Sonetos sobre Mal de Carlos Drummond de Andrade

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Sonetos de mal de Carlos Drummond de Andrade. Leia este e outros sonetos de Carlos Drummond de Andrade em Poetris.

Jardim

Negro jardim onde violas soam
e o mal da vida em ecos se dispersa:
à toa uma canção envolve os ramos
como a estátua indecisa se reflete

no lago há longos anos habitado
por peixes, não, matéria putrescível,
mas por pálidas contas de colares
que alguém vai desatando, olhos vazados

e mãos oferecidas e mecânicas,
de um vegetal segredo enfeitiçadas,
enquanto outras visões se delineiam

e logo se enovelam: mascarada,
que sei de sua essĂŞncia (ou nĂŁo a tem),
jardim apenas, pétalas, presságio

DomicĂ­lio

… O apartamento abria
janelas para o mundo. Crianças vinham
colher na maresia essas notĂ­cias
da vida por viver ou da inconsciente

saudade de nĂłs mesmos. A pobreza
da terra era maior entre os metais
que a rua misturava a feios corpos,
duvidosos, na pressa. E de terraço

em solitude os ecos refluĂ­am
e cada exĂ­lio em muitos se tornava
e outra cidade fora da cidade

na garra de um anzol ia subindo,
adunca pescaria, mal difuso,
problema de existir, amor sem uso.