Esquece-te de Mim, Amor
Esquece-te de mim, Amor,
das delícias que vivemos
na penumbra daquela casa,
Esquece-te.
Faz por esquecer
o momento em que chegámos,
assim como eu esqueço
que partiste,
mal chegámos,
para te esqueceres de mim,
esquecido já
de alguma vez
termos chegado.
Passagens sobre Mal
1898 resultadosLouvor bem entendido deve começar por nós, porque neste caso ele se torna uma verdadeira forma de caridade. Mal daqueles que, por humor sombrio ou desalento muito expansivo, se cobrem de cinza diante do mundo, porque o mundo imediatamente, por cima da cinza, os cobre de lama. A humildade só foi possível na Tebaida; e as próprias santas nunca se mostraram aos homens sem a pomposa auréola.
O mal é ninguém ter ainda percebido que o problema para mim consiste apenas em saber de que lado estão os valores da vida. Se os meus valores estivessem trocados, e eu o percebesse, seria eu o primeiro a destrocá-los. Mas não vejo que estejam. E não mudo.
Lutar Contra as Adversidades
Depois dos bons momentos… vêm sempre os piores. O encontro com o mais belo da existência não anula a nossa fragilidade. Mais uma vez, caímos. Mais uma vez, experimentamos a derrota, sentimos que não somos tão importantes quanto julgávamos, nem, tão-pouco, nada de extraordinário. Estamos, mais uma vez, no chão. Encolhidos. Como no ventre da nossa mãe.
A fraqueza acumulada é uma adversidade brutal. Não é apenas necessário lutar contra o que temos por diante, temos de combater também as derrotas das lutas anteriores, todas as dores, cicatrizes e feridas abertas… todas as perdas.
O que faz à vontade o sofrimento recorrente? Aumenta a tentação de ceder ao mal. Como se fosse natural habituarmo-nos mais aos vícios do que às virtudes.
A cada passo o caminho se torna mais longo…
Sofremos o que não merecemos. Mas a tristeza só é absurda quando não se sabe por que se luta… enquanto não se consegue ver sentido algum na dor…
Há homens e mulheres que, longe dos olhares alheios, lutam contra adversidades enormes, que alguns imaginam impossíveis. Lutam, sofrem e erguem-se, apesar de tudo.
A sua vontade de viver e sorrir é maior do que a de desistir e chorar.
Apolo E As Nove Musas, Discantando
Apolo e as nove Musas, discantando
com a dourada lira, me influíam
na suave harmonia que faziam,
quando tomei a pena, começando:-Ditoso seja o dia e hora, quando
tão delicados olhos me feriam!
Ditosos os sentidos que sentiam
estar se em seu desejo traspassando!Assi cantava, quando Amor virou
a roda à esperança, que corria
tão ligeira que quase era invisível.Converteu se me em noite o claro dia;
e, se algüa esperança me ficou,
será de maior mal, se for possível.
Não Pode Amor Por Mais Que As Falas Mude
Não pode Amor por mais que as falas mude
exprimir quanto pesa ou quanto mede.
Se acaso a comoção falar concede
é tão mesquinho o tom que o desilude.Busca no rosto a cor que mais o ajude,
magoado parecer aos olhos pede,
pois quando a fala a tudo o mais excede
não pode ser Amor com tal virtude.Também eu das palavras me arreceio,
também sofro do mal sem saber onde
busque a expressão maior do meu anseio.E acaso perde, o Amor que a fala esconde,
em verdade, em beleza, em doce enleio?
Olha bem os meus olhos, e responde.
Os bens mal adquiridos esvaem-se de mau modo.
Não considero ajuizado o homem que, no leito da agonia, maldiz cobardemente da sua sorte. De um mal faz dois: tortura-se e nem por isso deixa de morrer.
