Sonetos sobre Ideias de Cruz e Souza

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Natureza

Aos Poetas

Tudo por ti resplende e se constela,
Tudo por ti, suavĂ­ssimo, flameja;
És o pulmão da racional peleja,
Sempre viril, consoladora e bela.

Teu coração de pérolas se estrela,
E o bom falerno dás a quem deseja
Vigor, saúde a crença que floreja,
Que as expansões do cérebro revela.

Toda essa luz que bebe-se de um hausto
Nos livros sĂŁos, todo esse enorme fausto
Vem das verduras brandas que reluzem!

Esse da idéia esplêndido eletrismo,
O forte, o grande, audaz psicologismo,
Os organismos naturais produzem…

Ă€ Revolta

A Cassiano CĂ©sar

O sĂ©culo Ă© de revolta — do alto transformismo,
De Darwin, de LittrĂ©, de Spencer, de Laffite —
Quem fala, quem dá leis é o rubro niilismo
Que traz como divisa a bala-dinamite!…

Se é força, se é preciso erguer-se um evangelho,
Mais reto, que instrua — estĂ©tico — mais novo
Esmaguem-se do trono os dogmas de um Velho
E lance-se outro sangue aos mĂşsculos do povo!…

O vício azinhavrado e os cérebros raquíticos,
É pô-los ao olhar dos sérios analíticos,
Na ampla, social e esplĂŞndida vitrine!…

Ă€ frente!… — Trabalhar a luz da idĂ©ia nova!…
— Pois bem! Seja a idĂ©ia, quem lance o vĂ­cio Ă  cova,
— Pois bem! — Seja a idĂ©ia, quem gere e quem fulmine!…

Soneto

A Moreira de Vasconcelos

Na luta dos impossĂ­veis,
do espirito e da matéria,
tu és a águia sidérea
dos pensamentos terrĂ­veis!
(Do Autor)

É um pensar flamejador, dardânico
Uma explosão de rápidas idéias,
Que como um mar de estranhas odisséias
Saem-lhe do crânio escultural, titânico!…

Parece haver um cataclismo enorme
Lá dentro, em ânsia, a rebentar, fremente!…
Parece haver a convulsĂŁo potente,
Dos rubros astros num fragor disforme!…

HĂŁo de ruir na transfusĂŁo dos mundos
Os monumentos colossais profundos,
As cousas vĂŁs da brasileira histĂłria!

Mas o seu vulto, sobre a luz alçado,
Oh! há de erguer-se de arrebĂłis c’roado,
Como Atalaia nos umbrais da glĂłria!!…

Ao EstrĂ­dulo Solene Dos Bravos

– Os TrĂłpicos pulando as palmas batem…
Em pĂ© nas ondas – O Equador dá vivas!…

Ao estrídulo solene dos bravos! das platéias,
Prossegues altaneira, oh! Ă­dolo da arte!…
– O sol pára o curso p’ra bem de admirar-te
– O sol, o grande sol, o misto das idĂ©ias.

A velha natureza escreve-te odissĂ©ias…
A estrela, a nĂ­vea concha, o arbusto… em toda a parte
Retumba a doce orquestra que ousa proclamar-te
Assombro do ideal, em duplas melopéias!

Perpassam vagos sons na harpa do mistério
Lá, quando no proscênio te ergues imperando
– Oh! ĂŤbis magistral do mundo azul – sidĂ©rio!

EntĂŁo da imensidade, audaz vem reboando
De palmas o tufão, veloz, febril, aéreo
Que cai dentro das almas e as vai arrebatando!…

Um Dia Guttemberg

Um dia Guttemberg c’o a alma aos cĂ©us suspensa,
Pegou do escopro ingente e pĂ´s-se a trabalhar!
E fez do velho mundo um rútilo alcançar
Ao mágico clangor de sua idéia imensa!

Rolou por todo o globo a luz da sacra imprensa!
Ruiu o despotismo no pĂł, a esbravejar…
Uniram-se n’um lago, o cĂ©u, a terra, o mar…
Rasgou-se o manto atroz da horrĂ­vel treva densa!…

Ergueram-se mil povos ao som das melopéias,
Das grandes cavatinas olĂ­mpicas da arte!
Raiou o novo sol das fĂşlgidas idĂ©ias!…

Porém, quem lance luz maior por toda a parte
És tu, sublime atriz, ó misto de epopéias
Que sabes no tablado subir, endeusar-te!…

Supremo Anseio

Esta profunda e intérmina esperança
Na qual eu tenho o espĂ­rito seguro,
A tão profunda imensidade avança
Como é profunda a idéia do futuro.

Abre-se em mim esse clarĂŁo, mais puro
Que o céu preclaro em matinal bonança:
Esse clarĂŁo, em que eu melhor fulguro,
Em que esta vida uma outra vida alcança.

Sim! Inda espero que no fim da estrada
Desta existência de ilusões cravada
Eu veja sempre refulgir bem perto

Esse clarĂŁo esplendoroso e louro
Do amor de mĂŁe — que Ă© como um fruto de ouro,
Da alma de um filho no eternal deserto.

Sonhador

Por sĂłis, por belos sĂłis alvissareiros,
Nos troféus do teu Sonho irás cantando
As pĂşrpuras romanas arrastando,
Engrinaldado de imortais loureiros.

Nobre guerreiro audaz entre os guerreiros,
Das Idéias as lanças sopesando,
Verás, a pouco e pouco, desfilando
Todos os teus desejos condoreiros…

Imaculado, sobre o lodo imundo,
Há de subir, com as vivas castidades,
Das tuas glĂłrias o clarĂŁo profundo.

Há de subir, além de eternidades,
Diante do torvo crocitar do mundo,
Para o branco Sacrário das Saudades!

Quando Apareces, Fica-Se ImpassĂ­vel

Quando apareces, fica-se impassĂ­vel
E mudo e quedo, trĂŞmulo, gelado!…
Quer-se ficar com atenção, calado,
Quer-se falar sem mesmo ser possĂ­vel!.

Anda-se c’o a alma n’um estado horrĂ­vel
O coração completamente ervado!…
Quer-se dar palmas, mas sem ser notado,
Quer-se gritar, n’uma explosĂŁo temĂ­vel!…

Sobe-se e desce-se ao paĂ­s das fadas,
Vaga-se co’as nuvens das mansões douradas
Sob um esforço colossal, titânico!…

E as idĂ©ias galopando voam…
Então lá dentro sem parar, ressoam
As indomáveis convulsões do crânio!!…