Sonetos sobre NĂșmeros de Augusto dos Anjos

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Sonetos de nĂșmeros de Augusto dos Anjos. Leia este e outros sonetos de Augusto dos Anjos em Poetris.

Último Credo

Como ama o homem adĂșltero o adultĂ©rio
E o ébrio a garrafa tóxica de rum,
Amo o coveiro este ladrĂŁo comum
Que arrasta a gente para o cemitério!

É o transcendentalĂ­ssimo mistĂ©rio!
É o nous, Ă© o pneuma, Ă© o ego sum qui sum,
É a morte, Ă© esse danado nĂșmero Um,
Que matou Cristo e que matou Tibério.

Creio como o filĂłsofo mais crente,
Na generalidade decrescente
Com que a substĂąncia cĂłsmica evolue…

Creio, perante a evolução imensa,
Que o homem universal de amanhã vença
O homem particular que eu ontem fui!

Alucinação À Beira-Mar

Um medo de morrer meus pés esfriava.
Noite alta. Ante o telĂșrico recorte,
Na diuturna discĂłrdia, a equĂłrea coorte
Atordoadoramente ribombava!

Eu, ególatra céptico, cismava
Em meu destino!… O vento estava forte
E aquela matemĂĄtica da Morte
Com os seus nĂșmeros negros me assombrava!

Mas a alga usufructuĂĄria dos oceanos
E os malacopterĂ­gios subraquianos
Que um castigo de espécie emudeceu,

No eterno horror das convulsÔes marítimas
Pareciam também corpos de vítimas
Condenadas Ă  Morte, assim como eu!

O Último NĂșmero

Hora da minha morte. Hirta, ao meu lado,
A idĂ©ia estertorava-se… No fundo
Do meu entendimento moribundo
jazia o Ășltimo nĂșmero cansado.

Era de vĂȘ-lo, imĂłvel, resignado,
Tragicamente de si mesmo oriundo,
Fora da sucessĂŁo, estranho ao mundo,
Com o reflexo fĂșnebre do Increado:

Bradei: – Que fazes ainda no meu crĂąnio?
E o Ășltimo nĂșmero, atro e subterrĂąneo,
Parecia dizer-me: “É tarde, amigo!

Pois que a minha ontogĂȘnica Grandeza
Nunca vibrou em tua lĂ­ngua presa,
NĂŁo te abandono mais! Morro contigo!”

Versos A Um Coveiro

Numerar sepulturas e carneiros,
Reduzir carnes podres a algarismos,
Tal Ă©, sem complicados silogismos,
A aritmética hedionda dos coveiros!

Um, dois, trĂȘs, quatro, cinco… Esoterismos
Da Morte! E eu vejo, em fĂșlgidos letreiros,
Na progressĂŁo dos nĂșmeros inteiros
A gĂȘnese de todos os abismos!

Oh! PitĂĄgoras da Ășltima aritmĂ©tica,
Continua a contar na paz ascética
Dos tĂĄbidos carneiros sepulcrais

TĂ­bias, cĂ©rebros, crĂąnios, rĂĄdios e Ășmeros,
Porque, infinita como os prĂłprios nĂșmeros
A tua conta nĂŁo acaba mais!