Paisagem Ăšnica
Olhas-me tu: e nos teus olhos vejo
Que eu sou apenas quem se vĂŞ: assim
Tu tanto me entregaste ao teu desejo
Que Ă© nos teus olhos que eu me vejo a mim.Em ti, que bem meu corpo se acomoda!
Ah! quanto amor por os teus olhos arde!
Contigo sou? — perco a paisagem toda…
Longe de ti? — sou como um dobre Ă tarde…Adeuses aos casais dessas Marias
Em cuja graça o meu olhar flutua,
Tudo o que amei ao teu amor o entrego.Choupos com ar de velhas Senhorias,
Castelo moiro donde nasce a Lua,
E apenas tu, a tudo o mais sou cego.
Sonetos Exclamativos de Afonso Duarte
5 resultadosHora MĂstica
Noite caindo … CĂ©u de fogo e flores.
Voz de CrepĂşsculo exalando cores,
O céu vai cheio de Deus e de harmonia.
SilĂŞncio … Eis-me rezando aos fins do dia.NĂ©voa de luz criando imagens na água,
Nome das águas esculpindo os céus,
Tarde aos relevos húmidos de frágua,
Boca da noite, eis-me rezando a Deus.Eis-me entoando, a voz de cinza e ouro,
— Oh, cores na água vindo às mãos em branco! —
Minha Ăłpera de Sol ao Ăşltimo arranco.E, oh! hora mĂstica em que o olhar abraso,
— Sol expirando aos Pórticos do Ocaso! —
Dobra em meu peito um oceano em coro.
Noite do Roubo
A quem foram roubar os pobres trapos:
A mim, que sou humilde pobrezinho?
Olhem bem que o valor desses farrapos
Está em ter minha avó fiado o linho.Ó rocas a fiar, contos de fadas!
Eu tinha-lhes amor e a simpatia
Que vem das saudades de algum dia,
Longe, das velhas noites seroadas.Bragais de minha casa, e as roupas feitas
Por mĂŁos de minha mĂŁe, muito me assusta
Que os tomassem perversas mĂŁos suspeitas.Ah! mĂŁos do furto, olhai, trazei-me Ă justa
Os meus linhos — suor dumas colheitas —
E amor dos meus que a mim muito me custa.
Amor
Por teu ventre começa a minha vida,
Por teus olhos a estrela que me guia.
Amor, que Deus te salve! — Ave-Maria
Cheia de Graça ó Bem-Aparecida.Por meu e por teu verbo de harmonia
Se fará eterna origem comovida
De outros frutos de Amor! — Ave-Maria,
Senhora da minh’alma apetecida.E meu sangue amoroso e produtivo
Se fará carne e espĂrito fecundo
Ă€ tua imagem noutro corpo vivo.E assim ambos, Amor, iremos ser
Seio da vida originando o mundo
Por teu ventre bendito de Mulher.
Natal
Turvou-se de penumbra o dia cedo;
Nem o sol apertou no meu beiral!
Que longas horas de Jesus! Natal…
E o cepo a arder nas cinzas do brasedo…E o lar da casa, os corações aos dobres,
É um painel a fogo em seu costume!
Que lindos versos bĂblicos, ao lume,
Plo doce PrĂncipe cristĂŁo dos pobres!Fulvas figuras pra esculpir em barro:
Ă€ luz da lenha, em rubro tom bizarro,
Sou em Presépio com meus pais e irmãosE junto às brasas, os meus olhos postos
Nesta evangélica expressão de rostos,
Ergo em graças a Deus as minhas mãos.