Sonetos sobre Ídolos

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Sonetos de ídolos escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

LXIX

Se à memória trouxeres algum dia,
Belíssima tirana, ídolo amado,
Os ternos ais, o pranto magoado,
Com que por ti de amor Alfeu gemia;

Confunda-te a soberba tirania,
O ódio injusto, o violento desagrado,
Com que atrás de teu olhos arrastado
Teu ingrato rigor o conduzia.

E já que enfim tão mísero o fizeste,
Vê-lo-ás, cruel, em prêmio de adorar-te,
Vê-lo-ás, cruel, morrer; que assim quiseste.

Dirás, lisonjeando a dor em parte:
Fui-te ingrata, pastor; por mim morreste;
Triste remédio a quem não pode amar-te!

Ao Estrídulo Solene Dos Bravos

– Os Trópicos pulando as palmas batem…
Em pé nas ondas – O Equador dá vivas!…

Ao estrídulo solene dos bravos! das platéias,
Prossegues altaneira, oh! ídolo da arte!…
– O sol pára o curso p’ra bem de admirar-te
– O sol, o grande sol, o misto das idéias.

A velha natureza escreve-te odisséias…
A estrela, a nívea concha, o arbusto… em toda a parte
Retumba a doce orquestra que ousa proclamar-te
Assombro do ideal, em duplas melopéias!

Perpassam vagos sons na harpa do mistério
Lá, quando no proscênio te ergues imperando
– Oh! Íbis magistral do mundo azul – sidério!

Então da imensidade, audaz vem reboando
De palmas o tufão, veloz, febril, aéreo
Que cai dentro das almas e as vai arrebatando!…

Pois se para os Amar não Foram Feitos

Pois se para os amar não foram feitos,
Senhor, aqueles olhos soberanos,
Porque, por tantos modos, mais que humanos,
Pintando os estivestes tão perfeitos?

Se tais palavras e se tais conceitos,
Tão divinas, tão longe de profanos,
Não destes por oráculo aos enganos,
Com que Amor vive nos mais altos peitos,

Porque, Senhor, tanta beleza junta,
Tanta graça e tal ser lhe foi deitado,
Qual ídolo nenhum gozara antigo?

Mas como respondeis a esta pergunta?
Que ou para disculpar o meu pecado,
Ou para eternizar o meu castigo?

Soneto 253 A Renato Russo

Embora original, gênio, perito,
do nosso rock um raro uirapuru,
vivia ensimesmado e jururu,
talvez por não ser grego nem bonito.

Entendo a sua angústia e o seu conflito,
meu ídolo, meu mártir, meu guru!
Causou você, primeiro, um sururu;
depois, tristeza, e então calou seu grito.

Respeito quem é triste, ou aparenta.
Os outros grandes brincam: Raul, Rita,
ou cospem mera raiva barulhenta.

Cazuza também brinca, mas medita.
Arnaldo Antunes testa, experimenta.
Renato faz da dor a dor: maldita!

LI

Adeus, ídolo belo, adeus, querido,
Ingrato bem; adeus: em paz te fica;
E essa vitória mísera publica,
Que tens barbaramente conseguido.

Eu parto, eu sigo o norte aborrecido
De meu fado infeliz: agora rica
De despojos, a teu desdém aplica
O rouco acento de um mortal gemido.

E se acaso alguma hora menos dura
Lembrando-te de um triste, consultares
A série vil da sua desventura;

Na imensa confusão de seus pesares
Acharás, que ardeu simples, ardeu pura
A vítima de uma alma em teus altares.

Soneto 568 Nazaretado

Uns dizem que de índia tinha cara;
a outros parecia um rapazelho.
Famoso mesmo foi o seu joelho,
além da voz, que mais se aveludara.

Veludo, mas cortante, coisa rara:
quer fosse a Lindonéia nosso espelho
ou fosse o Carcará bordão vermelho,
o fato é que, no mapa, a nata é Nara.

Da Bossa Nova é musa mais bem-quista.
Tropicalista diva, brilha quieta.
Rebelde mais serena não se avista.

Foi ídolo, na luta, do poeta,
ao mesmo tempo olímpica e humanista,
pois Nara é nata, é nota, é gata, é neta.