma, em tĂ©dios por charnecas fundas.

Força genial e sacrossanta e augusta,
Divino Alerta para o Esquecimento,
Voz companheira, carinhosa e justa.

Tens minha MĂŁo, num doce movimento,
Sobre essa Mão angélica e robusta,
EspĂ­rito imortal do Sentimento!

Sorriso Interior

O ser que Ă© ser e que jamais vacila
Nas guerras imortais entra sem susto,
Leva consigo esse brasĂŁo augusto
Do grande amor, da nobre fé tranqüila.

Os abismos carnais da triste argila
Ele os vence sem ânsias e sem custo…
Fica sereno, num sorriso justo,
Enquanto tudo em derredor oscila.

Ondas interiores de grandeza
DĂŁo-lhe essa glĂłria em frente Ă  Natureza,
Esse esplendor, todo esse largo eflĂşvio.

O ser que Ă© ser tranforma tudo em flores…
E para ironizar as prĂłprias dores
Canta por entre as águas do Dilúvio!

Ser Dos Seres

No teu ser de silĂŞncio e d’esperança
A doce luz das Amplidões flameja.
Ele sente, ele aspira, ele deseja
A grande zona da imortal Bonança.

Pelos largos espaços se balança
Como a estrela infinita que dardeja,
Sempre isento da Treva que troveja
O clamor inflamado da Vingança.

Por entre enlevos e deslumbramentos
Entra na Força astral dos Sentimentos
E do Poder nos mágicos poderes.

E traz, embora os íntimos cansaços,
Ânsias secretas para abrir os braços
Na generosa comunhĂŁo dos Seres!

Imortal Atitude

Abre os olhos Ă  Vida e fica mudo!
Oh! Basta crer indefinidamente
Para ficar iluminado tudo
De uma luz imortal e transcendente.

Crer Ă© sentir, como secreto escudo,
A alma risonha, lĂşcida, vidente…
E abandonar o sujo deus cornudo,
O sátiro da Carne impenitente.

Abandonar os lânguidos rugidos,
O infinito gemido dos gemidos
Que vai no lodo a carne chafurdando.

Erguer os olhos, levantar os braços
Para o eterno Silêncio dos Espaços
E no SilĂŞncio emudecer olhando…

Jovens Filhos Da Pátria, Em Vossos Peitos

Jovens filhos da pátria, em vossos peitos
Depõe a pátria seu porvir de glória:
Revolve sonhos de imortal de imortal memĂłria,
Adejando inquieta em vossos leitos.

De vĂłs espera sublimados feitos,
P’ra ornar de palmas a futura histĂłria;
Espera em vĂłs, como espera em DĂłria,
DĂłria tĂŁo jovem, como vĂłs, nos pleitos.

Atletas do porvir, marchai seguros
Da liberdade Ă  festa sacrossanta,
A levantar-lhe mais altivos muros.

Marchai: – que aos livres nem o cĂ©u suplanta,
E o Ă­ndio do Brasil, sem elmos duros,
No olhar sòmente os déspotas espanta.

Olvido

Desce por fim sobre o meu coração
O olvido. Irrevocável. Absoluto.
Envolve-o grave como véu de luto.
Podes, corpo, ir dormir no teu caixĂŁo.

A fronte já sem rugas, distendidas
As feições, na imortal serenidade,
Dorme enfim sem desejo e sem saudade
Das coisas nĂŁo logradas ou perdidas.

O barro que em quimera modelaste
Quebrou-se-te nas mĂŁos. Viça uma flor…
Pões-lhe o dedo, ei-la murcha sobre a haste…

Ias andar, sempre fugia o chĂŁo,
Até que desvairavas, do terror.
Corria-te um suor, de inquietação…

Viverás, que da Pena a Força Emana

Ou pra fazer-te o epitáfio vivo,
ou vives mais e a terra me apodrece.
Tua memĂłria a morte deste arquivo
nĂŁo tira, mas de mim o resto esquece.

Aqui terá o teu nome imortal gala,
indo eu, hei-de ficar do mundo oculto,
sĂł pode dar-me a terra comum vala,
no olhar dos homens tu serás sepulto.

Meus versos monumento te serĂŁo
que hĂŁo-de ler e reler olhos a vir
e as lĂ­nguas a haver repetirĂŁo

o que és, quando já ninguém respire.
Viverás, que da pena a força emana,
onde o sopro mais sopra, em boca humana.