Todos os males são produtos do mundo das ilusões. Logo, enquanto a pessoa estiver seguindo a vontade de Deus, vivificando o Amor e a Sabedoria da Imagem Verdadeira, será impossível sobreviver-lhe algum mal.
A Despedida
Três modos de despedida
Tem o meu bem para mim:
– «Até logo»; «até à vista»:
Ou «adeus» – É sempre assim.«Adeus», é lindo, mas triste;
«Adeus» … A Deus entregamos
Nossos destinos: partimos,
Mal sabendo se voltamos.«Até logo», é já mais doce;
Tem distancia e ausência, é certo;
Mas não é nem ano e dia,
Nem tão-pouco algum deserto.Vale mais «até à vista»,
Do que «até logo» ou «adeus»;
«À vista», lembra, voltando,
Meus olhos fitos nos teus.Três modos de despedida
Tem, assim, o meu Amor;
Antes não tivesse tantos!
Nem um só… Fora melhor.
As coisas que nos assustam são em maior número do que as que efectivamente fazem mal, e afligimo-nos mais pelas aparências do que pelos factos reais.
Nunca confie no homem que tem motivos para suspeitar de que você sabe que ele lhe fez mal.
Depois de ter dado abrigo ao mal, ele não mais pedirá que você acredite nele.
Cartas Trocadas para o Marido e para o Amante
Anais,
Uma terrível asneira foi feita. Enviaste a carta para o Hugo, no dia em que chegaste, e mandaste-lhe a minha. O Hugo está freneticamente a tentar entrar em contacto comigo. Mandou a Amélia aqui, que deixou debaixo da porta o bilhete que junto. Ela esteve aqui de manhã e outra vez esta noite. Pensei de manhã que era o próprio Hugo e que ele tinha vindo para me “apanhar”… Por isso, não abri a porta.
Já que eu tinha recebido a carta dele na noite anterior (a tua carta para ele), tive um pressentimento de que as cartas tinham sido postas nos envelopes errados e fiquei apreensivo. Esta noite enviei-lhe a sua carta para o número 18 da Ave. de Versailles, sem dar a minha morada. Não posso dizer nesta carta se chegarei a receber a que me era devida. Espero que sim. Suponho que ele saiba tudo agora. Mas estou a evitá-lo, porque não quero admitir nem negar. Ele deve estar furioso, mas, ao mesmo tempo, num estado terrível. Eu próprio estou exausto de apreensão. Trouxe o Fred para ficar aqui comigo, porque até o Hugo partir vou estar em pulgas. Sei que, se ele me matasse,
Os Doentes São o Maior Perigo da Humanidade
Se tão normal é o homem em estado morboso, tanto mais de devem estimar os raros exemplos de potência física e corpural, os acidentes felizes da espécie humana, e tanto mais devem ser preservados do ar infecto os seres robustos. Faz-se assim ?…
Os doentes são o maior perigo para os sãos; daqueles vêm todos os males. Já se reparou suficientemente nisto?… Decerto se não deve desejar que diminua a violência entre os homens; porque esta violência obriga os homens a serem fortes, e mantém na sua integridade o tipo do homem robusto. O temível e desastroso é o grande tédio do homem e a sua grande compaixão. Se algum dia estes elementos se unirem, darão á luz irremissivelmente a monstruosa «última» vontade, a sua vontade do nada, o niilismo.
E efectivamente tudo está já preparado para este fim. Os que têm olhos, ouvidos, nariz, percebem por todos os lados a atmosfera de um manicómio e de um hospital, em todas as partes do mundo civilizado, europeizado. Os doentes são o maior perigo da humanidade; não os maus, não as «feras de rapina». Os desgraçados, os vencidos, os impotentes, os fracos são os que minam a vida e envenenam e destroem a nossa confiança.
O Mal e o Bem em Função da Vaidade
É raro o mal, de que não venha a nascer algum bem, nem bem, que não produza algum mal: como só o presente é nosso, por isso não nos serve de alívio o bem futuro, nem nos inquieta o mal que ainda não sentimos; um infeliz não se persuade, que a sua sorte possa ter mudança; um venturoso não crê, que possa deixar de o ser; a este a vaidade tira o menor receio; àquele o abatimento priva de esperança. Se fizermos reflexão, havemos de admirar o pouco que basta para fazer o nosso bem, ou o nosso mal: de um instante a outro mudamos da alegria para a tristeza, e muitas vezes sem outro algum motivo, que o de uma vaidade mais, ou menos satisfeita.
Os homens não são todos igualmente sensíveis ao bem, e ao mal; a uns penetra mais vivamente a dor, a outros só faz uma impressão ligeira; o bem não acha em todos o mesmo grau de contentamento. Nas almas deve de haver a mesma diferença, que há nos corpos: umas mais débeis, e outras mais robustas; por isso em umas obra mais o sentimento, e acha mais resistência em outras; em umas domina a vaidade com império,
Quem diz que Amor é falso ou enganoso
Quem diz que Amor é falso ou enganoso,
Ligeiro, ingrato, vão desconhecido,
Sem falta lhe terá bem merecido
Que lhe seja cruel ou rigoroso.Amor é brando, é doce, e é piedoso.
Quem o contrário diz não seja crido;
Seja por cego e apaixonado tido,
E aos homens, e inda aos Deuses, odioso.Se males faz Amor em mim se vêem;
Em mim mostrando todo o seu rigor,
Ao mundo quis mostrar quanto podia.Mas todas suas iras são de Amor;
Todos os seus males são um bem,
Que eu por todo outro bem não trocaria.
Amar Intensamente
De que vale no mundo ser-se inteligente, ser-se artista, ser-se alguém, quando a felicidade é tão simples! Ela existe mais nos seres claros, simples, compreensíveis e por isso a tua noiva de dantes, vale talvez bem mais que a tua noiva de agora, apesar dos versos e de tudo o mais. Ela não seria exigente, eu sou-o muitíssimo. Preciso de toda a vida, de toda a alma, de todos os pensamentos do homem que me tiver. Preciso que ele viva mais da minha vida que da vida dele. Preciso que ele me compreenda, que me adivinhe. A não ser assim, sou criatura para esquecer com a maior das friezas, das crueldades. Eu tenho já feito sofrer tanto! Tenho sido tão má! Tenho feito mal sem me importar porque quando não gosto, sou como as estátuas que são de mármore e não sentem.
O nosso mal é julgar as opiniões humanas pelo prazer ou pela dor que nos causam.
Onde Será a Terra Prometida?
Triste época a nossa! Para que oceano correrá esta torrente de iniquidades? Para onde vamos nós, numa noite tão profunda? Os que querem tactear este mundo doente retiram-se depressa, aterrorizados com a corrupção que se agita nas suas entranhas.
Quando Roma se sentiu agonizar, tinha pelo menos uma esperança, entrevia por detrás da mortalha a Cruz radiosa, brilhando sobre a eternidade. Essa religião durou dois mil anos, mas agora começa a esgotar-se, já não basta, troçam dela; e as suas igrejas caem em ruínas, os seus cemitérios transbordam de mortos.
E nós, que religião teremos nós? Sermos tão velhos como somos, e caminharmos ainda no deserto, como os Hebreus que fugiam do Egipto.
Onde será a Terra prometida?
Tentámos tudo e renegámos tudo, sem esperança; e depois uma estranha ambição invadiu-nos a alma e a humanidade, há uma inquietação imensa que nos rói, há um vazio na nossa multidão; sentimos à nossa volta um frio de sepulcro.
A humanidade começou a mexer em máquinas, e ao ver o ouro que nelas brilhava, exclamou: «É Deus!» E come esse Deus. Há – e é porque tudo acabou, adeus! adeus! – vinho antes da morte! Cada um se precipita para onde o seu instinto o impele,